No final de outubro, a Ânima Educação anunciou suas novas agências de publicidade, após concorrência com cerca de 40. Após muitos meses de trabalho, dez empresas foram escolhidas. Uma leitura rápida dessa informação pode causar surpresa e parecer outro processo exótico de seleção de parceiros: mais um exemplo das práticas reiteradamente condenadas dentro do ecossistema publicitário.
No contexto, porém, a iniciativa da Ânima fez sentido e foi muito positiva para o mercado. O grupo buscou agências que pudessem atender regionalmente as dezenas de marcas que administra por todo o Brasil (dentre elas, Anhembi Morumbi, IBMR, Universidade São Judas, UniBH, Unifacs, UniRitter e UniSul). A intenção da empresa era evitar, em suas comunicações, as derrapadas culturais que costumam acontecer quando um profissional de São Paulo faz campanhas dirigidas a um target baiano ou catarinense, por exemplo. Agências cientes das idiossincrasias regionais tendem a produzir peças mais legítimas, com o sotaque local, um diferencial para atrair consumidores.
Daniel Bulgueroni, vice-presidente de marketing da Ânima, conta que o grupo percebeu a necessidade de mudar sua abordagem de marketing da pior maneira. Cometeram erros em certas ativações que o olhar enviesado do publicitário sudestino não percebeu. “Em determinado momento, a gente pensou em fazer um post para homenagear a santa de Mossoró, mas fizemos para a santa de Pau dos Ferros, sem perceber que estava errado”, lembra o executivo, citando cidades do Rio Grande do Norte, onde o grupo tem faculdades do sistema Universidade Potiguar (UnP). Outros deslizes poderiam ser evitados, caso a agência que atendia ao grupo nacionalmente entendesse mais dos temperos locais. Hoje, a conta da UnP está com a Art&C, que tem 25 anos de atuação no Nordeste e sede em Natal (RN). A expectativa é que esta mudança — assim como as outras dez agências pelo Brasil — produzam comunicações com maior assertividade e menos erros.
No início deste ano, o marketing institucional se uniu às equipes regionais e aos diretores das diferentes marcas para elaborar a concorrência. Para cada desafio de marca ou conjunto de universidades com características semelhantes, foram abordadas de três a quatro agências. O foco de seleção era qualidade de portfólio em vez de volume; e estratégia de comunicação em vez de campanha (que sequer foi requisitada). Por ser uma dezena de parceiros, a escolha levou mais tempo que o normal. Mas Bulgueroni tinha como meta campanhas que começarão ainda este mês, tendo em vista as notas que o Enem vai liberar no começo de 2025. “Estamos entrando nesse momento crucial, com um modelo completamente novo, nosso primeiro passo de fato depois do processo de RFP, com todas as agências abordo. Em seguida vamos para uma fase de ajustes, com campanhas no ar e os aprendizados que certamente vamos ter”, prevê o executivo.
Agências são pessoas
Ainda que o caminho traçado pela Ânima mereça, num segundo momento, ajustes de rota, é um olhar mais atento às necessidades das equipes regionais, mais conectado com fornecedores que entendem das praças nas quais atuam e, em última instância, com apelo muito maior junto ao consumidor final. É, portanto, um modelo mais sensível ao fator humano, responsável pela cadeia de sucesso de qualquer negócio, principalmente no setor B2C.
“No fim do dia, a agência não é o nome na porta, nem uma logomarca: agências são pessoas”, reforça Alex BX, chief marketing officer do grupo IMC, que agrega diversas redes de restaurantes como Pizza Hut e Frango Assado. A empresa acabou de passar por dois processos de concorrência: uma para novas soluções de tecnologia em marketing, e outra para o atendimento criativo da marca KFC, da qual saiu vitoriosa a DM9.
“Foi um processo um pouco mais longo, porque primeiro fizemos, com a equipe, uma long list de agências com as quais a gente só queria conversar, conhecer”, relata BX. “Era para olhar no olho das pessoas, ver o ambiente de trabalho, a dinâmica dos grupos e os valores daquele potencial parceiro. Só conversar, tomar café... Não pedimos apresentação, ainda que algumas tenham optado por usar o Power Point. Com muitas outras foi só um papo mesmo.”
Em seguida, o IMC fez um shortlist com cinco empresas e optou por um processo de seleção sem briefing, nem campanha. “Numa concorrência tradicional, é impossível acertar uma campanha incrível de primeira: geralmente você escolhe a melhor ideia e ela vai para a gaveta. É natural, porque a agência não te conhece, não sabe o suficiente, e mesmo assim você faz as pessoas gastarem horas de trabalho para produzir um material que não vai ser útil. Então decidimos fazer diferente.” BX e equipe fizeram uma lista de capacidades desejáveis, projetaram objetivos sólidos para a comunicação da marca e perguntaram aos candidatos o que eles poderiam entregar, baseados em campanhas que já tinham realizado para outros clientes.
“Foram muito mais conversas no sentido de saber o que eram capazes de fazer para ajudar no meu negócio”, diz o CMO, complementando ainda que essas capacidades representavam 80% na matriz de avaliação. Apenas depois de definido o vencedor, que começaram a negociar valores — o custo respondia a somente a 20% da análise das propostas. “Queríamos equalizar valores justos, que pagassem pelos talentos que a gente precisava, e não só decidir pelo mais barato. Para isso, tivemos uma ótima parceria com a área de compras e com governança, que organizaram o processo.”
Junto a essas áreas, o executivo desenhou o novo modelo tomando como base sua experiência de 25 anos no mercado. Admite que aprendeu muito com os próprios erros: “Depois de tanto tempo fazendo concorrência de criatividade a gente percebe que é uma mega perda de tempo para os dois lados. É extremamente custoso e você muitas vezes termina sem as melhores opções na mesa, por uma razão óbvia: diversas agências boas não participam.”
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