Tentar definir o rótulo “indie” dentro do mundo dos videogames pode ser uma tarefa mais difícil do que zerar qualquer game do encanador Mario de olhos vendados. Afinal, cabem neste rótulo jogos patrocinados por grandes empresas, mas produzidos por pequenas equipes autônomas (como Valiant Hearts, da Ubisoft), feitos por desenvolvedores em voo solo (como Braid, de Jonathan Blow) ou por estúdios, de fato, independentes – como é o caso dos suecos da Playside, que retornam após seis anos de silêncio com o surpreendente Inside.
Qualquer que seja a definição, é difícil negar a contribuição dos suecos ao gênero com Limbo – o game, lançado em 2010 ainda para o Xbox 360, foi um dos primeiros títulos a se aproveitar das lojas digitais para chegar ao público. Mais do que isso, ajudou a estabelecer a idéia de que às vezes, menos pode ser mais – ao lado de Braid, Super Meat Boy e Fez, estrelas do documentário Indie Game The Movie. Desde 2010, o jogo vendeu mais de 3 milhões de cópias com seu universo em preto e branco, bastante melancólico, e uma jogabilidade simples, mas desafiadora.
Seis anos depois, a Playdead parece retomar Inside de onde terminou Limbo – é bom frisar que tratam-se de duas histórias independentes. No jogo de 2010, os tons monocromáticos davam o tom da narrativa. Aqui, as cores aparecem, mas não se engane: elas só tornam o universo ainda mais sombrio, enquanto a discreta trilha sonora contribui muito para o clima.
A premissa dos dois games, no entanto, é bastante parecida: um protagonista jovem, de visual fofo, precisa percorrer ambientes perturbadores em duas dimensões, no melhor estilo do gênero plataforma. Muito pouco é dito sobre sua história: os detalhes de sua personalidade, bem como do mundo que cerca o personagem, vão sendo descobertos ao longo da história – e mais especificamente, apenas na parte final do jogo (em um ótimo nascedouro de teorias da conspiração).
Enquanto isso, é preciso se esconder de guardas impiedosos e cães ferozes, fingir que se está absorto como as outras pessoas do bizarro mundo do game (em uma cena que lembra o clipe de Another Brick in The Wall, do Pink Floyd) ou fugir de uma criatura de longos cabelos que devora qualquer coisa que estiver a seu alcance, debaixo d’água. Nem sempre é fácil – e muitas vezes será preciso repetir e repetir e repetir… e repetir uma fase específica do jogo, até aprender o que precisa ser feito para ir além. A experiência pode ser frustrante para alguns jogadores, mas faz parte da beleza e do deleite do jogo superar cada desafio.
Em termos de jogabilidade, Inside investe na lógica do “menos é mais”: com apenas três comandos (mover para os lados, saltar ou apertar um comando especial, que pode servir para empurrar ou erguer objetos e rodar manivelas), o game exige muito pouco do jogador em termos de habilidades manuais. Em compensação, a exigência cerebral é algo a ser levado em consideração – especialmente pela mistura bem azeitada entre “quebra-cabeça” e plataforma que Inside propõe.
Talvez o aspecto mais interessante de Inside, porém, esteja não no design do game em si, mas sim na junção dos desafios e das sensações que são reveladas ao jogador. Por vezes, o mais difícil não era simplesmente superar um obstáculo, mas sim lidar com as imagens cruéis que o game mostra caso as intenções do jogador fracassem. É o tipo de game que pode não ser bem aceito por qualquer jogador – não por conta de sua dificuldade, pura e simplesmente, mas sim de sua complexidade.
Vale a pena? Sim. Muito – a menos que seu coração seja fraco para ver personagens fofos sofrendo de alguma maneira. Seja pelo aspecto gráfico, pela premissa de fazer muito com pouco, pela narrativa misteriosa ou pelo desafio que vai além do mero apertar de botões, Inside é facilmente um dos melhores games do ano. Por enquanto, o jogo está disponível apenas para Xbox One e PC. Fãs do PS4, calma: a Playdead já anunciou que o game chega até o fim de agosto para o console. Melhor assim.
InsideDesenvolvedora: PlaydeadPublisher: MicrosoftPlataformas: Xbox One e PCPreço: R$ 37 (PC); R$ 39 (Xbox One); apenas digitalJá disponível no Brasil
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.