Carros sem motorista: quando veículos guiados por inteligência artificial chegarão ao Brasil?

Regulação e infraestrutura surgem como maiores gargalos para disseminação da tecnologia

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Foto do author Luciana Dyniewicz

O trânsito caótico de cidades brasileiras como Rio de Janeiro e São Paulo não será o maior empecilho para que os carros autônomos cheguem ao Brasil, na avaliação de consultores da área. A tecnologia desses veículos será capaz de detectar, por exemplo, os milhares de motociclistas que cruzam as ruas da capital paulista o tempo todo e reagir a eles. O grande desafio será regulamentar esse novo tipo de automóvel.

“O principal ponto é a legislação e o lado da responsabilização. Por mais que o número de acidentes caia com o carro autônomo, passaremos a ter uma máquina no comando. Quem vou responsabilizar se acontecer algo? Isso é uma discussão complexa e precisa passar pela aprovação da sociedade”, diz Carlos Libera, sócio da consultoria Bain and Company e especialista no setor automotivo.

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Há um projeto de lei em tramitação em Brasília para regulamentar os veículos autônomos. De autoria do deputado Alberto Fraga (PL-DF), o PL 1317/2023 estabelece que, em caso de acidentes, o fabricante ou o dono do carro poderão ser responsabilizados. O texto, no entanto, afirma que esses automóveis só poderão circular se estiverem ocupados por motoristas de segurança que tenham autorização especial para operá-los.

Mesmo nos Estados Unidos, onde já há carros sem motoristas circulando em algumas cidades, a regulamentação ainda é considerada um desafio. Lá, 25 dos 50 estados têm leis que permitem testes e implementação de veículos autônomos.

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Carros como o da Waymo podem demorar pelo menos 15 anos para chegarem ao Brasil  Foto: Waymo/Divulgação

Analistas do banco Morgan Stanley apontaram, em junho, a necessidade de o governo federal regular o setor para que ele avance. No mesmo relatório, eles destacaram que a Waymo (empresa que faz parte da Alphabet Inc, conglomerado que é dono do Google) levou dez anos para implementar o serviço de táxi autônomo em apenas três cidade, indicando que a adoção em massa não será rápida.

Para Libera, da Bain and Company, depois que os automóveis autônomos estiverem estabelecidos em mercados como o americano e o chinês, a tecnologia ainda deve demorar a chegar no Brasil. “Poderá acontecer de haver um ou outro carro rodando aqui, mas virar algo comum vai levar tempo.”

O consultor acrescenta que, quando se considera tecnologia de veículos elétricos e autônomos, o Brasil está de cinco a sete anos atrás dos países desenvolvidos. Ele lembra também que para que os carros sem motoristas sejam adotados em larga escala será necessário substituir toda uma frota que hoje está em operação, o que levará muito tempo.

A consultoria McKinsey trabalha com a hipótese de que esses automóveis comecem a se tornar mais comuns em centros urbanos, inclusive os brasileiros, entre 5 a 15 anos. A estimativa da empresa é que, em 2040, 15% dos carros vendidos em todo o mundo terão algum grau de autonomia. Isso significa que esses veículos não necessariamente dirigirão sozinhos, mas que ao menos terão ferramentas que auxiliam o motorista – estacionar de forma autônoma, por exemplo.

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O consultor Roberto Fantoni, sócio da McKinsey, afirma que trazer a tecnologia para o Brasil seria simples, mas que a regulamentação e a necessidade de uma infraestrutura de apoio dificultam a adoção. No caso do veículo da Waymo, por exemplo, é necessário mapear detalhadamente cada rua pela qual ele vai circular, o que inclui localização de semáforos, guias e faixas de pedestres.

Sócio da mesma consultoria, Daniele Nadalin lembra que mesmo na China, um país que costuma ser bastante aberto a inovações como a do carro autônomo, esses veículos hoje só podem circulam em perímetros específicos – assim como ocorre nos EUA. Por outro lado, ele aponta que não há dúvidas de que a tecnologia chegará aqui. “Não vemos diferença de um carro autônomo para um elétrico. Ele vai vir para o Brasil assim como o elétrico. Há desafios como infraestrutura e proteção da força de trabalho. Mas são temas que o País já enfrentou com a chegada do Uber, por exemplo.”

O preço desses automóveis é outro fator que pode dificultar a adoção. Nadalin calcula que as câmeras e sensores podem fazer com que um carro fique de 30% a 40% mais caro que um modelo tradicional.

Cybercab, carro autônomo anunciado pela Tesla Foto: Reprodução/X/@Tesla

Elon Musk, dono da Tesla, afirmou que o veículo autônomo da sua empresa custará menos de US$ 30 mil (cerca de R$ 180 mil). As promessas do empresário sobre carros sem motorista, no entanto, são vistas com desconfiança no mercado, dado que vários prazos estabelecidos por ele não foram cumpridos. Em outubro, ele inclusive afirmou que seu veículo estará disponível antes de 2027, para depois acrescentar que tende a “ser um pouco otimista”.

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Mais pessimista quanto à disseminação da tecnologia, o consultor Ricardo Roa, da KPMG, vê com maior chance a adoção por aqui de ferramentas de automação (como assistentes de direção) do que a de um serviço de “robotaxi”. “Não é possível ter um cronograma. É algo de nicho. A discussão no setor automotivo brasileiro hoje está mais relacionada à descarbonização do que a uma tecnologia para ter uma experiência diferente”, diz.

Roa afirma ainda não ver os carros autônomos sendo adotados em massa num prazo de 15 anos nem mesmo nos países mais avançados. “No Brasil, não vejo dando certo nem em algumas cidades, como Curitiba, em menos de 20 anos.” A regulamentação, acrescenta ele, envolverá discussões sobre cibersegurança – pois o veículo é conduzido remotamente via satélite –, o que pode ampliar o desafio.

Outra barreira é que esses carros estão sendo pensados pelas empresas como elétricos, e a falta de pontos de recarga de bateria no Brasil pode inviabilizá-los. O consultor, no entanto, pondera que o brasileiro é muito receptivo a novas tecnologias e que um sistema de mobilidade que facilita a vida do consumidor será atrativo.

“Em algum momento, vamos ter que avançar. Talvez em 50 anos, tenhamos isso disseminado. Mas é mais fácil que aconteça como lá fora, a passos curtos.”

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A repórter viajou como bolsista do World Press Institute (WPI)

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