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A espiral explosiva da dívida

IFI estima que estabilização da dívida exige superávits primários de 2,4% ao ano; sem compromisso fiscal firme, dívida do governo chegará a 116,3% do PIB em 2034

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Por Notas & Informações
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A Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado projetou, em sua última edição do Relatório de Acompanhamento Fiscal, que a tendência de aumento da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) é bem mais acentuada que aquela estimada pelo Tesouro Nacional, e que superávits primários de 2,4% ao ano seriam necessários para que a relação dívida/PIB se estabilize no patamar de 2023 (73,8%).

Em junho de 2024, a mesma IFI havia calculado que, para estabilizar a dívida, seriam necessários superávits primários da ordem de 1,4% ao ano, ou seja, em um curto espaço de tempo, as condições do endividamento público agravaram-se de forma expressiva.

De acordo com o órgão vinculado ao Senado, a DBGG deve encerrar 2024 em 78,3% e seguirá subindo nos dois últimos anos do atual mandato de Lula da Silva: para 81,4% em 2025 e para 86,3% em 2026.

Embora o próprio Tesouro, em seu Relatório Fiscal, aponte para a piora dos níveis de endividamento, a projeção de patamar da DBGG em 77,7% do PIB para 2024 é inferior à da IFI. Além disso, o cenário traçado pelo Tesouro pode ser mais róseo que a realidade, uma vez que tomou por base, por exemplo, uma Selic média de 10,7% em 2025, que, além de inferior à taxa atual de 12,25%, ignora a sinalização do próprio Comitê de Política Monetária (Copom) de que promoverá mais duas elevações, de 1 ponto porcentual cada uma, nas reuniões agendadas para janeiro e março de 2025.

Sem compromisso fiscal firme – e o desidratado pacote aprovado pelo Congresso no apagar das luzes de 2024 mostra isso –, a DBGG alcançará alarmantes 116,3% do PIB no cenário base da IFI para 2034, um incremento de quase 16 pontos porcentuais em relação ao relatório de junho da própria instituição.

As projeções, das mais amenas às mais preocupantes, convergem em um ponto: a trajetória da dívida do governo é explosiva e precisa ser encarada com firmeza, o que exige que o governo Lula da Silva realmente se empenhe em apresentar propostas que revertam o descontrole nas contas públicas.

No cenário atual, já incorporado o tímido pacote fiscal, a IFI projeta déficit primário de 0,4% do PIB em 2024 e de 0,7% do PIB em 2025. A partir de 2026, as perspectivas tornam-se sombrias. De 2026 em diante, os déficits tendem a se agravar consideravelmente, chegando a 1,6% do PIB em 2032.

Não à toa, o debate sobre dominância fiscal, quadro em que a política monetária perde eficácia no combate à inflação, ganhou corpo nas últimas semanas do ano. Embora, de um modo geral, economistas avaliem que a situação ainda seja não tão grave, há sinais de alerta. Apesar de o Copom ter indicado que será agressivo contra a inflação, as expectativas cambiais e inflacionárias seguem piorando, o que só reforça a necessidade de um ajuste fiscal contundente.

Não há sinais, contudo, de que o Executivo vá se empenhar neste sentido. O presidente Lula, que afirma que jamais houve alguém com mais responsabilidade fiscal que ele, é o primeiro a sabotar os esforços de seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em intermináveis provocações ao mercado financeiro, o vilão ideal do lulopetismo.

Também é preocupante que o próprio Haddad, ao comentar a aprovação do pacote, tenha afirmado que as medidas encaminhadas ao Congresso não foram desidratadas e que havia a expectativa que houvesse o que chamou de “hidratação” (medidas de ajuste mais contundentes) na apreciação das medidas pela Câmara e pelo Senado.

Ora, não é segredo para ninguém, e o Congresso não tem desapontado em dar demonstrações disso, que os parlamentares não estão preocupados com a sustentabilidade fiscal do País, e sim com a manutenção de emendas de caráter eleitoreiro.

Tampouco adianta, especialmente após toda a frustração gerada com a apresentação do pacote recente, afirmar que novas medidas de ajuste serão apresentadas ao longo de 2025. Ou Lula, seus ministros e o PT se comprometem com um ajuste de fato, e deixam de sabotar o visivelmente exausto Haddad, ou a dívida, num horizonte não tão longínquo, superará com folga os 100% do PIB.