Já pensou em começar a trabalhar numa empresa nova sem nem sequer ter trocado um aperto de mão ou tomar um cafezinho com seu novo chefe? O hábito está se tornando o “novo normal” em uma série de startups brasileiras, que estão mantendo seu ritmo de contratação em meio à pandemia do novo coronavírus. Nos unicórnios (empresas avaliadas acima de US$ 1 bilhão) Gympass, Loft e Wildlife, os novos funcionários estão sendo contratados remotamente e, para começar a trabalhar, recebem equipamentos e orientações em casa. Reunião com o chefe para saber o que fazer? Tudo por videoconferência – e muita ajuda do departamento de recursos humanos para encaixar as agendas.
Com mais de 100 vagas em aberto no mundo, a Wildlife está usando ferramentas online para conseguir selecionar as pessoas. “Temos a meta de dobrar o tamanho do nosso time e não podemos parar”, diz Gonzalo Mones, chefe global de recrutamento da empresa. “Conseguimos, por exemplo, passar um desafio de programação a um candidato e ver em tempo real, pela internet, como ele o resolve.”. Depois de selecionado, o novo funcionário recebe apoio a partir de e-mails e do programa de videochamadas Zoom. “Não é o ideal, mas fazemos o possível para o funcionário se sentir em casa”, afirma o executivo.
Na startup de compra, reforma e revenda de imóveis Loft, há a previsão de realizar 40 contratações até o final do mês – a empresa deve encerrar o trimestre com 550 funcionários. Nas últimas duas segundas-feiras, a companhia realizou dois processos de integração (onboarding, no jargão das startups) 100% virtual, com 37 novas pessoas.
“Antes do funcionário começar, abrimos um grupo de WhatsApp para tirar dúvidas. Depois que eles são integrados, mudamos o grupo para o Slack”, afirma Ricardo Kauffman, líder de relações públicas da Loft, fazendo referência para o software de mensagens corporativas que tem se destacado em tempos de home office. Ao Estado, Kauffman afirma que o planejamento de contratação a partir de abril ainda está em aberto. A empresa também tem interrompido suas atividades de reforma em prédios que tem casos suspeitos de coronavírus e ampliou o horário de almoço das obras, para dar mais conforto aos “vizinhos que também estão fazendo home office”.
Na Gympass, dona de um serviço de assinatura corporativo de academias, a única grande diferença é que os recém-chegados ainda estão buscando computador no escritório da empresa, na zona sul da capital paulista – mas o processo deve ser interrompido nos próximos dias, com as máquinas sendo enviadas à casa dos colaboradores. A empresa também faz sessões virtuais de integração. “A sessão presencial é cheia de situações e é mais gostosa de participar. A virtual não é tão interativa, mas a gente conta com a compreensão de todos”, diz Marcelo Festa, gerente de desenvolvimento e treinamento da startup. Na última segunda-feira, 16, 30 “novatos” participaram do processo de onboarding.
A realidade é parecida com a de empresas que têm escritórios em várias cidades ou utilizam mão de obra localizada remotamente, prática comum no mercado de tecnologia. Mas adaptá-la de forma a atender todos os novos funcionários tem sido diferente. “Nós gostamos de fazer piada e tomar café, mas o maior desafio é conseguir passar a cultura da empresa”, diz Festa, do Gympass.
Ritmo
Em outras empresas, no entanto, há uma divisão de prioridades, com recrutamentos seguindo seu ritmo normal e integrações sendo adiadas. É o que acontece na fintech Creditas, por exemplo: com 70 vagas abertas no Brasil, na Espanha e no México, a empresa está fazendo seleção remota para todos os candidatos e os aprovando, mas decidiu “adiar a entrada dos novos colaboradores por agora”, disse Juliana Gusmão, gerente de recrutamento da startup.
A possibilidade de fazer uma pausa no ritmo de contratações também foi admitida por André Baldini, presidente executivo da Superlógica, startup campineira que acabou de receber um aporte de R$ 300 milhões do fundo americano Warburg Pincus. Com meta de quase dobrar sua equipe ao longo do ano, a empresa de software para condomínios residenciais pode ter que rever suas metas e processos de recrutamento, revelou o executivo ao Estado no início da semana.
Segundo levantamento da startup de recrutamento Revelo, que tem mais de 14 mil clientes, incluindo marcas como Itaú e Ambev, o volume de agendamento de entrevistas está caindo cerca de 12% por conta do coronavírus, com muitas empresas adiando processos de contratação pela dificuldade de fazer a integração do funcionário.
No setor de tecnologia, porém, a empresa espera um crescimento de 15% nas contratações de vagas em operações e tecnologia, que tem maior flexibilidade de trabalho remoto. “O que vemos é um movimento de preparação dos RHs para conduzir processos e os times estejam completos caso a situação do coronavírus se intensifique”, afirma Lucas Mendes, presidente executivo da Revelo.
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