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A mágica do Auxílio Gás

Nova proposta para programa cheira a contabilidade criativa e gera constrangimento à equipe econômica

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Por Notas & Informações
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São velhos e manjados os truques dos governos petistas com as contas públicas, mas eles seguem tentando iludir a plateia. O novo Auxílio Gás, rebatizado de Gás para Todos, é o mais recente número da trupe de Lula da Silva. Com uma mão, os mágicos do governo anunciaram que vão quadruplicar os gastos com o programa e ampliar o número de famílias atendidas. Com a outra, reduziram em 84% a projeção de despesas com a proposta no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2025. Esse bicho estranho que saiu da cartola lulopetista é apenas uma manobra para retirar o programa do Orçamento e repassar sua gestão e operacionalização à Caixa Econômica Federal.

Os recursos para bancar a política pública, oriundos da venda do óleo do pré-sal, passarão longe da conta do Tesouro. A Caixa receberá o dinheiro e fará o pagamento dos botijões de gás oferecidos às famílias carentes diretamente aos fornecedores. Assim, o Executivo abrirá mão de receitas ao mesmo tempo que ampliará o espaço para despesas na peça orçamentária. Pegou mal, pois cheira a contabilidade criativa.

Questionada, a equipe econômica atribuiu a autoria do programa ao Ministério de Minas e Energia e argumentou que o projeto ainda sofreria ajustes durante a tramitação no Legislativo, de forma a assegurar que sua versão final respeitasse o arcabouço fiscal.

O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, até admitiu “alguma preocupação” com o formato do programa, mas esse receio não impediu o governo de reduzir a projeção de receitas e despesas com o Auxílio Gás ao elaborar o Orçamento.

Ontem, o ministro Fernando Haddad disse ter recebido autorização do presidente Lula da Silva para ajustar o projeto e garantir que o gasto com o programa não fique fora do Orçamento. Horas depois, Silveira afirmou que mudanças, se ocorrerem, serão pontuais, pois “não podemos ficar reféns da Faria Lima”.

Ora, não se trata de ceder ou não ao mercado, mas apenas de seguir a legislação e a própria Constituição. Da forma como foi elaborada, a proposta desrespeita o princípio da unidade orçamentária, segundo o qual todas as receitas e despesas devem estar na LOA para garantir estabilidade, consistência, transparência e controle no uso dos recursos públicos.

O pesquisador do Insper Marcos Mendes disse ao Estadão tratar-se de uma repetição de métodos criativos utilizados por governos anteriores – leia-se Dilma Rousseff – para gastar mais sem que a despesa apareça na peça orçamentária.

Existe um limite de gastos que precisa ser respeitado. Além disso, embora a medida represente uma renúncia de receitas, o governo não disse expressamente de que forma pretende compensá-las, algo obrigatório segundo os termos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Esse mesmo governo tão descuidado com algumas exigências básicas no trato do dinheiro público é aquele que outro dia foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) para exigir do Congresso que cumprisse as regras fiscais e apresentasse maneiras de repor as perdas com a desoneração da folha de pagamento dos setores que mais empregam e dos municípios. Não há mágica que mude a natureza da demagogia.