Após o balanço financeiro divulgado nesta terça-feira, 19, a Netflix registrou uma perda de US$ 60 bilhões em seu valor de mercado. A queda na Bolsa de Valores americana representou mais de um terço da avaliação da empresa, que agora gira em torno dos US$ 100 bilhões. Foi o maior declínio das ações da empresa em quase duas décadas. Ao longo do ano, o valor das ações da empresa já acumula queda de 64%.
O prejuízo aparece depois de uma noite ruim de resultados trimestrais. No total, a empresa registrou uma queda de 200 mil assinantes na plataforma, número que reflete a suspensão do serviço de streaming na Rússia, por conta da guerra, e a competição de mercado com outros serviços, como Disney+, por exemplo.
A empresa também afirma que o compartilhamento de contas, que ficou em torno dos 100 milhões de assinantes que não pagavam pelo acesso, afetou a forma como a plataforma poderia crescer globalmente.
No dia seguinte ao balanço, as ações da Netflix fecharam com queda de 35%, no que pode ser o pior dia em 18 anos — certamente, a maior queda desde que a empresa tem o streaming como modelo de negócio.
As ações flutuaram por volta de US$ 220 nesta quarta-feira, quando, no dia anterior, chegaram a valer US$ 351. O resultado também coloca a plataforma no centro da preocupação dos investidores, deixando Wall Street em dúvida sobre seu crescimento diante da concorrência acirrada e da fadiga do espectador pós-pandemia.
Em um semestre difícil, a perda se traduziu também nos números financeiros da empresa. A receita do primeiro trimestre cresceu 10%, para US$ 7,87 bilhões, ligeiramente abaixo das previsões de Wall Street de US$ 7,93 bilhões. O lucro líquido por ação foi de US$ 3,53.
Muitos analistas correram para moderar suas opiniões sobre uma ação que teve um desempenho de mercado em alta nos últimos anos. "A Netflix é um exemplo do que acontece com as empresas em crescimento quando elas perdem o ritmo", disse Kim Forrest, diretor de investimentos da Bokeh Capital Partners em Pittsburgh.
"As pessoas compram empresas em crescimento porque acham que seu fluxo de caixa vai crescer, então estão pagando antecipadamente por esperar isso. Quando uma ação como essa cai, as pessoas que procuram crescimento recuam rapidamente”, explicou Forrest à agência de notícias Reuters.
Para Guilherme Zanin, analista da Avenue Securities, apesar de o resultado demostrar a chegada da empresa em um patamar mais "maduro", os números indicam uma dificuldade em acompanhar a expectativa do mercado em, pelo menos, metade do ano de 2022.
“O mercado acabou fazendo os papéis caírem bastante, principalmente por essa falta de crescimento. A gente acredita também que o consumo das pessoas esteja diminuindo, por conta do aumento da inflação. A Netflix acaba sendo um bem supérfluo e a inclusão de publicidade ou a cobrança do compartilhamento do login, pode fazer com que caia ainda mais o número de usuários”, afirma Zanin ao Estadão.
Thiago Lobão, CEO da Catarina Capital, avalia que a queda no valor das ações poderia ter sido inclusive pior, em virtude da grande perda do número de assinantes anunciada. “É muito expressivo, dado que a expectativa era de crescimento no número de usuários, e o balanço revela, na verdade, que esse número caiu”, explica Lobão ao Estadão.
Para ele, o grande desafio que se impõe à gigante do streaming é justamente o de oferecer uma perspectiva de crescimento aos seus acionistas, que até agora não apareceu. “Se por um lado é possível avaliar que o mercado do streaming chegou a uma espécie de ‘platô’ de crescimento, pelo outro, o cenário indica que, caso não haja inovação no serviço, a perspectiva futura para os papéis da empresa não é otimista”, acrescenta o CEO da Catarina Capital.
Estratégias
Com as ações despencando, a Netflix deve ampliar as opções de planos de assinatura para usuários nos próximos meses, afirmou o presidente da gigante do streaming, Reed Hastings, em conferência com investidores nesta terça-feira, 19. Segundo o executivo, os modelos devem ser de menor custo e baseados em anúncios pagos, em formato similar ao que fazem canais de televisão tradicionais.
“Aqueles que acompanham a Netflix sabem que sou contra a complexidade da publicidade e um grande fã da simplicidade das assinaturas”, declarou Hastings, também fundador da gigante junto com Ted Sarandos. “Mas sou mais fã ainda da escolha do consumidor. Faz muito sentido permitir aos clientes que eles escolham um modelo mais barato, se eles são tolerantes a anúncios.”
Segundo a companhia, os planos devem ser apresentados ao mercado em um ou dois anos, representando uma “animadora oportunidade para nós”. A Netflix garante que será a responsável por publicar os anúncios, e não usar serviços de terceiros, que podem comprometer a privacidade dos usuários./COM REUTERS
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