O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) seguiu o roteiro ao aumentar os juros em 1 ponto porcentual, para 14,25% ao ano, maior nível desde outubro de 2016, e entregou o que dele se esperava ao deixar claro que o ciclo de alta da Selic prossegue na próxima reunião, mesmo que em menor magnitude. Não havia como ser diferente num contexto de inflação elevada, sob pressão e acima da meta, mas nada disso impedia o governo de tentar constranger a atuação do Banco Central até então.
Com a posse de Gabriel Galípolo na presidência do BC, tudo mudou. Chamado pelo presidente Lula da Silva de “menino de ouro”, Galípolo substituiu Roberto Campos Neto, que havia sido nomeado pela nêmesis de Lula, Jair Bolsonaro, e que por essa razão era sistematicamente atacado pelos petistas sempre que os juros subiam – Gleisi Hoffmann, na época presidente do PT, era a mais animada, acusando Campos Neto de “terrorismo econômico” e de não “entender nada” sobre as necessidades dos trabalhadores. Hoje ministra de Lula, Gleisi nada disse sobre a nova alta de juros. E o silêncio, neste caso, diz muito.
Ao deixar o BC praticamente amarrado nas reuniões de janeiro e março – orientação que, por sinal, contou com apoio unânime no Copom –, Campos Neto garantiu uma transição suave e sem críticas para Galípolo. Mas é improvável que o atual presidente do BC conte com a mesma condescendência na próxima reunião, nos dias 6 e 7 de maio. Sobre ela, só se sabe que os juros não subirão 1 ponto porcentual, o que significa que poderão aumentar até 0,75 ponto porcentual. Depois disso, tudo dependerá do “firme compromisso de convergência da inflação à meta”, como diz o Copom.
Atingir esse objetivo ainda parece distante. Para os 12 meses encerrados em setembro de 2026, que corresponde ao horizonte relevante que guia suas ações, o Copom reduziu a projeção de inflação de 4% para 3,9%, mas ela segue acima da meta. O câmbio pode ter contribuído com esse pequeno alívio, já que o comitê levou em conta uma cotação de R$ 5,80 em março, ante R$ 6,00 em janeiro. Os investidores projetam que a Selic pode chegar a 15% ao ano, e o comunicado do BC sugere que o fim desse ciclo, iniciado em setembro do ano passado, está próximo. O Copom vê sinais de uma “incipiente moderação” no crescimento, mas reconhece que a inflação e seus núcleos estão acima da meta e que o mercado de trabalho continua forte.
Na falta de um discurso melhor, o governo optou por culpar Campos Neto – que servirá como bode expiatório até o início de maio. Repetindo o que Lula havia dito em janeiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que Galípolo não poderia dar um “cavalo de pau” ao assumir o comando do BC, pois teria uma “herança” a administrar. Só faltou dizer que era uma herança maldita.
Se o governo colaborasse e fizesse sua parte, talvez os juros já estivessem em níveis mais civilizados. Mas há muitas outras medidas no forno do Executivo que visam a manter a demanda aquecida até a eleição no ano que vem e que devem contribuir para que os juros sejam mantidos em níveis bastante elevados. A ver quem o governo responsabilizará nos próximos meses.