Em mais um passo de sua insensata guerra comercial global, o presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou a imposição de uma taxa de 25% sobre todos os veículos importados que forem vendidos no país. A tarifa entrará em vigor no início de abril e valerá também para peças, baterias e motores produzidos no exterior, bem como para automóveis fabricados por marcas norte-americanas em outros países.
É difícil encontrar uma motivação técnica para uma medida tão despropositada. A intenção, supostamente, é atrair mais investimentos para os EUA, mas praticamente todas as grandes montadoras mundiais já têm fábricas no país. Superados apenas pela China, que atingiu a marca de 31,3 milhões de veículos fabricados no ano passado, os EUA são hoje o segundo maior produtor mundial de automóveis, com 11,9 milhões de unidades, bem à frente do terceiro colocado, o Japão, com 8,2 milhões.
Sob o ponto de vista fiscal, o Imposto de Importação deve gerar uma arrecadação extra de US$ 100 bilhões aos EUA, uma minúscula fração do Orçamento do país. A medida, no entanto, custará caro aos consumidores. Um veículo novo nos EUA não sai por menos de US$ 49 mil. Com as novas tarifas, bancos e consultorias estimam que o preço de um veículo fabricado no México ou no Canadá deve subir entre US$ 6 mil e US$ 10 mil, tornando sua aquisição menos acessível aos trabalhadores.
As ações das principais montadoras, como General Motors, Ford e Stellantis, desabaram nas bolsas de valores. Pudera. Para as montadoras, elevar o índice de nacionalização dos carros norte-americanos exigirá um alto nível de investimentos, um longo tempo de maturação e o repasse de custos ao consumidor, o que deve derrubar sua lucratividade.
O conteúdo nacional dos veículos norte-americanos é de 40%, em média, mas mesmo os modelos com índices mais elevados não ultrapassam a marca de 75%. Até a Tesla, empresa do bilionário Elon Musk, eminência parda do governo, deve sofrer os efeitos da decisão, pois embora produza veículos em plantas na Califórnia e no Texas, a companhia importa vários de seus componentes.
Pode parecer contraintuitivo, mas recorrer à imposição de tarifas de importação para proteger e incentivar a indústria local não funciona no médio e longo prazos. Facilitar importações, ao contrário, reduz custos, favorece investimentos eficientes em áreas nas quais os países apresentam vantagens comparativas e, em última instância, contribui para ampliar as exportações de bens e serviços.
Com o aumento dos custos, não será apenas o consumidor norte-americano que será punido. Trump vai impor uma perda de competitividade brutal aos produtos norte-americanos no exterior. Há ainda um enorme risco de retaliações, que virão, a despeito das ameaças de Trump. Países atingidos pelas tarifas certamente anunciarão taxas de importação recíprocas para dificultar a entrada de produtos norte-americanos.
É paradoxal que justamente os EUA, um dos países que mais se beneficiaram da integração das cadeias produtivas globais nas últimas décadas, escolham deliberadamente não usufruir delas. A experiência internacional é rica em exemplos que relacionam a abertura comercial a inovação, crescimento econômico, melhoria da distribuição de renda e inflação baixa.
Se quiser saber quais são os efeitos desse protecionismo, Trump pode olhar para o Brasil, considerado um dos países mais fechados do mundo comparativamente ao tamanho de sua economia. A proibição para a importação de veículos no País, que vigorou entre 1976 e 1990, não fez do Brasil uma potência mundial, e sim uma plataforma de montagem de veículos caros, de qualidade inferior e baixa tecnologia. Não por acaso, eles ganharam do então presidente Fernando Collor de Mello a alcunha de “carroças”.
Os custos da política de Trump serão imediatos, mas os louros, se é que existirão, não serão colhidos durante seu mandato. Se o objetivo é realmente reindustrializar os EUA, o republicano escolheu o caminho mais agressivo, oneroso e ineficaz.