Há cerca de 35 anos, Mickey Mouse ganhou um rival no mundo dos games: o encanador saltitante Mario. O personagem já era conhecido de outros games, mas foi no final de setembro de 1985 que ele despontou para o estrelato com Super Mario Bros., originalmente lançado para o Nintendo Entertainment System (o popular NES ou “Nintendinho”, aqui no Brasil).
Lá em 1985, o Super Mario Bros. foi um jogo inovador. O game funcionava como uma história em desenho animado desafiadora e onírica que rolava na tela da TV. Os jogadores controlavam Mario, fazendo-o correr, pular e até nadar em fases cheias de cogumelos gigantes, tartarugas ameaçadoras e outros obstáculos estranhos. Era um jogo difícil, mas não difícil a ponto desencorajar os jogadores, que ficavam ávidos para tentar mais uma vez. E mais outra. E mais outra. Depois veio uma sequência (que tinha sua própria história fascinante). E mais outra. E outra.
O mais recente jogo de Mario, Super Mario Bros. 35, lançado há alguns dias para o Nintendo Switch, permite que 35 pessoas joguem o Super Mario Bros. original ao mesmo tempo, cada uma competindo para ser o último Mario a sobreviver. Uma espécie de fusão de Super Mario com Fortnite. Aqui estão 35 fatos para se pensar sobre esse encanador tão extraordinário.
1. Primeiro, é o jogo Super Mario Bros. que faz 35 anos, não o Mario em pessoa – que tem 39 anos e estreou em 1981 em outro jogo famoso da Nintendo, o Donkey Kong. É aquele no qual ele escala uma série de vigas, pula barris e sobe escadas para resgatar uma moça sequestrada por um macaco gigante.
2. Nos primeiros anos dos videogames, os personagens eram menos definidos por quem eram e mais pelo que conseguiam fazer. Pac-Man engolia pontinhos e perseguia fantasmas – ou era perseguido por eles. Sonic corria bem rápido. Mario pulava. Na verdade, antes de os criadores de Donkey Kong o batizarem de Mario, eles o chamavam de “o cara que pula” (Jumpman, em inglês).
3. Mario é tão famoso que até mesmo seu irmão, Luigi (com quem já era possível jogar no Super Mario Bros., no modo de dois jogadores), é um superstar. Luigi tem mais personalidade: é nervoso, preocupado e vive meio que à sombra de seu irmão famoso. A Nintendo escolheu 2013 como o “Ano do Luigi”. Você lembra de alguma comemoração?
4. Não se sabe ao certo qual é o sobrenome de Mario. Às vezes, o pessoal da Nintendo diz que é Mario (pois Mario e Luigi são os “Mario Bros.”, os irmãos Mario), então seu nome seria Mario Mario. Outras vezes, eles dizem que não tem sobrenome nenhum.
5. Também tem o Wario, uma espécie de Mario do mal. Ele estrelou mais de uma dúzia de jogos, como Wario Land e WarioWare.
6. Tem até um Waluigi, o Luigi do mal. Ele não estrelou nenhum jogo, mas é um bom coadjuvante.
7. Como os games modernos vêm apostando menos nos personagens mascotes, Mario se destaca como uma relíquia. Os principais videogames ainda são populares por causa do que você faz neles, mas um jogo como Fortnite não vincula suas ações a um único personagem icônico.
8. Nem mesmo a Nintendo anda criando muitos personagens nos dias de hoje. Eles estão mais ocupados em capitalizar em cima dos personagens antigos. Na verdade, estão levando Mario para filmes de animação e parques temáticos apoiados pela Universal Studios.
9. A música tema de Super Mario Bros., do compositor Koji Kondo, talvez seja a trilha mais reconhecível de todos os games. Doo-doot-doo da-doot doo!
10. A essência de toda a experiência de jogo de Super Mario Bros. pode ser ilustrada pelo arco de um salto: a subida da descoberta, a descida da conquista. A primeira e deliciosa descoberta do jogo original vem logo nos segundos iniciais, quando o jogador faz Mario pular e bater a cabeça num bloco flutuante. Aí surge um cogumelo que deixa o Mario bem maior. E, quando Mario se depara pela primeira vez alguns inimigos saltitantes, ele só consegue derrotá-los pulando na cabeça deles.
11. A reputação de Mario como um entusiasmado saltador possibilitou que a Nintendo o transformasse num avatar exuberante. Ele é a estrela de uma série de outros jogos, cada um trazendo uma nova abordagem para seu gênero. Mario Kart é um jogo de corrida onde você pode lançar cascas de banana na pista. Mario Tennis é um jogo de tênis turbinado. Você já imaginou como é o Mario Party… uma festa, claro!
12. Existe até uma linha de games do Mario que traz versões exageradas dos jogos olímpicos. Mario & Sonic nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, lançado em 2019, mostra Mario e seus amigos competindo por medalhas numa Olimpíada que foi adiada por causa da pandemia.
13. A vibe alegre e colorida dos jogos do Mario às vezes deixa a Nintendo fora de compasso com as tendências dos games. Em 2003, o que estava bombando era a franquia de jogos Grand Theft Auto, que dava aos jogadores a possibilidade de roubar carros e matar quase todo mundo, até mesmo as prostitutas. Cue George Harrison, ex-executivo da Nintendo, tentou defender sua marca com uma fala meio desajeita numa entrevista coletiva: “Mario jamais vai atirar em p...”.
14. A alegria de Mario continua irreprimível. Hoje em dia, Mario e Grand Theft Auto parecem estar lado a lado em termos de popularidade.
15. A esplêndida estranheza de Mario também sobrevive. Aquela coisa meio onírica que os mundos do game tinham nos seus primórdios se estendeu às sequências de Mario modernas, nas quais, digamos, ele pode jogar seu chapéu sobre um dinossauro para domá-lo.
16. Se você acha que essas coisas do Mario são bizarras, você está em boa companhia. Em 2012, um redator do New York Times me pediu para esclarecer por que Super Mario coletava moedas. Para... colecionar? Para ganhar uma vida extra a cada centésima moeda? Porque os designers espalhavam as moedas nos jogos para guiar os jogadores de uma fase para outra?
17. O Super Mario Bros. original contém aquele que talvez seja o mais famoso dos atalhos de videogame: uma façanha intencional em que Mario rompe o teto da primeira fase subterrânea do jogo para entrar nas tubulações que levam a fases posteriores. Esse atalho sintetiza uma das verdades fundamentais dos videogames, esteja você jogando God of War ou Candy Crush: os jogadores sempre procuram maneiras de burlar o sistema.
18. Existem dois estilos principais nos jogos do Mario. Os chamados jogos 2D apresentam um Mario que corre pela tela da esquerda para a direita. O revolucionário jogo Super Mario 64, de 1996, mudou a série para as três dimensões e trouxe consigo grande parte da indústria de videogames. (No Mario 64, os jogadores veem Mario por trás e ele vai correndo à frente). O grande lançamento da Nintendo em setembro – Super Mario 3D All-Stars, para o console Switch – é uma compilação de Mario 64 e duas outras versões 3D posteriores: Super Mario Sunshine, de 2002, e Super Mario Galaxy, de 2007.
19. Os designers dos jogos Mario raramente mandam mal. O mais próximo do desastre que eles chegaram foi Super Mario Sunshine, que bota nas costas do Mario uma mochila que atira água. Até que é legalzinho.
20. Super Mario Galaxy é divino. Sua ideia central: colocar as aventuras de Mario em mundinhos esféricos e permitir que Mario pule ou voe de um para o outro.
21. Mario popularizou os jogos 3D, mas também repopularizou os jogos 2D. Em 2006, a Nintendo quebrou um jejum de 16 anos sem Mario 2D com o lançamento de New Super Mario Bros. Seu sucesso desafiou a sabedoria convencional do meio de que o progresso artístico devia se sincronizar com os avanços tecnológicos.
22. Três décadas de sequências de Mario exemplificam como os videogames em geral ficaram mais fáceis, ou como agora são projetados para respeitar mais o tempo do jogador. Os primeiros jogos limitavam severamente o número de vidas de Mario – ou seja, o número de chances que os jogadores tinham para tentar passar por uma fase. Os lançamentos mais recentes facilitam a tarefa de juntar vidas extras. Super Mario Odyssey, lançado em 2017, nem tem Game Over. Isso significa que, mesmo quando Mario perde todas as vidas, os jogadores podem recomeçar de onde pararam, sem uma penalidade significativa.
23. Antes disso, Super Mario Galaxy já trazia uma outra inovação para o grau de dificuldade do jogo: um modo “co-star”, que permitia que um segundo jogador usasse um segundo controle para ajudar o jogador principal.
24. A franquia Mario encarna a tensão entre propriedade corporativa e fandom como nenhum outro produto do mundo dos videogames. Os fãs criaram inúmeros jogos Mario não oficiais, muitos deles extintos pelos advogados da Nintendo.
25. Mas, se você não pode processá-los, venda algo a eles. Em 2015, a Nintendo lançou Super Mario Maker, que permite que os jogadores criem – mas não sejam donos – suas próprias fases de Mario 2D.
26. Até a Nintendo vem recriando sequências clássicas de Super Mario Bros. A melhor talvez seja a versão circular da primeira fase de Super Mario Bros. oferecida em WarioWare: Twisted, em 2004.
27. Os jogos Mario ajudaram a popularizar a onda do speedrunning, no qual jogadores habilidosos usam todos os truques imagináveis para completar os jogos o mais rápido possível. As corridas de Super Mario Bros. feitas em menos de cinco minutos, são disparadas deslumbrantes e quase mortais. Os novos recordes vêm sendo estabelecidos na casa dos centésimos de segundo.
28. Os jogos do Mario inspiraram o encantador Super Mario Broth, um feed de Twitter com obscuridades sobre Mario que recentemente revelou um detalhe sobre suas írises.
29. Alguns superfãs chegaram a sugerir que todos os jogos Mario existem numa mesma linha do tempo narrativa. Mas a teoria não funciona muito bem.
30. Alguns jogos do Mario são um pouco retrógrados. As tramas de todas as três versões na nova coleção 3D All-Stars, por exemplo, trazem Mario tentando resgatar a Princesa Peach.
31. A Princesa Peach chegou a ser protagonista algumas vezes, com resultados desiguais. Era possível jogar com ela no Super Mario Bros. 2, de 1988, e no Super Mario 3D World, que logo seria refeito. A Nintendo deu a ela um papel de protagonista em 2005 em Super Princess Peach, no qual ela resgata Mario, que foi sequestrado. Quais eram seus poderes naquele jogo? Bom, seu humor varia bastante. Os jogadores podem irritá-la para que ela fique pegando fogo, o que elimina os obstáculos ao redor. Ou então fazê-la chorar, para que suas lágrimas reguem as plantas e elas cresçam.
32. Os jogos do Mario destacam os problemas de preservação da indústria. São executados em hardware que muitas vezes ficam obsoletos em menos de uma década, o que dificulta o acesso aos jogos clássicos. Enquanto fãs e preservacionistas coletam e compartilham cópias piratas, os detentores dos direitos autorais têm o poder de decidir se os jogos continuam acessíveis ou não. No que diz respeito ao Super Mario Bros. original, a Nintendo faz todo o trabalho para garantir que o jogo rode nos seus dispositivos mais recentes e o vende com entusiasmo para cada nova geração de clientes.
33. Por outro lado, a Nintendo vendeu Super Mario Sunshine pela primeira vez no GameCube, que parou de ser produzido em 2007. Esse jogo também rodava no Wii, que foi aposentado por volta de 2012. Desde então, nenhum novo hardware de videogame rodava o Sunshine, até a coleção 3D All-Stars aparecer este mês para Switch. Se os principais jogos do Mario acabam ficando assim tão inacessíveis, imagine os jogos menos conhecidos.
34. A Nintendo é uma empresa popular, mas também meio esquisita, conhecida por ser um brilhante motor de criatividade e também por ter umas políticas estranhas. Prova nº1452 (mais ou menos): a Nintendo diz que só venderá sua nova coleção de jogos 3D Mario (assim como Super Mario Bros. 35) até 31 de março.
35. E finalmente: qual é o melhor salto de Mario? Eu indico o salto triplo de Super Mario 64 – três saltos em arco, acompanhados por três gritos vertiginosos. Talvez seja a melhor coisa de todos os tempos no mundo dos games. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
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