A decisão da União Europeia (UE) de conceder uma ajuda de até 100 bilhões à Espanha surpreendeu, de início, porque o valor é muito maior que o necessário, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), para a capitalização dos bancos - 40 bilhões. A diferença, segundo fontes comunitárias, servirá como margem de segurança. A aparente generosidade é facilmente explicável. Trata-se de construir em torno dos bancos espanhóis, e da própria Espanha, uma barreira sanitária muito mais eficiente do que aquelas montadas em torno da Grécia e de outros países em graves dificuldades. A economia espanhola é a quarta maior da zona do euro. Um colapso da Espanha aumentaria consideravelmente o risco de contágio da Itália e seria um prenúncio de problemas bem mais graves para a França. Em momentos de maior insegurança, os bancos italianos e franceses foram submetidos a fortes pressões. As autoridades já devem ter sofrido sustos mais que suficientes para reforçar as ações de prevenção de contágio. O socorro de até 100 bilhões decidido no sábado pelo Eurogrupo, o fórum dos ministros de Finanças, é menor que a ajuda proporcionada à Grécia ( 130 bilhões no segundo pacote), mas a situação fiscal espanhola é bem melhor que a grega. O Tesouro grego deve cerca de 200% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. A dívida pública espanhola deve aproximar-se de 80% do PIB neste ano e ainda será inferior à média da zona do euro, cerca de 90%. Além disso, o governo do primeiro-ministro Mariano Rajoy vem tentando avançar na agenda de reformas para tornar a economia mais ágil e mais competitiva. Mas esse esforço, embora aplaudido pelas autoridades comunitárias e pelo FMI, é realizado em condições econômicas e financeiras muito difíceis e o quadro, segundo avaliação oficial, poderá piorar neste ano. Já empenhado em duros ajustes e reformas num país estagnado e com desemprego na faixa de 24%, o governo ficaria em situação extremamente complicada se tivesse de enfrentar sozinho o problema de capitalização dos bancos. Só as necessidades de um dos grupos, o Bankia, foram avaliadas em 23 bilhões. A ajuda comunitária tornará exequível o indispensável suporte às instituições financeiras espanholas. Se o plano der certo, o risco de quebras com um desastroso efeito de contágio será reduzido e a zona do euro terá contornado mais um perigo.O primeiro-ministro Mariano Rajoy demorou a pedir a ajuda externa, embora a necessidade fosse evidente. A demora foi motivada por fatores políticos. O governo espanhol tentou evitar ou adiar, tanto quanto possível, o custo de uma negociação de socorro sujeita a condições e, portanto, a interferências externas na condução da política econômica, Confirmada pelo Eurogrupo a disposição de ajuda de até 100 bilhões, o primeiro-ministro anunciou a obtenção de um pacote sem risco de interferências. Logo em seguida, isso foi desmentido.Segundo o ministro das Finanças da Alemanha, Wolfgang Schäuble, a reestruturação dos bancos espanhóis será acompanhada por funcionários da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do FMI. Estará em cena a troica já encarregada de supervisionar a ação dos governos favorecidos por pacotes financeiros. Os fiscais poderão abster-se, oficialmente, de controlar a política macroeconômica, mas o governo já está comprometido com duras medidas de ajuste e de reforma.Se houver margem para algum estímulo ao crescimento, a arrumação das contas será mais fácil e menos forte a resistência política às reformas. Mas isso dependerá de uma revisão geral da estratégia seguida na zona do euro e, portanto, de concessões importantes do governo alemão - o principal opositor das políticas de reativação defendidas por autoridades de vários países. O agravamento da crise bancária espanhola é ainda um efeito da bolha imobiliária estourada em 2007-2008. Os desmandos cometidos no setor financeiro ainda afetam vários países e isso inclui os Estados Unidos. Se fossem necessários mais argumentos a favor de maior controle financeiro, esses efeitos retardados seriam mais que suficientes.