A Geração Z, faixa etária de jovens nascidos entre 1996 e 2010, é o público mais ativo digitalmente no mundo: eles nasceram e foram criados em meio ao crescimento da Internet e da popularização dos aparelhos eletrônicos nas casas. São verdadeiros nativos digitais, tornando-se parcela importante do mercado de consumo das próximas décadas por não presenciarem o “mundo analógico”. Entender como eles pensam e suas ambições é peça fundamental para a sobrevivência de diversas companhias — e as empresas de tecnologia já se movimentam para atender esse público.
A fabricante sul-coreana Samsung está de olhos abertos para isso. Em dezembro de 2021, a marca lançou o Future Generation Lab, iniciativa interna para pensar ações para esse público. Com escala global, a equipe montada pela empresa é formada apenas por representantes da Geração Z, com 73 jovens espalhados por 12 regiões ao redor do mundo. No Brasil, o escritório em São Paulo é composto por três nomes: Helena Villar, Raphael Telles e Marina Maestre — respectivamente, 26, 26 e 21 anos de idade.
A estratégia é uma aposta no futuro da companhia: por consultar quem mais entende do produto, a empresa busca o sucesso entre a faixa etária “zoomer” (como são chamados os jovens da Geração Z). Ao mesmo tempo, é ousada, pois a Samsung enfrenta o desafio de tentar decifrar um perfil etário considerado instável e extremamente habituado a mudanças no ambiente de trabalho e no mundo.
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“Hoje, esses jovens têm a capacidade de transformar o seu hobby em uma profissão muito facilmente”, afirma Arthur Wong, diretor de marketing da Samsung na América Latina. Com um celular ou computador em mãos, podem-se descobrir cineastas, fotógrafos, ilustradores, musicistas, escritores e muito mais. “Queremos ouvir essa nova geração, porque eles vão ser o público atingido pelos produtos e pelas nossas estratégias”.
Para Diego Oliveira, professor de Mídia & Dados da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), trata-se de uma geração que está sempre em “posição de inovação constante”. “O perfil desse consumidor não separa o online do offline”, explica. “As estratégias que aproximam esses consumidores são as que navegam entre os dois universos, oferecendo experiências para além do digital”.
Pontapé
Exemplo do fim da separação entre os mundos “offline” e “online”, tão caros aos millenials (geração antecessora, com nascidos entre 1980 e 1995), é o Freestyle, projetor portátil da Samsung revelado em janeiro passado no palco da Consumer Eletronics Show (CES) 2022, maior feira de tecnologia do mundo, que ocorre anualmente em Las Vegas, nos Estados Unidos. O dispositivo pode ampliar imagens em até 100 polegadas, com uma caixa de som embutida no aparelho.
De acordo com Wong, o projetor foi desenvolvido para ser uma espécie de eletrônico móvel pela casa, com a possibilidade de levar para o quarto, a sala e outros cômodos. No Future Generation Lab, porém, a equipe identificou um uso mais expressivo como um item para levar para a casa de amigos ou outros ambientes externos, parte da vida “nômade” da Geração Z. A ideia foi, então, adaptada para a campanha e os próprios membros do laboratório apresentaram o produto em Las Vegas, fazendo a estreia mundial com o aparelho.
“Eles se reúnem uma vez por mês e existe uma comunicação grande entre as equipes. Essa integração permite que eles possam trocar ideias sobre o que cada região está vivendo e desenvolvendo”, explica Wong.
No Brasil, o trio do Future Generation Lab já desenvolveu projetos lançados pela empresa, como o Skillshare, plataforma de educação voltada para aulas criativas pela internet. Com equipamentos da marca e ajuda dos membros do laboratório, artistas oferecem cursos de desenho e fotografia com celular, atendendo uma demanda identificada a partir da relação de jovens com os seus próprios aparelhos.
Agora, o foco do laboratório de inovação está em acessórios e dispositivos gamers, área que Wong afirma ser bastante procurada pelos clientes. Com presença garantida na CES 2023, que acontece entre 5 a 8 de janeiro, a equipe do laboratório foca no desenvolvimento de um monitor especial para quem consome games a partir de consoles ou PC. Mais detalhes, porém, não foram dados sobre o que deve ser revelado no palco em Las Vegas.
O desafio da fabricante sul-coreana (e de tantas outras marcas conforme começam a se dedicar a esse público) é lançar serviços e produtos customizáveis para cada consumidor zoomer, influência da praticidade e customização fornecida por algoritmos de redes sociais e plataformas (como Instagram e TikTok). Para a Geração Z, conhecida pela exigência na hora do consumo, customizar um celular com diferentes capinhas ou personalizar um serviço digital é essencial — estar fora do leque de preferências desse pessoal pode matar o apelo e ser fatal para a companhia.
“A internet quebrou a impossibilidade de personalização. A partir do momento em que se tem o entendimento do algoritmo e do consumo de dados, as pessoas procuram, cada vez mais, algo que seja específico para elas”, aponta Henrique Diaz, diretor da agência especializada em tendências de consumo Box 1824.
Na mira
A Samsung não está sozinha. Outras empresas também já pensam na Geração Z como uma “mina de ouro” na hora de oxigenar ideias tanto de novos produtos quanto de divulgações mirabolantes de marketing.
A partir do momento em que se tem o entendimento do algoritmo e do consumo de dados, as pessoas procuram, cada vez mais, algo que seja específico para elas”
Henrique Diaz, diretor da agência especializada em tendências de consumo Box 1824.
A Microsoft, em parceria com a grife Guess, inaugurou um laboratório na Europa voltado para moda e tecnologia, onde estudantes universitários poderão trabalhar em colaboração com as empresas no desenvolvimento de novos produtos. Já a Edelman, agência que trabalha com diversas empresas de tecnologia, criou, em junho deste ano, o Gen Z Lab, time com 100 colaboradores para gerar relatórios e pesquisas voltadas para os zoomers.
“É muito positivo quando as empresas começam a considerar essa parcela da população não só como consumidores potenciais, mas também como especialistas na fase de desenvolvimento do produto”, afirma Diaz.
Para a Samsung, agora é hora de cuidar do laboratório de jovens de até 25 anos, mas a gigante sul-coreana não está longe de pensar no que a geração seguinte pode oferecer. A ideia é que o Future Generation Lab siga acompanhando as ondas etárias — inclusive a Alpha, próxima “turma”, com os nascidos a partir de 2010.
“Para a geração Alpha, é claro, é preciso esperar mais alguns anos até que tenham a maioridade. Mas desenvolver esse projeto continuamente já é algo que pensamos e que pode dar certo dentro da empresa”, diz Wong.
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