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Armas fora de controle

É absurdo que o governo não tenha ideia de onde foram parar milhares de armas de uso restrito

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Por Notas & Informações
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O controle das armas de fogo no País – sobretudo o armamento de uso restrito – deixou de ser prioridade para o governo Lula da Silva.

No início do mandato, o presidente agiu corretamente ao determinar que o Ministério da Justiça recadastrasse todas as armas de fogo adquiridas por civis, em particular por Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs). Foi a forma encontrada para acabar com a expansão desenfreada desse arsenal, estimulada irresponsavelmente por Jair Bolsonaro. Passados quase dois anos, porém, permanece obscuro o destino de uma parte importante dessas armas, que obviamente deveria ter sido mais bem controlado pelas forças públicas a serviço da legalidade.

Com base na Lei de Acesso à Informação, o Estadão apurou que, das 50.432 armas de uso restrito cadastradas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), do Exército, só 44.264 foram apresentadas à Polícia Federal (PF) por seus donos durante a campanha de recadastramento. Ou seja, nem o governo Lula da Silva nem a PF nem o Exército fazem a menor ideia de onde foram parar 6.128 fuzis, metralhadoras, pistolas e outras armas de grosso calibre classificadas como de uso restrito.

Ora, não é preciso sobrecarregar os neurônios para chegar à conclusão de que, no mínimo, bem-intencionados não estão os proprietários que não atenderam ao chamado do governo para recadastrar suas armas de fogo. No pior cenário, uma parte dessas armas de uso restrito foi parar nas mãos do crime organizado. Este jornal já publicou uma série de reportagens revelando como as facções criminosas mais poderosas do País passaram a usar os CACs como “laranjas” para ter acesso a fuzis e pistolas a preços muito mais baixos do que os cobrados no mercado ilegal. Sem falar na nefasta consequência lógica que o aumento da circulação de armas de fogo ao abrigo do controle estatal acarreta para a sociedade: a propensão ao aumento da ocorrência de crimes de sangue.

Hoje, há um vácuo administrativo que só opera a favor dos criminosos. O Exército é responsável pela emissão e controle dos certificados CAC e pelo registro das armas de fogo no Sigma. Mas esses serviços nunca foram realizados a contento pela Força Terrestre, seja por falta de mão de obra, por leniência de alguns militares e, eventualmente, até por cooptação pelo crime organizado. Tanto é assim que o governo Lula da Silva decidiu transferir para a PF a emissão dos certificados CAC e o controle da posse e porte de armas de fogo no País. Mas isso só ocorrerá a partir de 1.º de julho deste ano. Até lá, ninguém sabe o que fazer para encontrar as armas não recadastradas, que, muito provavelmente, estão em poder de criminosos.

Para o pacífico cidadão que todo dia sai de casa para ganhar a vida atormentado pelo medo de ser mais uma vítima da violência urbana, pouco importa quem realiza esse controle; importa que ele seja bem-feito pelo Estado. Lula da Silva, porém, parece ter esquecido o assunto.