A tragédia provocada pelo rompimento de duas barragens de rejeitos de mineração no município de Mariana, em Minas Gerais, na última quinta-feira – que deixou um rastro de destruição e morte e comoveu o País –, coloca a empresa Samarco, proprietária daquela exploração, os serviços de fiscalização dessa atividade, a polícia, o Ministério Público Estadual (MPE) e todos os que têm uma parcela de responsabilidade nesse caso na obrigação não só de investigar as causas do acidente e reparar os prejuízos materiais dos que foram afetados, como de tomar as providências que se impõem para evitar a repetição de fatos como esse.
As imagens de como ficaram os três distritos de Mariana próximos da barragem – Camargos, Paracatu de Baixo e Bento Rodrigues, principalmente este, quase inteiramente submergido pela lama –, transmitidas pela televisão, vão permanecer como o registro chocante de uma das piores catástrofes da História do País. A primeira barragem a se romper foi a Fundão, que tinha 7 milhões de metros cúbicos de rejeitos da mina de ferro explorada pela Samarco. Em seguida rompeu-se a de Santarém, muito maior, com 55 milhões de metros cúbicos.
Essa torrente de lama, mistura de água e de rejeitos, de 62 milhões de metros cúbicos, atingiu rapidamente Bento Rodrigues, levando de roldão tudo a sua frente – casas, edifícios públicos, escolas, igrejas. Estima-se que os desabrigados são no mínimo 600. O volume e a natureza do material tornaram muito difícil socorrer as pessoas atingidas por ele e a busca de sobreviventes. É de quatro o número de mortos, mas a esperança de encontrar os cerca de 22 desaparecidos, segundo os bombeiros e o próprio governador mineiro, Fernando Pimentel, é mínima.
Não apenas esses distritos foram afetados pelo acidente. A lama também atingiu e contaminou rios da região, entre eles o Rio Doce, matando peixes e ameaçando a captação de água para abastecer aproximadamente 500 mil pessoas de cidades de Minas e do Espírito Santo. O desastre ambiental já pode ser considerado um dos piores registrados na região. Isso basta para dar uma ideia da extensão dos estragos provocados pelo rompimento daquelas barragens.
O diretor-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, garante que a empresa – que teve suas atividades embargadas até que adote medidas destinadas a reparar os danos – cumpriu todas as exigências do programa de emergência aprovado pela prefeitura de Mariana e de outros órgãos que fiscalizam a atividade mineradora. As investigações verificarão se isso é certo. Mas desde já está claro que algumas questões intrigantes devem ser esclarecidas. A primeira, que deixou atônitos os que escaparam da tragédia, foi a forma como a população ameaçada foi alertada. Não por um sistema de sirene, mas por telefone, um instrumento limitado para tal emergência.
A segunda é a existência de um estudo, feito há dois anos a pedido do MPE pelo Instituto Pristino, do qual participaram professores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que alertava para o risco de rompimento das barragens Fundão e Santarém. Segundo o promotor de Meio Ambiente Carlos Eduardo Ferreira Pinto, esse estudo foi entregue à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e à Samarco e, por isso, ele quer saber de ambas se alguma medida preventiva foi tomada com base nele.
Se a Samarco respeitou mesmo todas as suas obrigações, é preciso então, como propõe Ferreira Pinto, que mudanças sejam feitas na legislação que regula a questão, porque o sistema atual de monitoramento das barragens e proteção contra acidentes se relevou falho.
Como mostra reportagem do Estado, 24 das 14.966 barragens catalogadas pela Agência Nacional de Águas (ANA) são consideradas de alto risco pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Três delas estão em Minas Gerais. A probabilidade de novos acidentes é, portanto, bastante elevada, principalmente se se levar em conta que as barragens Fundão e Santarém eram consideradas de baixo risco. Tudo isso só reforça a proposta de Ferreira Pinto.