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A verdadeira autonomia das universidades

Reforma tributária é oportunidade para assegurar que os impostos sejam usados na efetiva produção de conhecimento e na formação de professores e de profissionais essenciais ao País

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Por Notas & Informações
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Entre os efeitos da aprovação pelo Congresso Nacional da reforma tributária estará a necessidade de rever o modelo de financiamento das universidades públicas de São Paulo. Definido inicialmente pelo Decreto Estadual 29.598, de 1989, ele prevê que as instituições de ensino superior recebam uma parcela da cota-parte do Estado da arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – 75% por cento do imposto fica com o governo estadual e 25% são distribuídos aos municípios. O mecanismo entrega à Universidade de São Paulo (USP) cerca de R$ 7,5 bilhões, enquanto Unicamp e Unesp recebem, cada uma, cerca de R$ 3,7 bilhões.

Os integrantes do Conselho dos Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp) estiveram recentemente com o governador Tarcísio de Freitas e ouviram dele a renovação do compromisso de que o sistema deve ser mantido após a substituição do ICMS pelo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), o que deve ocorrer gradualmente.

Age bem o governador ao tranquilizar não só os reitores, bem como a sociedade paulista, que desde a fundação da Universidade de São Paulo, em 1934, viu o desenvolvimento econômico, científico e cultural de seu povo se confundir com o destino do ensino público no Estado.

A autonomia econômica das universidades é, para os reitores, um instrumento fundamental para que o artigo 207 da Constituição seja uma realidade. Ela garante a essas instituições a “autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial”. Devem, no entanto, obedecer ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Ou seja, a autonomia acadêmica se realiza somente na presença da financeira, que garantiria a segurança de fluxo de recursos e a capacidade de planejamento. Em outras palavras, não há autonomia quando, por exemplo, os gastos com folha de pagamento de professores e funcionários excedem a receita da universidade, como aconteceu recentemente na USP.

Por esse motivo, Tarcísio de Freitas e os reitores podem e devem ir além da mera discussão sobre recursos e sobre o novo porcentual da arrecadação que será destinado às universidades. A defesa da liberdade de cátedra e das condições para que ela floresça como uma das liberdades fundamentais de um Estado Democrático de Direito não deve elidir os princípios da responsabilidade, da economicidade e da transparência na gestão pública. É necessário, portanto, às universidades recuperar o espírito do decreto de 1989, que estabeleceu a recomendação de que os gastos com pessoal não ultrapassassem 75% dos valores liberados a elas pelo Tesouro estadual.

Em maio, a maior das três universidades – a USP – recebeu R$ 615 milhões do Tesouro, dos quais R$ 587 milhões em repasses do ICMS. E gastou 84% desse total com pessoal (R$ 517 milhões). Obteve ainda R$ 90,6 milhões com receitas próprias. Esses números devem servir de aviso para que a segurança financeira não seja acompanhada da falta de controle dos gastos e da acomodação que despreza a luta pela eficiência e pelo controle da produção de seus pesquisadores. É preciso assegurar que os recursos dos impostos sejam usados na efetiva produção de conhecimento, na formação de professores e de profissionais fundamentais ao País. O dinheiro público não pode ser sequestrado por interesses corporativos nem pelo conforto da improdutividade acadêmica.

É longa a lista de serviços prestados pelas universidades públicas ao País. A crise financeira da década passada, com suas obras inacabadas e a expansão mal programada de cursos e salários, não pode servir para desqualificar as instituições paulistas de ensino superior. Esse passado apenas reafirma a necessidade de garantir instrumentos administrativos efetivos de fiscalização e controle da produção e dos gastos a fim de que a autonomia universitária não seja alvo de desconfiança, mas um motivo de orgulho para o País.