Dilma Rousseff não tinha como se esquivar de uma manifestação a respeito da prisão de seu líder no Senado e saiu pela tangente confessando-se “extremamente perplexa” com o ocorrido. Se por dever de ofício a presidente da República precisa saber tudo o que se passa nos altos escalões do governo, das duas, uma: ou Dilma Rousseff mentiu mais uma vez ao sugerir que não tinha a menor ideia das lambanças de seu líder no Senado ou deu mais uma demonstração pública de que efetivamente não consegue governar, porque simplesmente não vê ou não é informada sobre o que acontece sob seu nariz. Aos jornalistas brasileiros que a entrevistaram segunda-feira em Paris sobre a prisão de Delcídio Amaral, Dilma deu mais uma demonstração eloquente de que, apesar de estar há quase cinco anos na chefia do governo, ainda não se convenceu de que falar de improviso não é seu forte: “Fiquei com dois sentimentos. Fiquei muito perplexa, extremamente perplexa. Não esperava que isso acontecesse. Ninguém esperava”. Como se vê, os sentimentos de dona Dilma se reproduzem por cissiparidade.
O episódio proporcionou a Dilma preciosa oportunidade para enriquecer seu vasto repertório de impropriedades verbais. Depois de mencionar a principal qualificação pela qual escolheu Delcídio para ser seu líder no Senado – “uma pessoa bastante bem relacionada” que tinha “boas relações com todos os partidos” –, Dilma incorreu em pequenas confusões: “Mas, infelizmente, nenhum de nós é insubstituível. Ele foi substituído e as relações com o Congresso vão se dar normalmente”. Delcídio não havia sido substituído; a liderança do governo no Senado continuava vaga e assim ficará até janeiro. Já a afirmação de que “infelizmente” ninguém é insubstituível só pode ser interpretada, indulgentemente, como um lapso verbal.
Em relação à corrupção endêmica que corrói as instituições e paralisa o País, Dilma Rousseff tem contado com a indulgência dos brasileiros, que, em sua maioria, a consideram incompetente e gostariam de vê-la fora do governo, mas tendem a conceder-lhe, pelo menos, o benefício da dúvida no que diz respeito a seu eventual envolvimento com práticas delituosas. Essa boa vontade pode ser atribuída ao fato de que a chefe do governo, há quase 13 anos exercendo cargos de primeiro escalão na administração federal, jamais deu demonstrações de ter enriquecido na vida pública, exatamente o contrário do que acontece com seu criador.
Sempre que paira no ar alguma suspeita capaz de atingi-la, Dilma alega ignorância dos fatos. Foi o que fez quando surgiram informações sobre possíveis irregularidades na compra, pela Petrobrás, da Refinaria de Pasadena, na época em que ela, como chefe da Casa Civil do presidente Lula, presidia o Conselho de Administração da estatal. Dilma negou qualquer responsabilidade pela operação que causou enorme prejuízo à petroleira, alegando que ela e os demais conselheiros haviam aprovado a transação tenebrosa com base em um parecer falho e incompleto fornecido pelo ex-diretor Nestor Cerveró, hoje condenado com base nas investigações da Operação Lava Jato.
De acordo com declaração de Delcídio e anotação nos documentos da denúncia que o levou à prisão preventiva, Cerveró foi nomeado para a diretoria Internacional – onde foi o maior responsável pelo affair Pasadena – por Dilma. Em Paris, a presidente voltou a negar essa versão: “Eu acredito que o senador Delcídio se equivoca. Ele (Cerveró) não é minha indicação, ele não é da minha relação, e isso é público e notório”. E acrescentou, a respeito das irregularidades na compra: “Não só eu não sabia de tudo”, como “quando soubemos que ele não havia dado todos os elementos para nós (os conselheiros) eu fui uma pessoa que insisti para ele sair”.
A continuar se apoiando no argumento da ignorância dos fatos sempre que se confronta com suspeitas de envolvimento em casos de corrupção, Dilma talvez consiga preservar a imagem de perplexa probidade que ainda ostenta. Mas estará consolidando a reputação de que não é capaz de enxergar um palmo adiante do nariz e também por isso é considerada a pior presidente que o Brasil já teve.