Apesar de Elon Musk ter a impressão de que o Twitter pratica censura, a rede social é a que proporcionalmente menos remove conteúdo denunciado pelos seus próprios usuários - ao menos, no Brasil. Segundo números da SaferNet, a rede do passarinho removeu em 2021 apenas 4% do material sinalizado pela ONG como crimes no ambiente digital - os posts envolvem suspeitas de pornografia infantil, racismo, apologia a crimes contra a vida, LGBTfobia, neonazismo e xenofobia.
No ano passado, a SaferNet encaminhou ao Twitter 7.427 denúncias de conteúdos postados, dos quais apenas 309 (4%) foram removidos. O número é bastante inferior em comparação à proporção das remoções em outras redes, como o TikTok (90%) e o Instagram (90%).
O cenário que já é ruim pode ficar ainda mais preocupante, com possíveis mudanças no funcionamento das ferramentas de moderação de conteúdo da plataforma, prometidas por Elon Musk desde que o bilionário concretizou a compra da rede. “Qualquer retrocesso na equipe de moderação de conteúdo da plataforma pode fazer com que a rede se torne palco de violações sistemáticas de direitos humanos no médio prazo”, avalia Thiago Tavares, presidente da SaferNet no Brasil.
Tavares também pontua que, até o momento, as declarações de Musk sobre o que ele entende como “liberdade de expressão” são incompatíveis com diversos tratados internacionais e podem colidir com o sistema jurídico de muitos países, inclusive o do Brasil.
Em nota enviada ao Estadão, o Twitter afirmou que não recebeu informações suficientes sobre a metodologia usada na pesquisa citada e que, por isso, não tem condições de comentar ou verificar a veracidade das análises e suas classificações. Também de acordo com a empresa, a rede social possui regras e políticas de uso e que eventuais violações estão sujeitas às medidas cabíveis, que podem ser consultadas.
A SaferNet recebe pela internet qualquer denúncia de violação de direitos humanos no ambiente digital. Desde 2006, a ONG possui um convênio com o Ministério Público Federal (MPF) para contribuir com as investigações. São aceitas denúncias de conteúdos postados no Brasil, em português, dirigidos a brasileiros e que configuram crime de acordo com a legislação do País.
Twitter lidera número geral de denúncias
Além de remover pouco conteúdo, o Twitter foi o site que, nos últimos dois anos, mais recebeu denúncias da SaferNet. Em 2021, os 7.426 conteúdos denunciados fizeram a empresa ficar a frente do TikTok (5.607) e do Facebook (3.165). Já em 2020, o número de denúncias no Twitter foi ainda maior (14.168), patamar igualmente superior ao registrado no Facebook (9.633) e no Instagram (7.691).
Desde que o ranking de sites mais denunciados começou a ser produzido pela ONG, em 2010, o Twitter sempre esteve entre os quatro sites com maior quantidade de denúncias recebidas.
Proporção de conteúdo removido no Twitter já foi maior
O patamar de apenas 4% das denúncias da SaferNet removidas pelo Twitter em 2021 é o mais baixo já registrado pela empresa. Entre 2010 e 2017, por exemplo, o Twitter sempre removeu pelo menos 30% dos posts denunciados pela ONG.
Esse número caiu para 12% e 17% em 2018 e 2019, respectivamente. Em 2020, a proporção dos conteúdos removidos em relação ao número total de denúncias da ONG voltou a subir, atingindo 39%.
Para o presidente da SaferNet, o investimento em tecnologias e em equipes de moderação do conteúdo do Twitter não acompanhou o crescimento da plataforma ao longo dos anos. “Outras redes, como Facebook e Instagram (pertencentes ao Grupo Meta) têm investido proporcionalmente cada vez mais em moderação de conteúdo humana e automatizada”, afirma Tavares.
Pornografia infantil é o conteúdo mais denunciado
No ano passado, quase 70% do conteúdo denunciado no Twitter pela SaferNet tinha relação com pornografia infantil. Posts considerados racistas ou que incitavam crimes contra a vida também figuraram entre os mais denunciados.
O ranking da SaferNet por tipo de denúncia em 2021 é o seguinte: pornografia infantil (5.139), racismo (920), apologia a crimes contra a vida (349), LGBTfobia (303), neonazismo (236), xenofobia (193), violência/discriminação contra mulheres (175), maus tratos animais (83), intolerância religiosa (21) e tráfico de pessoas (4).
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