A Apple lançou o novo MacBook Air em março deste ano e logo apresentou a máquina como “o melhor notebook para a inteligência artificial”. Por preços que partem de R$ 12,5 mil e vão até R$ 27 mil na configuração mais potente, o computador de colo ultrafino da marca americana é certamente um dos melhores do mercado e promete aguentar o tranco de anos diários de uso – mas, até o momento, parecem faltar alguns recursos básicos de IA para esse computador de fato ser o melhor no segmento, segundo os testes do Estadão.
A principal novidade deste MacBoook Air é o novo chip M3. O processador vem com 16 núcleos de redes neurais, dedicados justamente às tarefas de inteligência artificial – esse é o chip com o maior número de processamento neural da história da Apple. Além disso, o M3 foi desenhado com tecnologia de 3 nanômetros e traz CPU de até 8 núcleos e GPU de até 10 núcleos, responsáveis por tarefas cotidianas e processamento de vídeo. A memória RAM vai de 8 GB (tamanho insatisfatório, diga-se) a até 24 GB, e as telas podem ser de 13 ou 15 polegadas.
O modelo enviado pela Apple para os testes do Estadão é uma máquina com configurações mais potentes do que o modelo mais básico à venda na loja. Trata-se de um laptop com tela de 15 polegadas, 16 GB de RAM, 512 GB de armazenamento de memória. A cor é um lindíssimo azul da meia-noite, algo entre o preto e o azul – é bem bonito, mas deixa muitas (vale frisar: muitas mesmo) marcas de dedos (veja fotos mais abaixo) no alumínio, o que estraga um pouco a beleza da cor. Isso mesmo após a Apple ter divulgado que realizou um tratamento especial no material para evitar as impressões digitais.
Não é à toa que a Apple está divulgando esse MacBook Air em 2024 como um “laptop para a inteligência artificial”. Desde a chegada do ChatGPT, chatbot inteligente da OpenAI, em novembro de 2022, todo o mercado de tecnologia entrou numa corrida para adaptar produtos e serviços para o que se espera ser uma revolução sem precedentes na computação e na internet.
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Esse MacBook Air em 2024 é uma forma de entrar nessa corrida. Segundo a Apple, as redes neurais do chip M3 permitem que a máquina cumpra tarefas de aprendizado de máquina no próprio dispositivo, sem recorrer à nuvem nem exigir conexão de internet. Atualmente, os modelos de IA enviam as informações do usuário para a nuvem e “trazem” a resposta de lá, o que pode ser lento e, mais importante, desrespeitar as melhores práticas de privacidade. Permitir que todo o processamento, ou parte dele, ocorra no aparelho evita esse tipo de impasse.
Em março, a Apple afirmou que o chip M3 poderia rodar localmente modelos amplos de linguagem (LLM, na sigla em inglês) e modelos de difusão, justamente as duas tecnologias que permitiram o avanço na IA nos últimos anos. O comunicado diz também que a máquina poderia aproveitar recursos de aprendizado de máquina em aplicativos específicos, como realizar contas matemáticas pelo Goodnotes 6, editar fotos pelo Pixelmtor Pro, remover sons de fundo pelo CapCut, bem como Microsoft Copilot, Canva e Adobe.
Mais novidades do potencial de IA vieram em junho. Durante o evento Worldwide Developers Conference (WWDC) 2024, na Califórnia (EUA), a Apple anunciou uma série de recursos e aplicativos próprios para a inteligência artificial no iPhone, iPad e nos computadores Mac. São funcionalidades de transcrição em tempo real, textos e imagens gerados por máquina, edição de fotos e vídeos, assistente pessoal (Siri) mais inteligente e muitos outros recursos batizados de Apple Intelligence. Nada disso, porém, chega em breve. A Apple vai começar a liberar essas novidades para usuários nos Estados Unidos no fim deste ano. A partir do ano que vem, mais países recebem as funcionalidades – e, tradicionalmente, o Brasil não costuma estar entre os primeiros. Pode demorar mais de um ano, no mínimo, para que brasileiros abusem da inteligência artificial nos Macs.
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Também faz falta um botão dedicado à inteligência artificial no teclado. A Microsoft realizou uma baita inovação ao criar um botão chamado de “copiloto” no teclado, permitindo que o usuário acione um chatbot rapidamente ao pressioná-lo. A Apple poderia adotar solução semelhante, permitindo acionar a Siri diretamente, sem recorrer a um atalho no teclado ou ou a um clique no mouse.
Esses recursos fazem falta no MacBoook Air. Não porque a máquina é incompleta, mas porque ainda falta inserir funcionalidades vindouras de IA ao sistema para, aí sim, ver como é o desempenho do laptop ao gerar imagens criadas por máquina, retocar vídeos ou usar chatbots. Talvez esse não seja “o melhor notebook para inteligência artificial” – ainda.
Nem o Windows nem o macOS, nem seus desenvolvedores, ainda sabem como tirar proveito desses recursos de IA que os poderosos chips turbinam. Tudo ainda é muito incipiente
Esse não é um problema somente da Apple. O novo MacBook Air se junta a uma nova categoria em ascensão no mercado, a dos notebooks com inteligência artificial no dispositivo (AI on device). Trata-se de máquinas com chips com mais núcleos neurais – ou seja, capazes de rodar modelos de inteligência artificial com mais velocidade no próprio computador, sem recorrer a conexão de internet em alguns casos. Marcas como Lenovo e Dell unem-se a fabricantes de chips como Intel e Qualcomm para anunciar esses dispositivos, que, lentamente, começam a tomar as lojas. Mas nem o Windows nem o macOS, nem seus desenvolvedores, ainda sabem como tirar proveito desses recursos de IA que os poderosos chips turbinam. Tudo ainda é muito incipiente.
A Apple vem criando chips próprios para rodar IA há quase uma década. Primeiro, para o iPhone X, com o chip A11 Bionic, em 2017. Depois, para os computadores Mac, quando, em 2020, a companhia abandonou uma parceria de 20 anos com a Intel para adotar processadores próprios de silício, batizados de M1. Então surgiram o M2 (2022) e o M3 (2023), com as variações Pro e Max para os mais potentes.
O MacBook Air M3 é a continuação de uma era de inteligência artificial nos computadores e dispositivos móveis da Apple. Chips mais poderosos devem vir nos próximos meses e anos. Mas nada disso vai adiantar se a companhia e desenvolvedores não lançarem recursos interessantes para tirar proveito desses processadores.
Não é o modelo definitivo, mas esse MacBook Air parece ser um começo promissor para a era da inteligência artificial.
Avaliação geral do MacBook Air M3 (2024)
Não dá para negar: o MacBook Air cumpre bem tarefas básicas de cotidiano. Navegar na internet, escrever em processadores de texto, manipular planilhas, criar apresentações, assistir a filmes e séries e jogar alguns games mais leves são atividades tranquilas para esse notebook. E, tão importante quanto, não há engasgos entre um programa e outro, graças à estabilidade do sistema operacional da Apple, o macOS.
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A loja de aplicativos do Mac, bem como os programas disponíveis para baixar na Web, tornam o computador ainda mais interessante. Milhares de apps podem ser baixados, inclusive um aplicativo oficial recém-lançado do ChatGPT, da OpenAI. A Apple permite integrar as informações com o iPhone (ou iPad), então é possível continuar a tarefa de um dispositivo e terminá-la em outra, instantaneamente.
Além disso, a bateria dura impressionantes 18 horas, e o laptop pode facilmente superar mais de um dia inteiro longe da tomada. A câmera de 1.080p permite participar de reuniões sem a necessidade de instalar uma webcam externa. E a caixa de som, com seis alto-falantes, torna o som cristalino para as mais diversas modalidades de uso, de música e filmes a videoconferências.
Ou seja, o MacBook Air é um excelente computador para acompanhar no trabalho, na escola ou na universidade. Mas não serve para profissionais da indústria criativa, que demandam maior capacidade de processamento e uma máquina com sistema de resfriamento, como ventoinhas. Nem para quem busca um computador para games de última geração, categoria em que a Apple sempre perdeu para rivais como Alienware e Asus.
O MacBook Air 2024 não tem muito mais novidades. O chip M3 é a grande notícia desse computador, que é exatemente igual à máquina de 2022. À época, a Apple inseriu o novíssimo chip M2 e realizou um redesign bastante funcional (tornando a máquina ultrafina e ultraleve), implementou novas cores, atualizou a câmera, aumentou o trackpad e deixou o teclado mais silencioso.
Pode ser mais interessante considerar comprar o MacBook de 2022, e não o de 2024
Hoje, o MacBook Air com M2 está à venda no Brasil a partir de R$ 11 mil. A diferença, além do valor a ser desembolsado, é um chip com menos núcleos, inclusive próprios para inteligência artificial. No médio prazo (a partir de cerca de quatro anos de uso), isso deve fazer diferença entre as duas máquinas, com as atualizações do sistema e mais aplicativos demandando serviços de IA rodando localmente. O preço, porém, é tentador para quem não faz um uso tão intensivo e deseja apenas navegar na web. Para esses, pode ser mais interessante considerar comprar esse modelo, e não o de 2024.
Um computador ainda parece mais interessante que um tablet da Apple. Neste ano, o iPad Pro recebeu o chip M4 (até então inédito, inclusive nos computadores da marca). Em tese, isso significa que os tablets estão mais potentes que o notebook da marca americana - a justificativa é que o M4 é mais hábil no processamento de imagens tridimensionais. Mas vale ressaltar que um tablet é diferente de um laptop: não há mouse nem teclados, que devem ser comprados, e o sistema operacional é diferente. Um iPad Pro com caneta inteligente e teclado sai por R$ 17 mil na configuração mais básica
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Em 2024, o MacBook Air continua como a opção mais segura para quem é um usuário de dia a dia, mas não faz uso de programas e aplicativos mais complexos. A portabilidade e fácil integração com o iPhone são os maiores destaques. Mas a ausência de funcionalidades de inteligência artificial precisam ser resolvidas, já que rivais como Microsoft e Google estão entrando com tudo nessa área. Falta a Apple acelerar o passo.
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