Ao participar do encerramento de um seminário do PT destinado a debater os rumos do partido – aquele tipo de encontro em que o comissariado petista costuma reafirmar vícios do passado para aprimorá-los no futuro –, o presidente Lula da Silva fez uma crítica contundente à comunicação do governo. “Há um erro do governo na questão da comunicação e sou obrigado a fazer as correções necessárias”, disse o presidente, em declaração interpretada como um prenúncio de que em breve trocará o responsável pela área, o desgastado ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República. “Quero começar a resolver no começo de ano”, avisou. Apoquentado com o que considera um abismo entre suas grandes realizações e a tépida aprovação popular, Lula endossou e inflamou as queixas já recorrentes num tema que ganha evidência toda vez que o demiurgo sente que seus poderes divinos não estão sendo bem compreendidos.
A fala amuada de Lula contra a comunicação do seu governo até adquiriu contornos inéditos pelas palavras duras que escolheu, mas na prática ele só repetiu o velho hábito de terceirizar a responsabilidade por problemas que nascem, no fundo, no próprio gabinete presidencial. A Lula o que é de Lula: a despeito da inquestionável má qualidade da comunicação no atual mandato e do baixo nível de conhecimento dos seus artífices sobre as dinâmicas do ambiente digital, o defeito de origem está no produto, não no marketing destinado a vendê-lo. O fato é que não há ministro, marketing político ou estratégia de qualidade capaz de vender um produto ruim.
Ocorre que, com a fritura pública de Pimenta, a bolsa de apostas para substituí-lo já tem até favorito: o marqueteiro do presidente na eleição vitoriosa de 2022, Sidônio Palmeira, ideia que teria ganhado corpo após o ruidoso anúncio que misturou, em rede nacional de rádio e TV, o pacote de ajuste fiscal e a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. Coube a Sidônio a ideia de combinar as duas coisas e adornar a fala do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, convertida no primeiro ato de uma campanha institucional, lançada com slogan marqueteiro e consistência duvidosa. A mistura, o timing e a forma do anúncio provocaram estragos adicionais em um pacote que deveria comprovar a alegada sobriedade econômica do governo, mas foi levado adiante como peça de propaganda eleitoral. Ao que parece, contudo, Lula considerou a operação um sucesso.
Não faltou nem mesmo a velha tática de afetar humildade, quando Lula se incluiu entre os responsáveis pelos problemas de comunicação: “Há um equívoco meu na comunicação. O Stuckert (referência a seu fotógrafo oficial, Ricardo Stuckert) costuma dizer ‘presidente, o senhor é o maior comunicador do nosso partido, o senhor tem que falar mais’. E a verdade é que não tenho organizado as entrevistas coletivas”. Então estamos combinados: Lula, que já fala pelos cotovelos, avisou que vai “falar mais”.
E talvez seja exatamente esse o problema. Quando Lula fala, quase sempre de improviso, ou cria expectativas incompatíveis com a capacidade do governo de realizá-las, ou constrange a equipe econômica com discursos demagógicos que contrariam o compromisso com a saúde das contas públicas. O resultado é a crescente falta de credibilidade do governo.
Mas Lula está convencido de que seu governo é um primor e que a maioria dos brasileiros se convenceria disso se o presidente concedesse “mais entrevistas” – sobretudo para meios escolhidos a dedo pelo Palácio por deixarem Lula à vontade.
Enquanto isso, Lula não comenta sobre os problemas de coordenação política (liderada por ele mesmo), ou sobre a falta de um núcleo dirigente no Planalto capaz de corrigir os rumos ditados pelo presidente, ou ainda sobre a malaise provocada por um governo que chega envelhecido à metade do mandato. Como se vê, o que o presidente espera da comunicação do seu governo é algo que diz respeito mais a ele próprio. Uma certeza que só escancara a inutilidade do debate proposto na reunião do PT.