Encerrada nesta semana a grande temporada de anúncios de gigantes da tecnologia, é possível apontar a OpenAI, dona do ChatGPT, como a grande vencedora de 2023. Menos de um ano após lançar o chatbot inteligente, a startup fundada em 2015 fez o que parecia impossível: ditou ao longo do ano o ritmo do baile dançado pelas cinco gigantes da tecnologia, Amazon, Apple, Google, Meta e Microsoft.
O capitulo mais recente de como a companhia liderada por Sam Altman alterou profundamente os rumos do setor tecnológico aconteceu na última semana durante o Meta Connect, tradicional evento da Meta, a ‘empresa-mãe’ do Facebook, Instagram e WhatsApp. Ultimamente focado no metaverso, a apresentação liderada por Mark Zuckerberg foi centrada em inteligência artificial (IA), tema do ano na tecnologia graças à explosão de popularidade do ChatGPT.
Não que a gigante nunca tivesse se aventurado por essas águas — o modelo Llama, criado pela companhia, é bastante conhecido na comunidade de IA. Mas a mudança de foco ficou óbvia. Zuckerberg até mostrou a versão nova de seus óculos de realidade virtual, o Quest 3, mas a apresentação foi dedicada às várias formas de como a gigante incorporou IA a seus produtos. Foi ali que conhecemos o Meta AI, uma espécie de chatbot que vai funcionar de forma gratuita em todos os apps da empresa, permitindo conversas e geração de imagens.
Mais importante: Zuckerberg passou a enxergar os avanços em IA como passos fundamentais para tentar tornar o metaverso realidade. “Antes dos avanços em IA do último ano, eu achava que óculos inteligentes só se tornariam populares após nos mergulharmos, com hologramas e painéis, que são coisas em que estamos tendo progresso. Acho que a IA será tão importante quanto isso, porque ela torna óculos inteligentes mais atraentes”, afirmou ele na apresentação.
Uma semana antes da Meta, foi a vez de a Amazon demonstrar que precisou ajustar a rota. No evento anual no qual costuma apresentar caixas de som inteligentes, dispositivos para casa conectada e até robôs, a gigante do comércio se debruçou sobre avanços em IA — e passou muitos minutos discutindo temas como modelos amplos de linguagem (LLM, na sigla), área da IA que mudou de patamar depois do ChatGPT.
Tudo isso para anunciar que a assistente Alexa está mais inteligente — para livrar a ferramenta da fama recente de “burra”, a Amazon usou LLMs que a tornam numa espécie de ChatGPT ativado por voz. Ou seja, ampliou a capacidade conversacional e passou a entender melhor contexto. É um avanço muito bem-vindo, já que assistentes do tipo foram colocados em xeque após o lançamento do chatbot da OpenAI.
Já o Google está, desde fevereiro, quando anunciou o assistente Bard, tentando correr atrás da OpenAI. Embora seja uma das principais forças em IA no mundo, a companhia relutava em tornar pública uma ferramenta como o ChatGPT — um dos temores era sobre o uso irresponsável e as alucinações (respostas erradas ou que fogem do bom senso) produzidos pela tecnologia.
O Google chegou a mostrar avanços em relação ao ChatGPT: o Bard, por exemplo, teve acesso à internet, citação de fontes e capacidade multimodal (ou seja, entende de imagens, além de textos). Mas não conseguiu incomodar a OpenAI a ponto de inverter o jogo.
Outros dois gigantes adotaram posturas antagônicas. A Microsoft, que investiu US$ 13 bilhões na OpenAI desde 2019, reforçou a parceria e passou a incorporar os sistemas de IA em uma série de produtos, como o Bing, o Windows e o pacote Office - isso permitiu à companhia comandada por Satya Nadella a oferecer o seu próprio chatbot inteligente, algo que não parecia estar na rota da companhia até o começo deste ano.
Já a Apple parece fingir que nada está acontecendo — está até evitando usar o termo “inteligência artificial” em suas apresentações. No entanto, a Bloomberg afirma que a dona do iPhone está desenvolvendo tecnologia para competir com o ChatGPT, que teria sido apelidada internamente de “AppleGPT”.
ChatGPT segue avançando
Mesmo com as movimentações de cinco gigantes, a OpenAI fez três anúncios recentes para o seu chatbot que elevam o nível da disputa. O ChatGPT vai ser capaz de gerar imagens a partir de comandos de texto, após receber integração com o DALL-E 3, nova versão da IA “desenhista” da OpenAI.
O chatbot também terá multimodalidade ampla. Ou seja, vai entender texto, imagens e áudio, o que torna a ferramenta uma competidora completa contra a Alexa e o Bard. Por fim, o robô vai ter navegação em tempo real na internet para respostas atualizadas — uma das maiores críticas ao ChatGPT era de que sua base de dados era limitada até 2021. Isso torna o chatbot em uma ameaça real para o Google.
Dessa maneira, em apenas 10 meses, a OpenAI mudou a paisagem tecnológica dominada há mais de uma década pelas mesmas cinco empresas. E nada dá sinais de que as coisas voltarão como eram antes.
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