Imagem ex-librisOpinião do Estadão

A estranha tolerância de Lula

Sabe-se que o lulopetismo faz o diabo para se manter no poder, mas poderia ao menos demonstrar algum incômodo com um caso tão cristalino de imoralidade como o do ministro Juscelino

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
3 min de leitura

Dia sim e outro também, pululam evidências de que o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), usa desavergonhadamente dinheiro público para bancar seus luxos privados. Até quando o presidente Lula da Silva manterá uma figura como essa no primeiro escalão do governo em nome da coesão de uma base de apoio no Congresso que, a rigor, ele nem sequer tem?

De acordo com uma nova reportagem do Estadão, que desde o dia 30 de janeiro tem revelado ao País o veio patrimonialista de Juscelino Filho, o ministro empregou o piloto de sua aeronave particular e o gerente de seu haras, localizado no município de Vitorino Freire (MA), como funcionários de seu gabinete na Câmara dos Deputados. Ambos continuam recebendo salários de R$ 10,2 mil e R$ 7,8 mil, respectivamente, pagos pelos contribuintes, mesmo após o ministro ter se licenciado do cargo para ingressar no governo federal. O suplente de Juscelino Filho, deputado Benjamim de Oliveira (União Brasil-MA), não só manteve os dois funcionários do ministro em seu gabinete – embora, segundo consta, não possua aeronave nem cavalos –, como ainda empregou um tio do ministro das Comunicações.

Evidentemente, Juscelino Filho justificou as nomeações afirmando que todas as contratações para seu gabinete estariam “em conformidade com as regras da Câmara”. É improvável, mas, se estão, seria o caso de rever essas regras, pois são totalmente antirrepublicanas. Em nota, o ministro ainda exaltou o “zelo” e o “profissionalismo” com que seus funcionários desempenham as funções. Não há razões para duvidar disso. O piloto do ministro pode ser um ás da aviação. Os cavalos de seu haras podem ser os mais bem tratados do mundo. A questão de fundo é: o que o pobre do contribuinte, que custeia o seu gabinete para o exercício do mandato parlamentar, tem a ver com isso?

Por mais escabroso que seja – e a estupefação só aumenta diante da desfaçatez do ministro em minimizá-lo –, esse é apenas mais um caso a se somar à pilha de suspeitas sobre Juscelino Filho trazidas a público por este jornal desde que ele passou a integrar o Ministério de Lula.

Em apenas dois meses de esforço jornalístico, o Estadão já revelou que, quando deputado, Juscelino Filho usou dinheiro do orçamento secreto para asfaltar uma estrada que passa em frente a fazendas dele e de seus familiares; voou em avião da FAB para cumprir agendas particulares, inclusive com recebimento de diárias (devolvidas após o caso vir a público); escondeu patrimônio da Justiça Eleitoral; informou dados falsos ao Tribunal Superior Eleitoral para justificar o uso indevido de recursos do fundo eleitoral; emplacou funcionário fantasma no Senado; e, como se não bastasse, sobre Juscelino Filho ainda pairam graves suspeitas de ter intermediado a contratação de empresas de amigos e ex-assessores pela Prefeitura de Vitorino Freire – município governado pela irmã do ministro, Luanna Rezende

É essa a folha corrida de Juscelino Filho, tirado por Lula do merecido anonimato, em nome sabe-se lá de quais imperativos políticos. Dos petistas, ferozes críticos dos muitos desvios éticos do governo de Jair Bolsonaro, não se ouviu palavra. Sabe-se que o lulopetismo faz o diabo para chegar ao poder e se manter lá, como provam o mensalão e o petrolão, mas poderiam ao menos demonstrar algum incômodo com um caso tão cristalino de imoralidade – que fosse apenas para manter as aparências de um governo cujo presidente venceu as eleições prometendo restabelecer a democracia e a decência.

Ao que parece, Lula não vê problema em manter em um Ministério que se presta a auxiliá-lo na “união e reconstrução” do Brasil uma pessoa com um passivo desses. O presidente se limitou a exigir que Juscelino Filho “fosse às ruas” e “se explicasse”, como se não fosse dele, como chefe de Estado e de governo, a responsabilidade de zelar pela moralidade de sua própria administração.

Se Lula da Silva não quer que os rolos de Juscelino Filho passem a ser exclusivamente seus, passa da hora de o presidente da República nomear um novo ministro das Comunicações.