Análise | Broche com IA não vai matar o iPhone, mas pode mudar smartphones; veja impressões do aparelho

AI Pin, da startup Humane, promete ‘mundo sem telas,’ projetando informações na palma da mão e recebendo comandos por voz

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Foto do author Guilherme Guerra
Atualização:

ENVIADO ESPECIAL A BARCELONA — Há meses, a startup americana Humane vem causando burburinho imenso no mercado de tecnologia. A empresa vai lançar em 31 de março o que vem sendo chamado informalmente de “o produto que vai matar o iPhone”. Ou seja, o aparelho que vai substituir de uma vez por todas os smartphones. Isso não é pouca coisa, é claro.

Trata-se do Ai Pin, um broche inteligente em alumínio de formato quadrangular de não mais que cinco centímetros e 32 gramas que pode ser facilmente acoplado à camisa ou jaqueta por meio de um ímã. O maior diferencial é que não há uma tela para a qual o usuário pode ficar olhando por horas e mais horas — daí a alcunha de “matador do iPhone”.

Ai Pin, da Humane, é um broche com inteligência artificial que quer reduzir nossa dependência dos smartphones Foto: Guilherme Guerra/Estadão - 28/2/2024

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Assim como um smartphone, o broche é capaz de fazer buscas na internet, atender a ligações, checar e enviar mensagens, exibir o calendário, traduzir conversas em tempo real, tocar música nos fones de ouvido, tirar fotografias e fazer vídeos e cuidar da saúde física, entre outras atividades. Ou seja, é quase como nossos celulares inteligentes — mas sem as viciantes telas que nos prendem a eles.

O usuário interage com o Ai Pin com comandos por voz (por meio de uma assistente digital similar à Alexa, da Amazon), com gestos no próprio aparelho (como deslizar para atender uma ligação ou usar dois dedos para acionar uma gravação) e por movimentos dos dedos (como pinçar com os dedos para confirmar uma ação). Em termos de realidade aumentada, o aparelho “vê” o mundo externo graças aos sensores, microfones e câmeras embutidos. Além disso, é capaz de projetar informações e imagens em baixa resolução na palma da mão do usuário (que, em última instância, transforma-se numa tela).

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Tudo isso é turbinado por uma poderosa inteligência artificial (IA), que consegue compreender os comandos por voz e respondê-los também por áudio ou por texto exibido na palma da mão. E a máquina consegue aprender com os hábitos do usuário, tornando-se mais útil e inteligente com o uso. É como se o ChatGPT, da OpenAI, estivesse totalmente integrado a um dispositivo.

Fundada em 2018 por dois ex-funcionários de décadas da Apple (o casal Imran Chaudhri e Bethany Bongiorno) , a Humane é bem clara: o Ai Pin nasce “da boa intenção” de criar um produto “humano” e “natural”, diz a startup. Um dos objetivos do produto é “eliminar notificações desnecessárias”.

O Ai Pin primeiro apareceu na Fashion Week de Paris, em outubro de 2023, sob a lapela da modelo Naomi Campbell durante desfile da grife Coperni. No mês seguinte, a Humane anunciou o início das vendas nos Estados Unidos, com preço partindo de US$ 699, além de assinatura mensal de US$ 24 para bancar o armazenamento em nuvem e outros serviços da startup. Estranhamente, o produto que pode substituir o iPhone pode sair tão caro quanto o smartphone da Apple.

O Ai Pin ao vivo

O Ai Pin estava em exibição durante a Mobile World Congress (MWC) 2024, feira de telecomunicações e telefonia móvel que acontece em Barcelona, na Espanha. Demonstrações ao vivo do produto guiadas por funcionários da Humane eram realizadas para quem quisesse assistir — testar em mãos, no entanto, estava proibido.

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Na feira em Barcelona, era fácil ver o burburinho se formando em volta do stand da Humane. Ao assistir a demonstração, o público sorria, curioso para entender como funcionava um dispositivo tão pequeno e, ao mesmo tempo, tão inteligente.

O broche inteligente, no entanto, não deve substituir o iPhone. Mas deve forçar que repensemos o papel do smartphone

Ao ver o Ai Pin pessoalmente, é difícil não se encantar com o design industrial similar à assinatura da Apple, conhecida pelo apego ao acabamento em alumínio, às cores branca e preta e ao minimalismo. O produto facilmente poderia ter entrado no portfólio da empresa, conhecida por ter mudado para sempre a tecnologia com a invenção do computador pessoal, tocador de músicas portátil e do celular inteligente.

Os recursos prometidos pela Humane também funcionam surpreendentemente bem. A inteligência artificial que turbina o aparelho é natural, sem engasgos (em relação às assistentes digitais dos celulares, como a Siri, do iPhone, por exemplo) e parece realizar tarefas de dia a dia com competência, com rapidez. Como diria o fundador da Apple, Steve Jobs, “simplesmente funciona” - ao menos em uma demo altamente guiada.

Nada é perfeito, porém. Na tentativa de nos colocar cada vez mais distantes do celular, o Ai Pin não tem um aplicativo para celulares Android nem para iPhone. Toda a configuração é feita por uma conta a ser acessada pelo site da Humane — ou seja, é preciso passar por algum tipo de tela (seja a de um computador, tablet ou smartphone) para realizar as configurações.

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Mais importante, a bateria pode ser um problema. A independência é de até 13 horas longe da tomada, já incluindo o carregador power bank que é enviado com o aparelho. Esse tempo é muito pouco.

Futuro da tecnologia pode mudar para sempre

O Ai Pin não deve substituir o iPhone. Mas talvez seja o primeiro aparelho a forçar uma mudança na forma como lidamos com os smartphones, que se tornaram o coração do nosso ecossistema digital.

Talvez a inteligência artificial possa, enfim, permitir que os dispositivos eletrônicos tornem-se mais pessoais e simples. Basta um comando de voz e uma mensagem é enviada, sem erros de digitação cometidos pela máquina. Outro comando de voz, e o aparelho consegue gravar um vídeo da rua em movimento. Mais uma ordem, e o dispositivo faz uma busca da internet e projeta as informações, de forma resumida, na palma da sua mão. Tudo isso sem tirar o celular do bolso.

Ai Pin, da startup Humane, é capaz de projetar informações da internet e recados na palma da mão Foto: Guilherme Guerra/Estadão - 28/2/2024

Vamos precisar de mais que um Ai Pin para largar as redes sociais, com os vídeos com bebês e animais de estimação que nos inundam de sensações boas. Parece difícil que abandonemos o TikTok e o Instagram a esta altura do campeonato — e talvez nunca o façamos. Mas um broche inteligente inteligente, equipado com inteligência artificial e realidade aumentada de ponta, pode reduzir nossa dependência das telas.

Além disso, o Ai Pin pode forçar uma resposta de empresas como a Apple. É fácil imaginar fones de ouvido e relógios inteligentes receberem esses recursos, que, ao fim e ao cabo, só dependem de uma boa inteligência artificial para funcionar. É difícil cravar que a Humane vai sobreviver ao mercado de tecnologia.

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Ainda assim, a startup americana já deixou sua marca, simplesmente porque vai na contramão do que o mercado de tecnologia vem apostando nos últimos anos, ao mesmo tempo em que se catapulta na tendência da inteligência artificial.

Somente nos últimos meses, aparelhos de realidade virtual (RV) e realidade aumentada vêm aparecendo com mais frequência, tentando nos convencer a adentrar ainda mais na internet. Em fevereiro, a própria Apple lançou o Vision Pro, óculos de computação espacial por US$ 3,5 mil, enquanto a Meta, de Mark Zuckerberg, aposta em óculos e capacetes para pavimentar o futuro do metaverso. Essa é uma aposta alta das companhias, que ainda não se provou promissora.

A Humane pede que olhemos o mundo à nossa volta. O Ai Pin parece ter sido criado para estar ali no dia dia, em stand-by, pronto para receber uma ordem e cumpri-la rapidamente. E essa é uma necessidade que, pouco a pouco, queremos resolver — não queremos nossos filhos e netos crescendo sem viver o mundo, grudados às telas. É preciso reduzir o tempo de tela, dizem especialistas e até as próprias empresas de tecnologia.

O Ai Pin pode forçar que repensemos o smartphone. Da mesma forma que o iPhone, em 2007, nos fez repensar o celular.

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*Repórter viajou a convite da Intel

Análise por Guilherme Guerra

Repórter do Estadão desde 2018, com passagem pelas coberturas de educação, internacional, economia e tecnologia. Formado em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero e pós-graduado em Estudos Brasileiros pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

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