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Professor de Filosofia na UFRGS, Denis Lerrer Rosenfield escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto

Opinião | A esquerda fanática

O alinhamento não se faz mais segundo valores universais, apregoados por Marx e Engels, mas segue a linha do autoritarismo mais explícito

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A diplomacia presidencial de Lula da Silva, com apoio entusiasta do PT e o auxílio inestimável de seus assessores esquerdistas, é um exemplo eloquente do que esse setor da esquerda brasileira se tornou. Se antes alguns comedimentos eram ainda resguardados, agora a máscara caiu. O alinhamento não se faz mais segundo valores universais, apregoados por Karl Marx e Friedrich Engels, mas segue, atualmente, a linha do autoritarismo mais explícito, no apoio inabalável a Vladimir Putin e Nicolás Maduro, além dos companheiros de sempre, como os sucessores dos irmãos Castro, e, mais aterrador, na aliança com o totalitarismo islâmico, a exemplo do Hamas, Hezbollah e Irã. As escolhas foram feitas!

O Irã acaba de bombardear Israel com 181 mísseis balísticos, alvejando populações civis e bases militares, em uma evidente declaração de guerra, sem que Israel tenha invadido o seu território. Resposta do Itamaraty: silêncio. Manifestou dias depois “preocupação”. Revelador, não? Contudo, quando Israel exerce o seu direito de autodefesa, Lula não cessa de falar, em uma compulsão incontrolável, na qual se revela todo o seu antissemitismo. Se fôssemos seguir a sua lógica, na verdade ilógica, Israel deveria se submeter aos seus assassinos. Os ideólogos do PT poderiam, então, se regozijar em seu “humanismo”.

O ataque iraniano não tem nada a ver com a causa palestina. O regime dos aiatolás tem um único e só objetivo: aniquilar o Estado de Israel e, subsequentemente, os judeus pelo mundo afora. Preliminar disso já observamos nos atentados perpetrados na Argentina. Aliás, lá também com a complacência da esquerda peronista. Os palestinos são nada mais do que o pretexto utilizado para atrair a esquerda mundial, sobretudo de corte identitário. Se amanhã houvesse um acordo entre Israel e os palestinos, com a criação de um novo Estado, os ataques iranianos não iriam simplesmente cessar. Em nada ele contribuiria para o objetivo totalitário: a destruição do Estado judeu.

Essa esquerda nem mais se preocupa com as aparências: aprecia a violência pela violência, em nome da causa “decolonial”. Poderia, pelo menos, ser coerente: se prega a emancipação total das mulheres, deveria condenar o que ocorre com elas sob o regime totalitário iraniano. São submetidas a controles rigorosos de vestimentas, de exercício da sexualidade, como se fossem servas. Se não o fazem, são reprimidas, censuradas, torturadas e assassinadas às centenas, se não aos milhares. E o que têm a dizer as feministas esquerdistas: nada. Simplesmente se calam e são, dessa maneira, cúmplices. Os valores feministas não valeriam para as mulheres iranianas e para as submetidas aos regimes islâmicos. Tampouco valeriam para as mulheres estupradas e assassinadas nos ataques do 7 de Outubro e para as que são até hoje reféns do Hamas.

Provavelmente por ignorância, se não por má-fé, de onde Lula e seus assessores ideologizados tiraram a ideia de que o Hamas luta pela criação de um Estado palestino ao lado do judeu? Nem leram a carta de fundação dessa organização terrorista nem escutaram o que dizem os seus líderes. Eles visam unicamente à aniquilação do Estado de Israel. E a esquerda mundial, sobretudo universitária (lugar de despensamento), se encanta: “From the river to the sea, Palestine will be free” – do rio (Jordão) ao mar (Mediterrâneo), a Palestina será livre. Como assim? Onde fica a criação de dois Estados se Israel deve ser aniquilado?

O apreço dessa esquerda pela violência é seu traço definidor. Irã, Hamas e Hezbollah apregoam o culto da morte e do martírio. Festejam massacres, atentados terroristas e tudo aquilo que contribua para a supressão dos valores ocidentais, de liberdade, igualdade, tolerância e bem-estar de suas populações. Cometem crimes de guerra ao utilizarem os seus habitantes como escudos humanos. Lançadores de foguetes, armas e munições estão entrelaçados aos civis que se tornam os seus reféns. Procuram assim fazer com que Israel apareça como o agressor quando ataca os alvos militares. Para o Hamas e o Hezbollah, os palestinos são buchas de canhão. Os túneis servem somente aos terroristas, que ficam em abrigos, enquanto os civis entram no fogo cruzado. Israel, por sua vez, protege a população civil em abrigos construídos com essa finalidade, enquanto os seus soldados lutam a céu aberto. As organizações terroristas cultuam a morte, Israel, a vida.

Por último, o Hezbollah é um Estado dentro de um Estado, seu exército sendo superior ao libanês. E não responde às autoridades desse país, mas ao Irã, do qual é um satélite. Ou seja, o Líbano, que já foi considerado a Suíça do Oriente Médio, exemplo de liberdade, tolerância e convivência multiétnica e religiosa, convivendo pacificamente cristãos de diferentes confissões, muçulmanos xiitas e sunitas, drusos e árabes, é hoje um Estado escravo. Perdeu a sua soberania.

Triste fim dessa esquerda que, outrora, se apresentava como democrática.

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É PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS. E-MAIL: DENISROSENFIELD@TERRA.COM.BR

Opinião por Denis Lerrer Rosenfield

Professor de Filosofia na UFRGS, Denis Lerrer Rosenfield escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto

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