O autocrata russo Vladimir Putin já cometeu e continua a cometer inúmeros e pavorosos crimes de guerra em sua perversa agressão à Ucrânia, razão pela qual tem contra si uma ordem de prisão expedida pelo Tribunal Penal Internacional (TPI). Nada disso, contudo, parece impressionar o presidente Lula da Silva, que prefere criticar o TPI a admitir que o companheiro Vladimir é um delinquente.
Lula da Silva, que não perde o cacoete de sindicalista e saliva por uma boa luta de classes, tem Putin em alta conta porque o considera um símbolo da resistência aos Estados Unidos e ao Ocidente. No bestiário lulopetista, Putin é hoje uma espécie de Fidel Castro das estepes. Como se sabe, Lula considerava o Comandante cubano inimputável, mesmo que cometesse as mais desumanas barbaridades. No antiamericanismo apalermado do chefão petista, Fidel, Putin e quejandos não cometem crimes nem violam direitos, apenas se defendem como podem da sanha imperialista dos ianques. Se para isso esses heróis de Lula tiverem que prender e fuzilar dissidentes ou invadir um país soberano e atacar áreas civis, então que seja. Como disse um inspirado Fidel em 1953, “a história me absolverá”.
Putin, bem de acordo com o espírito totalitário, também quer ser julgado pela história – e Lula, é claro, lhe dá total apoio. Por isso, chegou a dizer, numa entrevista a um canal indiano, que o russo poderia vir tranquilo ao Brasil para participar da reunião de cúpula do G-20 em 2024, pois não seria preso. A detenção de Putin, disse o nosso presidente, afetando indignação, seria um “desrespeito” à soberania brasileira.
Quem desrespeita a soberania brasileira é Lula. A Constituição do País, fruto da vontade e do poder soberanos do povo brasileiro, estabelece, no artigo 5.º, parágrafo 4.º, que “o Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão”. Essa adesão foi formalizada em 2002 e incluída na Constituição em 2004. Ou seja, Lula, em nome de seus megalomaníacos devaneios antiamericanos, não se constrangeu em vandalizar um princípio constitucional brasileiro para adular um criminoso de guerra.
E esse princípio ora agredido por Lula está perfeitamente de acordo com o espírito constitucional de defesa dos direitos humanos, para os quais o petista nunca deu muita bola. O estabelecimento do TPI não só se prestou a responsabilizar governantes que violam direitos humanos mesmo em situação de guerra, como deu aos réus a possibilidade de um julgamento justo e isento, diferentemente do que tende a acontecer em tribunais ad hoc, geralmente constituídos de vencedores para julgar vencidos.
Diante da repercussão obviamente negativa de suas afirmações irresponsáveis, Lula tentou emendá-las – o que, conforme a sabedoria popular, sempre piora o soneto. Dois dias depois, admitiu que, no Brasil, quem manda prender ou soltar não é ele, mas a Justiça. Em seguida, contudo, desandou a falar bobagens sobre a necessidade de reavaliação da adesão do Brasil ao Estatuto de Roma, compromisso de fundação do TPI, por, segundo ele, trazer “prejuízo” aos países emergentes. De que “prejuízo” Lula fala quando se refere ao julgamento e à condenação de criminosos de guerra por um tribunal internacional, não se sabe.
Para piorar, Lula acrescentou que “torce” para que até a realização da cúpula do G-20 no Brasil, no ano que vem, a guerra contra a Ucrânia já tenha acabado e, portanto, tudo já tenha voltado à “normalidade” – sugerindo que o fim da guerra encerraria ou abrandaria as acusações do TPI contra Putin. Por essa lógica insana, os crimes de guerra só seriam considerados crimes enquanto houvesse guerra, o que é uma rematada estupidez. Crimes de guerra, por definição, são imprescritíveis, e Putin seguirá sendo acusado dos seus até seu julgamento, goste Lula ou não.
Mas é inútil procurar lógica ou coerência num discurso cujo único propósito é antagonizar os Estados Unidos e fustigar o Ocidente. Não se sabe o que o Brasil ganha com isso, mas sabe-se o que perde: respeito.