O Apple Vision Pro, óculos de realidade mista da gigante da tecnologia, foi anunciado no último dia 5, mas, apesar do barulho, ele foi testado por pouca gente. Em ambiente altamente controlado, jornalistas de poucos veículos no mundo tiveram acesso ao dispositivo. Nos 30 minutos de apresentação, não foi permitido fotografar ou fazer vídeos, mas as primeiras experiências já estão sendo publicadas.
O Vision Pro, que custará a partir de US$ 3,5 mil e chega ao mercado dos Estados Unidos no começo de 2024 (não há informações sobre o Brasil), tem causado impressões distintas. Para o Tom’s Guide, o Vision Pro lança as bases para a era pós-iPhone. O jornal britânico The Independent concorda e considera que o dispositivo é uma declaração convincente sobre os rumos da computação. “A pergunta não deveria ser se isso mudará o mundo, mas como”, afirma o jornalista inglês Andrew Griffin.
Já o New York Times traz uma perspectiva mais sóbria. “Senti como se não houvesse nada muito novo para ver”, avalia o colunista de tecnologia Brian X Chen, que também questiona se haverá demanda para um uso constante do produto.
Peso e vedação de luz incomodam
Em um primeiro contato, o Vision Pro - descrito como “os óculos de esqui mais sofisticados e futuristas que você já viu”, pelo The Verge - se encaixa suavemente na cabeça do usuário. Ele acompanha alças, que, ajustadas, garantem firmeza e conforto. O Independent comparou a sensação ao uso dos fones de ouvidos AirPods Max, que têm volume semelhante e linguagem de design parecida.
Apesar da maior sofisticação e do esforço da Apple para que o produto seja emplacado como a nova fronteira da computação, o The Verge destaca ser difícil não comparar o Vision Pro a outros dispositivos de realidade virtual (RV) disponíveis no mercado. “Ele se parece e se comporta como um headset de realidade virtual”, considera o editor-chefe Nilay Patel.
Ainda que os óculos sejam relativamente leves, o uso a médio prazo causou alguns incômodos. Turbinado pela combinação dos processadores M2 e R1, é esperado algum grau de aquecimento no dispositivo. Para driblar isso, ele ventila o calor, puxando o ar de baixo e o liberando pela parte superior. No entanto, segundo o Washington Post, ao longo dos 30 minutos de teste, a robustez do Vision Pro e a sensação térmica podem fazer com que seja cansativo usá-lo
John Gruber, do Daring Fireball, considera que o mais inconveniente da experiência é o peso do óculos, que é maior do que parece. “Não é desconfortável, pelo menos não por 30 minutos, mas eu nunca me esquecia de que ele estava lá e dava a sensação de que minha cabeça estava um pouco inclinada para a frente.” A revista Wired considera que o peso pode ser causado pelo pacote de bateria externa.
Gruber também destaca como ponto fraco a vedação da luz nos óculos, que é “boa, mas não perfeita”. No caso do Washington Post, que levou uma dupla de jornalistas para a demonstração, o vazamento da claridade não foi o mesmo entre os dois profissionais. “Um de nós achou que a tela parecia um pouco opaca, talvez, porque a unidade de teste tinha uma abertura ao redor do nariz que permitia a entrada de um pouco da luz muito mais brilhante do ambiente real”, escreve o repórter Chris Velazco.
O veredito é que a Apple precisará personalizar melhor a vedação do dispositivo quando ele for lançado para que se encaixe em diferentes formas e tamanhos de rostos.
O EyeSight, recurso que exibe os olhos do usuário na tela externa do Vision Pro, também causou impressões opostas.Projetado para que seja mantida a conexão com as pessoas ao redor, ele foi considerado “arrepiante” por alguns. O recurso, no entanto, pode ser desativado. É possível ir para o modo completamente imersivo girando a Digital Crown dos óculos. Nesse caso, o que aparece na lente é uma animação indicando o “modo não pertube”.
Possibilidades de imersão
Segundo os testes, leva de dois a três minutos para a calibração e rastreamento ocular até que o usuário entre no mundo do Vision Pro. John Gruber, do Daring Fireball, descreve a experiência como estável, em um limiar entre “a realidade e um filme”. O campo de visão do blogueiro coincidiu perfeitamente com o do aparelho. Não houve distorções ou quaisquer aberrações em sua visão periférica.
A tela de 4K para cada olho e a passagem de vídeo sem latência também impressionaram Nilay Patel. O jornalista do The Verge, entretanto, reclama de ter visto áreas pretas em seu campo, dando a sensação de que os óculos não são tão imersivos quanto os vídeos de marketing fazem parecer.
Um dos grandes momentos da experiência é a passagem pelas etapas de imersão montada pela Apple para que os usuários pudessem experimentar as funcionalidades propostas pelo dispositivo. A jornada incluiu navegar no Safari, passar por uma comemoração de aniversário, assistir trechos do filme Avatar: O Caminho da Água, em 3D, e demonstrações com dinossauros e com um jogo de basebol, ambos também em 3D.
Por fim, é feita uma rápida chamada por FaceTime usando uma persona em 3D gerada por inteligência artificial (IA). Esse é, consensualmente, o ponto considerado mais fraco pela crítica. A experiência, descrita como “um vídeo deep fake de uma pessoa real”, pelo New York Times, causou certo desconforto. As personas pareceram artificiais com movimentos descoordenados nos lábios e olhos.
Lauren Goode, da Wired, descreve o momento com estranheza. “Na minha demonstração do FaceTime, conversei com o gêmeo digital de uma funcionária da Apple que me explicou algumas funcionalidades. No entanto, ela parecia não ter corpo. Ela era real, mas também não era. Infelizmente, nem me lembro do seu nome.”
A perspectiva sobre os outros momentos, no entanto, varia numa escala que vai da surpresa ao desinteresse. O jogo de basebol foi, para John Gruber, do Daring Fireball, completamente imersivo e tridimensional. “A perspectiva não era nem mesmo das arquibancadas, mas do banco de reservas do time da casa, no nível do chão, bem atrás da primeira base”, descreve o blogueiro, que pagaria de bom grado para reviver a experiência.
Andrew Griffin, do Independent, destaca que as fotos, mesmo de uma perspectiva 2D, podem trazer um novo panorama ao usuário. Para ele, foi quase possível “cheirar” as situações retratadas.
O New York Times, porém, considerou as simulações mais do mesmo. Mesmo reconhecendo a “proeza tecnológica da Apple”, o jornal não a caracteriza como uma funcionalidade que gostaria de usar corriqueiramente.
Preço como obstáculo
Em comparação com a concorrência, os óculos da Apple parecem estar em outro patamar. The Verge e Daring Fireball consideram o Vision Pro superior a tudo que foi lançado na última década, seja da Meta, da Magic Leap ou da Sony.
O Independent considera sem sentido compará-lo com outros headsets, como os feitos pela Meta, não apenas pelo produto da Apple ser melhor, mas, principalmente, por ser algo bem diferente do que já existe.
Para o jornal inglês, a principal questão para a empresa de Cupertino é convencer os consumidores a comprarem os óculos. Apesar dos pontos positivos, o principal obstáculo para que o aparelho se torne atrativo é o seu preço de US$ 3,5 mil, quase R$ 17 mil em conversão direta.
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