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Kaszek: ‘Ainda há capital disponível para startups que fazem bom trabalho’

Gestora de investimentos vê crescimento nas fusões e aquisições entre empresas nascentes devido ao amadurecimento do ecossistema empreendedor na América Latina

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Foto do author Lucas Agrela

O mercado de startups passa por um ano com menos capital de investidores do que em 2021, mas isso não preocupa Santiago Fossatti, sócio da empresa de investimento de capital de risco Kaszek. Com negócios como Nubank, Creditas e QuintoAndar na carteira, a companhia continua a apostar no mercado brasileiro e reforça que as startups inovadoras ainda estão nascendo.

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“Ainda há capital disponível para as empresas que fazem um bom trabalho, tenham bom modelo de negócio, boas margens e continuem conquistando clientes”, afirmou Fossatti, em entrevista ao Estadão durante o evento Vamos Latam, da empresa de inovação Latitud. Apesar da visão de longo prazo para investimentos, ele ressalta que as empresas precisam pagar as contas em algum momento – e isso só é possível com a criação de negócios que parem em pé.

O executivo classifica o ano de 2021 como atípico no cenário de investimentos de risco na América Latina, o que resultou na percepção de redução de capital neste ano, apesar de as startups empregarem cada vez mais pessoas.

Em fase de consolidação de mercado, Fossatti vê crescimento no número de fusões e aquisições de startups nos próximos anos, com o aumento de apetite de grandes negócios por inovação e equipes técnicas qualificadas.

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Santiago Fossatti, sócio da empresa de investimentos Kaszek Foto: Divulgação/Latitud

Como o cenário macroeconômico, com alta nos juros e na inflação, afeta o investimento em startups em 2022?

Entendemos que o mundo vai ter ciclos de avanço e recuo. Queremos investir nas empresas pensando em várias décadas. Mas ainda estamos no começo do ecossistema de tecnologia na América Latina. As grandes empresas de tecnologia dos próximos dez ou vinte anos ainda estão nascendo hoje. É uma oportunidade de ir atrás dos grandes problemas da região e resolvê-los com tecnologia, foco nos clientes, equipe forte e muita inovação. Continuamos com a visão que tínhamos há um ano ou dez anos atrás. No nosso dia a dia, nada muda. Os empreendedores que tocam companhias um pouco maiores precisam levar em conta o cenário e garantir que o modelo de negócios esteja sustentável. Os negócios precisam pagar as suas contas e, obviamente, no mundo de tecnologia e startups, não há receita no começo. Por isso, há uma etapa de investimentos. Mas a ideia é construir uma plataforma que se sustente.

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O perfil das empresas que vocês buscam hoje é mais conservador do que antes?

Nosso horizonte de tempo para retorno sobre investimentos sempre é de muito longo prazo. Já estamos nesse mundo faz mais de 20 anos. Buscamos investir em companhias que sejam muito resilientes, usem muita tecnologia, consigam crescer sem demandar muito capital. O perfil continua a ser igual: empresas inovadoras.

Taxa de juros afeta a liquidez de capital. As empresas precisam se esforçar mais do que antes para conquistar um investimento?

O ano passado foi um “outlier” (atípico) na América Latina. Tivemos US$ 1 bilhão em investimentos de venture capital em 2017, US$ 2 bilhões em 2018, US$ 4 bilhões em 2019 e 2020. Só em 2021, foram US$ 16 bilhões. Como viemos de uma curva muito acelerada de crescimento, ainda há muito capital disponível. O próximo ano será melhor. Não duvido que, daqui a alguns anos, vamos voltar a passar consistentemente o recorde de 2021. Ainda há capital disponível para as empresas que fazem um bom trabalho, tenham bom modelo de negócios, boas margens e continuem conquistando clientes.

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Muito se fala sobre a falta de profissionais de tecnologia. Na sua visão, houve avanço no número e na qualidade da formação desses trabalhadores nos últimos anos no País?

Sem dúvidas. A América Latina sempre teve um bom talento técnico e pessoas interessadas em tecnologia. As empresas de tecnologia têm crescido exponencialmente e o mercado tem comportado esse aumento. Há muitos desenvolvedores que passaram por companhias que criaram produtos inovadores, como Nubank, QuintoAndar e Creditas. São pessoas que já sabem como tornar um produto ou um negócio escalável. Se o mundo tivesse hoje duas ou três vezes o número de desenvolvedores que existem hoje, todos teriam trabalho. Há muita demanda por talentos técnicos e o mercado cresceu várias ordens de grandeza desde que começamos a investir em startups.

As fintechs brasileiras ainda têm fôlego para continuar a crescer?

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O setor de fintechs é uma oportunidade muito grande. O Brasil é referência mundial em meios de pagamento, dinheiro eletrônico, e o Banco Central impulsiona muito a inovação. Isso permitiu o surgimento de plataformas que tiveram grande crescimento, como a Warren. O que vivemos nas fintechs até hoje também viveremos em setores como saúde, iniciativas ligadas à proteção do meio ambiente e software. O Nubank hoje é o melhor neobanco do mundo, assim como o Mercado Livre é o melhor e-commerce do mundo, exceto pela Amazon e algumas da China. A Kavak deve ser a melhor plataforma de compra e venda de carros. A América Latina tem produzido casos de sucesso em diferentes áreas, não só nas fintechs.

A onda de demissões de startups neste ano foi influenciada pelo cenário econômico?

É importante dar um passo para trás e olhar as coisas temporalmente. As empresas têm empregado dezenas de milhares de pessoas nos últimos três anos e, em 2022, empregam mais funcionários do que no ano passado. Não concordo com a visão de cortes. Elas continuam a gerar emprego. Cada vez mais talentos têm vindo para a tecnologia e a criação de empregos em nosso portfólio tem sido consistente.

Está aquecido o mercado de compras e fusões de startups?

O sistema de tecnologia na América Latina ainda é jovem. Vemos cada vez mais empresas sendo compradas. O Nubank anunciou várias aquisições recentes, por exemplo, e há incumbentes comprando empresas. É uma tendência que tem crescido consistentemente nos últimos quatro anos, e acreditamos que esse movimento irá continuar. É um sinônimo de amadurecimento do mercado. As empresas que se destacam fazem IPO, sonho de muitos empreendedores. Mas para muitos que fazem um trabalho muito bom e não chegaram a esse ponto, juntar-se a um negócio maior faz total sentido.

Então, o ecossistema de startups brasileiro continua a fazer sentido para a Kaszek?

Continua. Estamos nele há 23 anos e pensamos em ficar aqui por muitas décadas.

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As eleições influenciaram nos negócios com startups?

Não. Já tivemos mudanças políticas antes, com momentos de maior ou menor estabilidade. Mas continuamos a criar produtos e investir. As eleições no País não mudam nada.

O sr. veste um colete da Patagonia. O impacto positivo para o meio ambiente se tornou mais importante na hora de selecionar investimentos em startups?

As companhias nas quais investimos têm um impacto muito positivo para a sociedade, como as empresas de e-commerce que levam produtos para todo o País com o mesmo preço oferecido para a cidade de São Paulo. Quem conhece o Brasil de 30 anos atrás sabe como isso é espetacular. As fintechs conseguiram trazer muita competitividade ao mercado financeiro, como o Nubank que não cobra anuidade, nem contas. Agora vemos um movimento de empreendedores da América Latina criando negócios de cleantechs, que têm impacto ambiental positivo. Temos três investimentos nesse setor, como a Mombak, que gera créditos de carbono. Temos a Lemon, que é um marketplace que leva energia distribuída renovável a varejos no Brasil, e a Musa, especializada no tratamento de resíduos.

Quais são os principais entraves das startups brasileiras que almejam se tornar globais?

Os principais desafios de todas as empresas são criar um produto que as pessoas queiram usar e gerar engajamento, recorrência, retenção e lucro. É o famoso “product market fit”, encontrar o produto correto, o canal de vendas correto e o cliente correto. Isso é muito desafiador.

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