Diminuição de investimento-anjo no País pode impactar futuro de startups

Aportes em startups no estágio inicial caíram 20% no País no ano passado; falta de política pública é obstáculo

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Foto do author Guilherme Guerra

Vulneráveis a condições macroeconômicas desfavoráveis, os investidores-anjo (conhecidos por serem os primeiros “salvadores” de startups em estágio inicial, trazendo dinheiro e conhecimento para as empresas) foram mais conservadores em 2020: foram desembolsados R$ 856 milhões para esse tipo de investimento no ano passado, recuo de 20% em relação ao ano anterior. Ocorreu também uma diminuição de 15% do número de investidores dessa categoria, totalizando 6,9 mil no Brasil, segundo dados divulgados em julho pela organização sem fins lucrativos Anjos do Brasil.

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“Se houver menos anjos, haverá um estrangulamento de startups nessa base, limitando o crescimento do ecossistema”, explica o fundador e presidente da Anjos do Brasil, Cassio Spina, em entrevista ao Estadão. “Podemos perder startups que poderiam estar surgindo, mas que não avançam por falta de capital.”

Apesar de haver sinais de recuperação em 2021, o cenário brasileiro ainda não é favorável às startups que estão começando, diz Spina. “A experiência internacional mostra que, para poder desenvolver a atividade de investimento em startups, tem de haver políticas públicas de incentivo. No Brasil, isso não existe”. 

Leia trechos da entrevista a seguir.

Por que caiu o investimento-anjo durante 2020?

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Existem dois perfis de investidor: o proativo, que é o que busca ativamente por uma carteira, e o passivo, aquele executivo que é procurado para investir e ajudar. Percebemos que, enquanto os proativos tiveram um ligeiro crescimento em 2020, os passivos tiveram uma queda bastante significativa. Isso aconteceu em função da pandemia, principalmente nos primeiros meses, quando houve impacto forte na economia, com bolsas caindo e economia parando. Depois disso retomaram os investimentos, mas alguns investidores sofreram impacto em seus próprios negócios e priorizaram os recursos antes de investir novamente.

O empresário Cassio Spina é fundador e presidente da organização sem fins lucrativos Anjos do Brasil, dedicada a promover o investimento-anjo em startups Foto: Werther Santana/Estadão

Por que isso aconteceu em um ano em que o aporte total em startups do País chegou ao recorde de US$ 3,5 bilhões?

Os fundos de investimento captam o recurso antes e investem depois. Assim que foi retomada a economia depois do baque inicial da pandemia, os fundos começaram a reinvestir o que estava planejado. Já o investidor-anjo usa capital próprio e é mais vulnerável à situação macroeconômica. Conheço investidor-anjo que é dono de uma rede própria de sapatos e que não iria voltar a investir até que o negócio se restabelecesse. 

Como tem sido 2021?

Tivemos uma recuperação e a perspectiva é positiva. O problema é que, em 2020, o Brasil também aumentou a defasagem em relação a investimentos em startups globalmente. A experiência internacional mostra que, para poder desenvolver a atividade de investimento em startup, tem de ter políticas públicas de incentivo. No Brasil, isso não existe.

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Quais as consequências que um baixo investimento-anjo pode trazer para o ecossistema de inovação no curto e longo prazo?

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Se houver menos anjos, vai haver um estrangulamento de startups na base, limitando o crescimento do ecossistema. Vamos perder oportunidades.

O que o governo pode fazer para resolver esse gargalo?

Não precisa reinventar a roda. Estimular é, no mínimo, equiparar o tratamento tributário dado a investimentos em startups. Hoje, por exemplo, para investir em startups no Brasil, você é tributado como renda fixa. Isso não tem o menor sentido, uma vez que startups têm um risco mais elevado e não têm liquidez. Ao investir numa empresa da Bolsa de Valores, se ela tiver valor abaixo de R$ 700 milhões, existe isenção total. Se for acima, no mínimo há como compensar as perdas com os ganhos, que é o  razoável. E, quando se investe em startups, não há como compensar. O governo afasta possíveis novos investidores do mercado de inovação com essa política de tratamento tributário desigual. Precisaríamos que uma parte desses 3 milhões de pessoas da B3 viesse para o investimento-anjo.

Qual é a situação do Brasil diante de outros países?

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Todos os BRICS, menos o Brasil, fazem equiparação tributária. A África do Sul tem uma política de permitir com que o investidor compense até 100% do volume investido. É o governo dizendo: “Invista em uma startup e eu devolvo esse dinheiro para você”, porque entendem que isso fomenta a economia, não aumenta a renúncia fiscal e gera arrecadação. O Brasil está com uma defasagem de 20 anos.

O quadro de investidores-anjos no Brasil é pouco diverso, sendo majoritariamente branco e masculino. Quais as consequências disso?

A falta de diversidade de gênero e de raça não é algo específico do Brasil, e sim global. Estudos comprovam que, além de dar oportunidades, a diversidade traz valor e melhora resultados. Por exemplo, empresas com empreendedoras do sexo feminino têm taxas de sucesso maiores do que em companhias com conselhos totalmente masculinos, porque traz outra visão e identidades complementares.

Outro ponto é que existe pouca diversidade regional no Brasil. Isso se refletiu nos dados da pesquisa?

Infelizmente sim. Existe concentração regional, mas o bacana é que conseguimos ter investidores em todas as regiões do Brasil. Claro, são quantidades pequenas, mas temos. Temos criado grupos regionais para reunir investidores locais e mostrar e fomentar o empreendedorismo.

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