Durou exatos 13 dias o compromisso do regime de Nicolás Maduro com a oposição e os Estados Unidos de realizar eleições presidenciais “competitivas” em 2024. No último dia 30, para surpresa de ninguém, o assim chamado “Tribunal Supremo de Justiça” do país, totalmente controlado pelo regime chavista, suspendeu “todos os efeitos” das primárias eleitorais de 22 de outubro. Em paralelo, o Ministério Público pôs em ação seu aparato persecutório contra os integrantes da comissão organizadora do pleito. Acreditar que os benefícios econômicos da reabertura do mercado americano ao petróleo, gás e ouro venezuelanos seriam suficientes para o governo autoritário manter-se fiel à sua promessa só fazia sentido na esfera da ingenuidade – ou do pragmatismo de Washington em fechar os olhos e defender seu interesse de curto prazo.
O acordo firmado em Barbados, com intermediação do governo Lula da Silva, nasceu morto no último dia 17. O reconhecimento de Caracas a termos que poriam sob ameaça a sobrevivência do regime chavista só pode ser explicado pela má-fé e pelo oportunismo, diante da necessidade de os EUA fortalecerem suas reservas estratégicas de petróleo e gás. Nunca interessou a Nicolás Maduro o respeito a princípios básicos e caros à democracia. Menos ainda qualquer brecha para o desmonte de uma estrutura institucional corrupta e viciada, na qual o poder do Executivo, sob o amparo de braços armados e da servilidade do Legislativo e do Judiciário, se tornou inquestionável e praticamente absoluto.
A decisão do tal Tribunal Supremo, por si só, não surpreende. A rigor, anula a legitimidade da escolha da imensa maioria dos 2,5 milhões de eleitores nas primárias pela candidatura da ex-deputada María Corina Machado para o Palácio Miraflores. Perseguida pela cúpula chavista, assim como os demais nomes fortes da oposição, María Corina fora proibida em julho passado de disputar cargos públicos por 15 anos pela Controladoria-Geral da República – outro órgão a serviço de Maduro. A corte fez valer a impugnação.
Igualmente grave foi o anúncio da Procuradoria-Geral de abrir investigações por “usurpação das funções eleitorais e de identidade, organização criminosa e lavagem de dinheiro” contra os integrantes da Comissão Nacional das Primárias. Formada por partidos de oposição, a comissão tomara para si a organização do pleito por uma razão inequívoca: a flagrante negligência e indisposição do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), dominado pelo chavismo, para convocar e realizar as primárias. Esperar por alguma iniciativa do conselho, no final das contas, poria sob risco qualquer candidatura da oposição em 2024. Confrontá-lo deu no que deu.
Como se vê há mais de duas décadas, a Venezuela chavista mata, na origem, qualquer possibilidade de contestação, nas urnas e nas ruas, ao regime que, como todo projeto autoritário, se supõe eterno. Clamar a Caracas pelo cumprimento do que assinou em Barbados é tão singelo como crer que o acordo seria um primeiro passo para a redemocratização da Venezuela. Pura perda de tempo.