Com as primeiras informações sobre planos de volta às aulas, surge uma nova polêmica que educadores nunca imaginaram se deparar. É unânime que o retorno ao ensino presencial terá de ser aos poucos, então quem tem direito a voltar primeiro à escola? Crianças pequenas ou adolescentes?
Os argumentos a favor de dar prioridade à educação infantil (0 a 5 anos) são mais econômicos e sociais do que educacionais. Não que não sejam nobres. Na rede particular, escolas já começaram a perder alunos dessa idade pela crise financeira. E porque a educação a distância não funciona nem é recomendada para eles. O risco de falência é grande se não voltarem a funcionar.
Há ainda a preocupação com as mães trabalhadoras. No Estado, a secretaria de desenvolvimento econômico tem pressionado pela abertura de creches e pré-escolas porque essas mulheres precisam voltar ao serviço. Afinal, a abertura já prevê volta do comércio e de escritórios em alguns locais.
Os Estados, no entanto, não têm escolas para crianças pequenas, elas são de responsabilidade dos municípios. O governo estadual, responsável pelo plano de abertura, então libera e a decisão fica com o prefeito. Só que os secretários municipais de Educação já disseram que temem a volta dos alunos do ensino infantil, idade em que é muito mais difícil usar máscara e quase impossível manter distanciamento. As cidades, com muita razão, temem que a contaminação aumente com bebês juntos no berçário e crianças brincando nos parquinhos.
Nos Estados Unidos, o problema é o mesmo. Segundo o jornal The New York Times, pesquisadores falam numa “geração inteira de mulheres prejudicadas” por causa da pandemia, já que são elas que acabam faltando ou deixando de trabalhar quando a escola não volta e o filho não pode ficar sozinho em casa.
Por outro lado, grandes empresas como PepsiCo, Uber e Pinterest flexibilizaram o trabalho de quem tem filhos, permitindo a continuidade do home office e escalas melhores.
Também há bons argumentos para o outro lado, os que defendem primeiro a volta dos mais velhos e especificamente daqueles que estão no 3.º ano do ensino médio. Antes, é bom deixar claro que, se estão na camada mais pobre da população, podemos quase chamá-los de heróis. Muitos já foram embora faz tempo da escola. Então, quanto mais cedo voltarem, menos chance temos de perdê-los também, ainda mais diante de uma crise econômica em que o jovem é forçado a trabalhar para ajudar a família.
Há ainda o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e outros vestibulares. Quanto antes estiverem diante de seus professores e não dependendo de um celular para estudar, mais possibilidade têm de entrar numa faculdade. Outra razão é que adolescentes – teoricamente – conseguem compreender melhor e cumprir as regras sanitárias. E ainda ajudam a dar o exemplo aos mais novos, que vão voltar depois.
O “quando” retornar às aulas é uma decisão que compete só à área da saúde. Mas o “quem” sofre interferências sociais, econômicas e educacionais. Lá fora, há países que optaram pelos mais velhos e outros, pelas crianças pequenas. Não dá para saber ainda os resultados.
O ideal seria que os planos de reabertura econômica fossem pensados considerando a educação. Especialistas têm dito que é precipitado permitir que as pessoas voltem a circular em São Paulo com casos e mortes subindo. As escolas foram deixadas de fora do plano de cores do governo e a previsão é que voltem em agosto, meses depois.
Com trabalho dos pais e ensino sendo pensados separadamente, difícil ter critério para saber que alunos retornam antes. Cada gestor terá de fazer sua opção e torcer para não precisar mandar todo mundo para casa de novo.
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