Startups apostam em ‘robôs’ para ajudar empresa a contratar humano

Enxurrada de currículos leva companhias a usar inteligência artificial para análise de candidatos e entrevistas de emprego

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Quando estava prestes a se formar na faculdade, o americano Mark Newman se deparou com um problema. Apesar de ter qualificação e disponibilidade para deixar Salt Lake City, no Utah (EUA), e ir trabalhar em outra cidade, não conseguia emplacar nenhuma entrevista de emprego à distância. Foi aí que teve uma ideia: criar uma ferramenta de entrevistas por vídeo. Hoje, a HireVue, startup criada por ele para resolver essa dificuldade, tem 600 clientes (como Unilever e Oracle) em 140 países, com base forte em inteligência artificial (IA)

A startup HireVue tem um sistema de entrevista por vídeo Foto: HireVue

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É uma tendência: segundo o site CareerBuilder, ao menos 55% dos gerentes de recursos humanos nos EUA consideram que a IA será sua ferramenta de trabalho nos próximos cinco anos. Com o avanço dos sites de emprego, tornou-se praticamente impossível analisar o volume recebido de currículos. No LinkedIn, por exemplo, mais de 100 milhões de candidaturas são feitas todo mês para as cerca de 20 mil empresas americanas cadastradas. “Mudamos o nível do problema”, diz Luiz Kugler, professor de análise de dados da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “Hoje, há vagas ao alcance de todo o planeta”.

No caso da HireVue, é importante deixar claro que o candidato não interage com um robô. A experiência, aliás, talvez fosse menos esquisita se fosse assim. Na verdade, o usuário grava, sozinho, vídeos respondendo a perguntas estabelecidas pela contratante relacionadas à vaga. Na média, o questionário tem cinco ou seis perguntas – e o usuário deve gastar até três minutos para responder cada uma. 

A IA da HireVue analisa as respostas para determinar comportamento, personalidade e competências técnicas. O “robô” observa, por exemplo, entonação, nível de estresse perceptível na voz e a escolha de palavras – falar “nós” no lugar de “eu” demonstra habilidade de equipe. A empresa, porém, diz não usar reconhecimento facial para medir a capacidade de “atuação” do candidato. 

“Traduzimos todas as informações para texto e identificamos as qualidades que indicam maior chance de sucesso na vaga”, diz Kevin Parker, presidente executivo da HireVue, que levantou US$ 93 milhões de fundos como Sequoia (o investidor de Facebook e Nubank). A partir do resultado, a empresa parte para analisar currículos – tarefa que também pode ser automatizada. Segundo Parker, o principal trunfo da startup é conseguir fazer uma triagem com base em qualidades não evidentes quando um humano vê um currículo.

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Netflix de currículos

“As empresas grandes recebem tantos candidatos que os recrutadores passam em média 7,4 segundos olhando os currículos, e 95% deles são completamente ignorados”, diz Somen Mondal, fundador da canadense Ideal, outra startup que criou um algoritmo para melhorar o recrutamento. Para o contratante, o sistema funciona como um “Netflix dos currículos”. 

Primeiro, a plataforma se dedica aos dados dos funcionários bem-sucedidos dentro da empresa. Depois, cruza as informações com uma análise da experiência do candidato e um questionário respondido por ele, ministrado por um robô de conversa (chatbot). Assim, a ferramenta consegue analisar pretendentes e criar recomendações – tal como o serviço de streaming sugere uma série ou filme com base no que a pessoa já viu. Segundo Mondal, empresas que usam sua ferramenta reduzem o tempo de preenchimento da vaga em 15% e aumentam em 10% a qualidade das contratações. 

Quem também promete mais agilidade na hora de contratar é a chilena Aira. Fundada em 2016, atua em seis países e deve chegar ao Brasil até o fim do ano. Com clientes como Heineken e Walmart, a empresa diz conseguir trazer um novo funcionário em até três dias. 

Outra vantagem que os sistemas de IA dizem permitir aos gestores de RH é a capacidade de dar retorno aos candidatos desprezados – afinal, como quem comanda o processo é um algoritmo, ele também envia respostas automatizadas. 

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Com ou sem influência?

Se bem utilizados, algoritmos podem ser moldados para não ter preconceito – abstraindo aspectos que dão viés a recrutadores humanos, como idade, sexo e até o nome. Os sistemas podem ainda ser treinados para evitar juízos de valor sobre instituições de ensino e locais de trabalho anteriores, observando apenas a relevância das experiências prévias. “A inteligência artificial permite uma visão 360º do candidato, pois não usa só um parâmetro”, diz Kugler. 

Porém, apostar que o candidato perfeito será aquele bem parecido a quem está dentro da empresa pode ser um tiro no pé. Foi o que aconteceu com a startup mineira Solides – ela própria, dona de IA para contratação. “Chegamos num ponto em que a equipe comercial tinha perfil tão similar que a ‘parceiragem’ afetou o rendimento”, diz Alessandro Garcia, um dos fundadores. 

Alessandro Garcia, presidente da startup Solides Foto: Henrique Santos/Solides

A solução foi ir contra o que a IA fazia e mandá-la buscar um perfil de “um tubarão no aquário”, como diz Garcia, para mudar a dinâmica. Além de recrutamento, a Solides também faz gestão de pessoas com IA, visando reduzir a rotatividade. Um de seus clientes, uma financeira, economizou R$ 240 mil em um ano após aplicar inteligência de dados no RH. 

Mas será este o fim das entrevistas de emprego em carne e osso ? Para os criadores de algoritmos, isto está longe de acontecer. Como nos filmes em serviços de streaming, o dono do controle remoto é que faz a escolha. “Não usamos Netflix para ver filmes irrelevantes, queremos assistir ao que gostamos”, diz Mondal, da Ideal. “Nosso caso é semelhante: queremos que os gestores possam focar no que importa e não fiquem afundados em pilhas de currículos.” 

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