No mundo dos celulares, muitas vezes uma pequena sacada pode ser o suficiente para mudar o patamar de um dispositivo. Lançado em setembro com preços entre R$ 9,5 mil e R$ 14,5 mil, o iPhone 14 Pro carrega na manga um desses truques com potencial para tirar celulares da mesmice - ao menos, os da Apple.
A grande novidade da nova geração dos celulares da marca é o recurso batizado de “ilha dinâmica” (ou Dynamic Island), que funciona por meio da integração profunda entre o hardware e o software do aparelho, algo que reforça a reputação da companhia de saber combinar profundamente os dois lados da mesma moeda.
Fisicamente, a ilha substitui a “franja”, o entalhe retangular na tela que acompanhou o iPhone entre 2017 e 2021. O espaço era necessário, pois acomodava uma grande quantidade de componentes: câmera infravermelha, sensor de proximidade, sensor de luz ambiente, caixa de som, microfone e câmera frontal.
Ainda que fosse possível reduzir o tamanho da franja, algo feito somente no iPhone 13 Pro em 2021, a Apple precisava do espaço para manter o funcionamento de recursos como o reconhecimento facial e a boa qualidade das selfies - isso, porém, não significa que a franja seja bonita.
A concorrência, como a linha Galaxy S da Samsung, conseguiu encontrar designs bem mais atraentes: surgiram celulares apenas com um furo na tela para câmera, ou com recorte na forma de “gota”. Celulares mais “bonitos de rosto” começaram a aparecer até entre os modelos intermediários de marcas como Motorola e Xiaomi.
No iPhone 14 Pro, a Apple rearranjou os componentes e conseguiu substituir a franja por um entalhe em forma de pílula - ou uma ilha no mar de vidro da tela. Mesmo menor em relação à franja, a ilha não eliminou completamente o fato de que há um elemento preto perceptível no painel. A solução da Apple foi transformar esse espaço por meio de software em um elemento ativo do funcionamento do celular.
Assim, a ilha dinâmica virou a nova central de notificações do iPhone. É ali que o telefone vai indicar quando você conecta fones de ouvido, quando a bateria cai abaixo dos 20% ou quando alguém está ligando. Cada uma das notificações varia em tamanho e função conforme o recurso ou app em uso - como o nome indica, é um recurso dinâmico.
Não apenas isso, a ilha dinâmica é um jeito mais esperto de usar dois apps ao mesmo tempo sem necessariamente precisar que eles dividam a tela. Por exemplo, o Apple Music e o Spotify ficam exibindo a capa do disco e uma representação gráfica de ondas sonoras. Já o Apple Maps exibe as direções - e a metragem para tomar ações - sem exibir todo o mapa, permitindo que o restante do painel mostre outro aplicativo.
Além disso, alguns apps permitem a expansão da ilha. Nesse caso, basta tocar nela para que ela cresça e exiba mais informações, como se fosse um widget. No caso dos mapas, é possível ver o nome das vias. No caso de uma ligação, ela exibe o nome de quem está ligando. Em todos os casos, tocar na ilha dinâmica também pode levar ao app de origem da informação.
Certamente, este texto não faz justiça a como a ilha dinâmica pode ser interessante (assista o vídeo acima para entender melhor o funcionamento). O importante é que, embora o nome “ilha” possa transmitir a ideia de isolamento, o recurso conecta o usuário a mais funções do iPhone.
Embora o nome “ilha” possa transmitir a ideia de isolamento, o recurso conecta o usuário a mais funções do iPhone
O recurso também abre a possibilidade para que desenvolvedores o explorem de maneira criativa. Seria incrível, por exemplo, se o app do Uber exibisse a distância que falta para o motorista chegar. Fazer isso acontecer é uma obrigação da Apple.
O iOS 16 foi lançado há um mês e quase nenhum desenvolvedor aproveitou o recurso. Sem adoção massiva, especialmente, por apps mais populares, a funcionalidade corre o risco de virar um penduricalho. Até aqui, a ilha mostrou ser divertida e dona de um potencial grande, mas ela não pode depender exclusivamente de apps criados pela Apple.
Câmera
Como nas últimas gerações, o sistema de câmera mantém um conjunto triplo, com lente principal, ultra-angular e telefoto. A principal novidade é que o sensor principal agora tem 48 MP e usa a tecnologia “quad-pixel”, o que significa que 4 pixels são agrupados, formando um único pixel, para resultados mais precisos e detalhados. É um recurso já visto há alguns anos na indústria, em modelos de Samsung, Motorola, Xiaomi e Huawei.
Na prática, isso significa que as fotos por padrão são de 12 MP, embora seja possível ativar o modo 48 MP para imagens enormes, que permitem zoom e recorte em ambiente profissional. Fica ótimo, mas os arquivos produzidos são enormes, e dificilmente há demanda para o uso diário da ferramenta.
A Apple afirma que o sensor principal é 65% maior que o do iPhone 13 Pro, mas é possível notar pouca diferença entre os aparelhos. No geral, as fotos mostram detalhes bastante interessantes e níveis de cores e contraste bem agradáveis. Para alguns, o resultado pode parecer demasiadamente processado - não é o meu caso. O que continua incomodando é o fato de o processamento ter uma tendência a escurecer as fotos, principalmente elementos mais escuros, que estão sob sombras.
Dois dos recursos mais bacanas de gerações anteriores continuam muito bons: o modo noturno (para fotos em ambientes pouco iluminados) e o modo retrato (que desfoca o fundo). No segundo caso, a Apple melhorou também o desfoque de objetos no primeiro plano, o que é algo bem-vindo. Antes disso, o recurso funcionava bem apenas com elementos atrás do objeto principal. Outro recurso aprimorado (embora pouco usado) é o modo macro, que utiliza a lente grande-angular e entrega mais detalhes.
Falando na lente ultra-angular, ela faz parte do novo pacote com quatro tipos de zoom óptico do celular: 0,5x, 1x, 2x e 3x. Isso foi possível com a inclusão da lente teleobjetiva de 2x. Antes disso, o iPhone tinha os zooms 0,5x, 1x e 3x.
Na parte de vídeos, há duas novidades. Uma é a possibilidade de gravar vídeos em 4k e 24 quadros por segundo no modo cinema, aquele no qual é possível ajustar o foco durante a gravação. A mais empolgante delas, porém, é o modo ação, que estabiliza a imagem para a gravação de situações de bastante movimento. Nos testes da reportagem, o recurso deu a impressão de que os registros foram feitos usando um estabilizador (algo conhecido como Steadycam). A parte ruim do recurso é que ele não funciona bem em ambientes de baixa luminosidade e a resolução é de até 2,8K e 60 quadros por segundo. Vale bastante se você é atleta, precisa filmar crianças ou tem um cachorro maluco.
Bateria, performance e tela sempre ligada
Um dos recursos mais especulados em relação ao iPhone finalmente fez a sua estreia. A tela sempre ativa, que permite manter informações importantes sempre visíveis no painel, mesmo quando o aparelho está bloqueado. É uma ferramenta que aparece nos celulares da Samsung desde 2016, mas a verdade é que ela não faria falta caso a Apple se recusasse a correr atrás da concorrência.
Mesmo com a possibilidade de customizar a tela de bloqueio no iOS 16, poucos são os momentos nos quais a tela sempre ativa se mostra fundamental. Com tantas telas em volta em nossas rotinas, ter o relógio (e outras notificações) sempre ativos não parece ser algo fundamental. Pior: o recurso tem impacto na bateria do celular. Embora a Apple tenha desenvolvido uma tecnologia que regula a taxa de atualização do painel (varia entre 10 Hz e 120 Hz), o painel sempre ativo tem o seu custo energético.
Nos testes da reportagem, com o painel sempre ativo, o iPhone 14 Pro teve autonomia de 27 horas. Com o recurso desligado, e com o modo pouca energia ativado, foram 32 horas de bateria. Importante: não é possível manter o painel ativo com o modo econômico.
O novo painel de Oled consegue pico de 2.000 nits de brilho em ambientes externos. De fato, o componente é bastante agradável e desfila tranquilo até em ambientes muito ensolarados. Porém, é difícil perceber grandes diferenças em relação às últimas gerações do iPhone. Em relação ao tamanho, o painel tem 6,1 polegadas no 14 Pro e 6,7 no 14 Pro Max, o irmão maior da família.
Em relação à performance, o iPhone 14 Pro traz o novo chip A16 Bionic. Embora mantenha a tradição de manter o celular entre os mais potentes do mercado, a performance não parece ser diferente do A15 Bionic. Veículos especializados que realizaram testes com o processador reforçam a impressão, chamando ele de “A15 melhorado”. Nos testes de uso do Estadão, tudo fluiu bem, inclusive jogos mais exigentes no processamento.
Vale a pena?
Fazia tempo que o iPhone não oferecia uma novidade tão empolgante quanto a ilha dinâmica. Uma rápida retrospectiva dá a medida: o iPhone X apresentou a franja, o iPhone 11 elevou o nível das câmeras, o iPhone 12 trouxe o design mais quadrado e o iPhone 13 reduziu a franja. A ilha dinâmica não apenas elimina o entalhe original, como oferece funcionalidade ao elemento.
Claro, o recurso pode ser melhorado, mas há potencial para uma nova forma de usar o telefone. No resto do conjunto, o sistema de câmeras e a performance garantem o aparelho como um dos mais importantes do mercado - nem mesmo a aposta da tela sempre ativa remove o novo aparelho da Apple deste posto.
Para quem pode (afinal, os aparelhos da Apple no País custam muito caro), a atualização é muito bem-vinda, mesmo para quem vem do iPhone 13 Pro. Afinal, o iPhone 14 Pro tirou o iPhone da mesmice.
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