Governo tomou medidas sábias em relação a pequenos restaurantes no início da pandemia, diz iFood

Gigante acredita em cenário positivo no médio prazo, apesar das dificuldades do setor

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Foto do author Bruno Romani

Em 2020, o iFood viu de perto os vários reflexos da pandemia. Por um lado, a obrigatoriedade de isolamento social resultou em mudanças no comportamento digital das pessoas, que passaram a fazer mais pedidos na plataforma – no mês passado, a empresa atingiu a marca recorde de 60 milhões de pedidos por mês.

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Por outro lado, o iFood mantém relações estreitas com alguns dos principais grupos afetados negativamente pela pandemia. Além de receber uma parcela de trabalhadores que perderam renda, a empresa atua diretamente com o setor de bares e restaurantes, altamente afetado pela crise. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), 350 mil negócios foram fechados só em São Paulo durante a pandemia.

Mesmo diante dessa marca, Diego Barreto, vice-presidente de finanças e de estratégia do iFood, acredita que o governo federal agiu com “velocidade” e “sabedoria” em relação ao setor nos primeiros meses da pandemia. Isso, porém, não significa que ele vê um bom momento para o setor no curto prazo. “Há uma arrebentação vindo por aí”, diz ele em entrevista ao Estadão

A esperança estaria no médio e no longo prazo. Ele vê um cenário positivo para aqueles que sobreviverem, pois muitos restaurantes teriam reinventado o modelo de negócios. A prova do novo paradigma estaria nos números: 30 mil novos restaurantes entraram no app nos três primeiros meses do ano, muitos deles com operação adaptada ao delivery pela primeira vez. 

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Além da situação dos restaurantes, Barreto fez um balanço da empresa no ano, revelando alguns dados com exclusividade, e falou sobre a intensificação da competição em logística no Brasil, setor que vê cada vez mais investimentos de startups e gigantes nacionais e internacionais. Confira os melhores momentos. 

Diego Barreto, VP de finanças do iFood Foto: iFood

Como foi 2020 para o iFood?

Nosso ano vai de abril a março do ano seguinte. Fechamos 2019/2020 com 30 milhões de pedidos no mês. Chegamos em novembro de 2020 com 48 milhões e agora fechamos março de 2021 com 60 milhões. Fora da China, é a primeira ou segunda maior operação do mundo de delivery de comida. Destes, 50% são pedidos feitos de restaurantes pequenos e médios. Vimos um crescimento muito forte na quantidade de restaurantes pequenos que, por causa de tudo que a gente está vivendo atualmente, tiveram de adaptar sua operação para o digital. Ao mesmo tempo, houve uma adição muito forte de novos usuários. Ao longo de março, 16 milhões de pessoas fizeram compras pela primeira vez no iFood. Encerramos o ano com 270 mil restaurantes, 110 mil a mais. Nos primeiros três meses de 2021, foram 30 mil novos. Desses, mais de 90% foram de pequenos e médios. 

O ano foi muito difícil para os pequenos e médios. O que o iFood fez para preservar o setor? 

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Destinamos R$ 150 milhões de reais para restaurantes por meio de um fundo que montamos para doar esse dinheiro aos restaurantes. Começamos a fazer empréstimos, sob uma ótica bancária mesmo, para poder ajudar com linhas de crédito. Emprestamos já cerca de R$ 200 milhões, e vamos chegar esse ano ainda a R$ 500 milhões, o que vai permitir muita gente rolar dívidas, em especial aquelas linhas do governo. Também antecipamos R$ 12 bilhões sem qualquer cobrança de crédito. E vamos destinar mais R$ 4 bilhões a recebíveis sem custo nenhum. 

E para os entregadores?

Do lado do entregador, estamos muito felizes de ter conseguido montar um fundo grande para manter todos aqueles que fazem parte do grupo de risco, que tiveram sintomas ou que potencialmente foram afetados pela covid. Destinamos R$ 113 milhões para proteção deles, o que inclui o afastamento remunerado sem exposição. O ganho/hora do trabalhador é 80% superior ao salário minimo/hora. Então, as pessoas que vieram para cá encontraram boa renda e flexibilidade. 

O iFood está muito perto de um grupo muito afetado pela pandemia: pequenos e médios restaurantes. Vocês estão satisfeitos com a forma como o governo cuidou desse grupo na pandemia?

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Temos uma visão de que o governo federal tomou medidas muito sábias e com certa velocidade no começo da pandemia, em torno de abril maio, quando ele trouxe a flexibilização da carga horária, a postergação dos tributos federais e as linhas de financiamento que foram distribuídas pelos grandes bancos, em especial a Caixa e o Banco do Brasil. Isso permitiu que os restaurantes conseguissem minimamente se equilibrar. Em fevereiro de 2021, o ministro Paulo Guedes começou a estudar novas medidas para o setor, e elas estão chegando. Temos notícias de que uma nova rodada de ajuda que impacta diretamente os restaurantes está chegando. Poderia ser mais? Todas as vezes que você está em uma situação de desespero, você sempre pode pedir mais, mas é inegável que foram feitas ações. O que eu destacaria é que o governo federal e os governos estaduais, em grande medida, mantiveram um diálogo extremamente constante conosco. Dada essa exposição que a gente tem, fomos uma fonte muito importante para que eles pudessem monitorar determinados resultados e tomar essas medidas. Então, houve um diálogo muito grande. Junto da nossa indústria, tem outras também que estão sofrendo e precisam também bater à porta do governo. No final das contas, a gente viu um esforço muito grande, mas evidentemente poderia ser mais.

O futuro para os pequenos e médios restaurantes não parece promissor. Muitos estão fechando. Como vocês enxergam a questão?

Temos uma visão de um futuro ruim no curto prazo e bom no médio e longo prazo. No curto, existe um problema sério financeiro de liquidez. A grande maioria dos restaurantes pequenos e médios podem chegar muito fragilizados nesse momento. No médio e longo prazo, o segmento de restaurantes sai extremamente reinventado. Eles redesenharam completamente o modelo de negócios, o que vai permitir que cheguem muito mais preparados sob a ótica do consumidor. Vimos milhares de restaurantes que passaram vender não só o seu produto preparado, mas também o seus insumos. Um segundo exemplo é que vimos restaurantes descobrindo que eles tinham um ativo adormecido dentro de casa. A padaria historicamente faz um monte de coisas e dentro do iFood se posicionava como padaria. Muitas padarias que fazem pizza abriram uma segunda marca. As grandes redes de rodízio de carne nunca estiveram no iFood e agora estão lá com a la carte. O negócio vai ser reinventado numa série de questões, mas antes tem essa arrebentação. 

Restaurantes não equilibram as contas só com delivery. O que pode ser feito?

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Não é uma questão de modelo. É de consumidor. O motivo: na pandemia, a pessoa dentro de casa cria um grande competidor para o restaurante, que é a cozinha. Quando acabar o isolamento, as coisas voltam a se complementar. Por enquanto, o jeito é ter um nível de serviço e qualidade que convençam o consumidor a mudar o hábito radicalmente, algo que não ocorre da noite para o dia. O consumidor está mudando, mas essa mudança para poder ocupar completamente o fluxo que existia no salão tem que ser muito maior. 

Quanto mais gente você atende, mais problemas você encontra. Como vocês estão lidando com o fluxo maior de clientes?

Você tem razão. Nunca tivemos um nível de serviço tão alto com o consumidor, medido pelo NPS de forma independente, quanto nos últimos 6 meses. Só não superamos o Nubank. 90% dos motivos do contato que eu recebo historicamente não têm a ver com o iFood. Tem a ver com o restaurante ou com o entregador. Hoje, dentro do iFood, quando você faz um pedido, abre automaticamente a possibilidade de ter um chat para falar com o restaurante, e com o entregador (além de entregador falando com o restaurante). 90% dos 90% desses problemas passaram a ser resolvidos nessa comunicação tripartite. Essa solução resolveu um contingente muito maior de demandas e situações. 

Quando não é possível a solução do problema por meio dessa ferramenta, vocês assumem a responsabilidade ou adotam o discurso “somos uma plataforma que apenas conecta as partes”? 

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O iFood toma a decisão de fazer o reembolso. Isso é regra. Depois a gente tem essa discussão com o restaurante. Do entregador, a gente não cobra. Gastamos quase R$ 100 milhões por ano com reembolso de cliente. Nunca deixamos de fazer um reembolso. 

O segmento de logística se intensificou no Brasil, com investimentos de gigantes nacionais, como Magalu, e internacionais, como Amazon. Como vocês veem essa competição?

Esperamos que no próximo ano a competição será 10 vezes maior. O segmento de delivery de comida tem uma beleza, que o resto do varejo não tem: frequência. A pessoa come 90 vezes por mês e vai à farmácia três vezes. Isso faz com que você tenha uma relação mais próxima. Então, é natural que as empresas de e-commerce façam esse movimento. Além dos players do varejo nacional, esperamos a entrada de três a cinco players internacionais entre um e dois anos. 

O iFood pode fazer movimento no segmento de logística que não seja de comida?

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Somos chatos com foco. Poderíamos ter ido para delivery de supermercado há cinco anos. A gente entende que o vencedor de um mercado como o nosso é aquele que tem o melhor serviço. A gente “demorou” pra entrar em supermercado e agora estamos fazendo investimento forte. Em menos de 12 meses, chegamos a 400 cidades e temos 5 mil supermercados listados. Uma outra vertical só vou decidir depois de concluir que sei fazer supermercado muito bem. Não iremos fazer movimentos que não sejam próximos do alimento.

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