Inteligência artificial traz riscos para o debate público

Sistemas automatizados podem enterrar opiniões técnicas para dar lugar ao senso comum

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colunista convidado
Foto do author Demi  Getschko

No complicado entrelaçamento em que vivemos hoje há agentes dos mais diversos: da comunicação ampliada que a expansão do acesso à internet permitiu à tecnologia com a evolução vertiginosa da inteligência artificial (IA). Além disso, há impactos sociais importantes que esta mescla de tecnologias e ideias traz, tanto a direitos ameaçados como o da privacidade, quanto ao modo de convívio. Torna-se importante olhar este cenário para que se possam identificar reais ou potenciais riscos.

Num cenário muito real, a quantidade imensa de dados e opiniões pessoais que existe na internet alimentará gigantescas bases de dados. Desde a famosa e ácida tirada de Umberto Eco – que em nada embaça a importância de expandir a internet – estabeleceu-se como fato consumado que a inclusão de todos às plataformas de interação traria uma inevitável cacofonia e, pior, traria novas formas de controle sobre o pensamento. A questão aqui é que, com a existente sinergia com outras ferramentas tecnológicas, esse efeito colateral pode ser potencializado, gerando danos reais.

Temos um risco inerente ao lutarmos pela democratização da informação: a promoção de uma falsa “democracia de especialidades” Foto: Valentyn Ogirenko/Reuters

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As tais imensas bases de dados apenas são tratáveis via computação específica, que pode ser ligada à IA. E, se como já ocorre hoje com os interlocutores virtuais, eles passarem a ser também nossos parceiros nas discussões sobre qualquer tema, uma pergunta ingênua de alguém poderá receber uma resposta automática que reflita o que foi levantado na média de opiniões. Ora, muitos avanços importantes sempre trouxeram contestações à visão média da época. O peso de uma opinião técnica, sólida e fundamentada cientificamente não pode se perder numa sopa de outras, em maior número mas pessoais, ou mimetizando “influenciadores”.

Não se trata de negar a valiosa sabedoria popular, mas evitar que a “verdade” seja algo majoritariamente definido: certamente Galileu não contava com a maioria das opiniões populares ao seu lado quando anunciou que a Terra se movia ao redor do Sol. Teremos, portanto, um risco inerente se, ao lutarmos pela democratização da informação para todos, acabarmos por promover uma falsa “democracia de especialidades”.

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Como contraponto, sempre haverá situações em que a sabedoria popular segue rainha. Por exemplo, quanto ao que seja “belo”, há um epigrama famoso de John Keats, que é o fecho de ouro de seu poema Ode a uma Urna Grega, 1819. Decrevendo a beleza estética da tal urna, que sobreviverá aos homens e às épocas, encerra com: “Verdade é beleza, beleza é verdade. Isso é tudo o que sabemos no mundo, e tudo o que precisamos saber”.

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