Em setembro passado, Michel Barnier assumiu o cargo de primeiro-ministro na França prometendo “ruptura e mudanças”. Não conseguiu nem uma coisa nem outra. Por trás dessas promessas grandiloquentes, o objetivo, na prática, era mais modesto. Com um governo minoritário, as reformas ambiciosas do presidente Emmanuel Macron ficaram no passado. Restava manter uma administração funcional e disciplinar minimamente as contas públicas. Barnier, um veterano de centro-direita que, como comissário europeu, geriu o acordo do Brexit, parecia uma escolha sensata. O problema é que não era a escolha dos eleitores.
A votação expressiva dos radicais de direita da Reunião Nacional para o Parlamento Europeu em junho foi um protesto contra as políticas de Macron. Ao convocar temerariamente eleições na sequência, ele alegou dar aos franceses uma “segunda chance”. Mas eles dobraram a aposta nos radicais de direita e de esquerda, resultando num Parlamento com dois blocos opostos e os centristas de Macron espremidos no meio. Ao escolher Barnier, ele ignorou de novo a vontade do eleitorado.
Em comum, os dois blocos têm três coisas: irritação com Macron, hostilidade um ao outro e a recusa a cortar gastos. Em três meses, ambos se uniram para derrubar Barnier. Foi o terceiro premiê em um ano e o mais breve da Quinta República. Novas eleições só podem ser convocadas em julho e a França terá de se arranjar com um presidente desmoralizado, um Parlamento fragmentado e as contas públicas em decomposição. O Orçamento deste ano pode ser provisoriamente replicado no ano que vem. Mas isso deixará intacta a febre fiscal que inflama a instabilidade política.
Na raiz do mal-estar está o baixo crescimento. Há décadas a produtividade europeia se distancia da dos EUA. Macron sabe disso: “A União Europeia como conhecemos pode acabar; é regulada demais e investe de menos. Se não mudarmos nossa forma de pensar, estaremos fora do mercado”. Mas no seu próprio quintal ele é impotente. Os dois extremos não têm ideia de como revitalizar a economia e podem piorar as coisas se reverterem as reformas trabalhistas e previdenciárias de Macron.
O espectro de uma nova crise fiscal similar à de 2010 assombra a Europa. Mas a volatilidade agora não vem de países periféricos, como Grécia, Irlanda, Portugal ou Espanha, mas do centro. O governo alemão também colapsou por pressões fiscais e baixo crescimento.
O momento não poderia ser pior. Enquanto a Rússia intensifica a agressão à Ucrânia e flexiona seus músculos em antigos satélites soviéticos, como a Georgia, o futuro presidente dos EUA, Donald Trump, ameaça abandonar as defesas europeias à própria sorte e detonar uma guerra comercial. Internamente, a combinação de fragmentação política com economias enfermas cria uma volatilidade perigosa. Governos minoritários (como em Paris) ou coalizões incongruentes (como em Berlim) têm dificuldades de sobreviver, quanto mais de fazer reformas, e, sem a liderança de França e Alemanha, Bruxelas tateia às cegas.
Os governos centrais da União Europeia poderiam aprender algo com os periféricos sobre como reviver a economia. Mas ainda terão o desafio, particularmente na França, de despertar os eleitores para uma realidade que eles parecem se recusar a encarar: a sua economia não consegue sustentar suas demandas. Uma agenda pró-crescimento precisaria combinar um tanto de austeridade, para sanear as contas públicas, e um tanto de desregulação, para estimular o empreendedorismo. Mas isso significa, de imediato, mais riscos nos negócios e menos benefícios sociais. É a velha receita: o bolo precisará crescer para ser dividido. Mas os populistas nos extremos seguem prometendo o impossível – ter o bolo e comê-lo, como dizem os britânicos – e os moderados no centro não estão conseguindo desconjurar esse encanto.
Em junho, Macron justificou a dissolução do Parlamento alegando que “essa decisão é a única que permitirá ao país se mover e se unir”. Ele não conseguiu nem uma coisa nem outra, e a letargia e a fragmentação estão infectando a Europa.