O mais recente Barômetro de Confiança do Grupo Edelman, que mede anualmente índices de confiança, informa que “a desconfiança é agora a emoção padrão da sociedade”. Há um “colapso da confiança nas democracias”: menos da metade da população mundial acredita nas instituições públicas; mesmo os povos desenvolvidos creem que suas famílias estarão piores em cinco anos. Ansiedades sociais estão se tornando agudas: 85% se preocupam com a perda do emprego e 75%, com as mudanças climáticas. A preocupação com a desinformação como arma atingiu um pico histórico de 76%.
Pior: o ciclo de desconfiança parece abastecido justamente por duas instituições fundantes da democracia: o governo eleito e a imprensa independente. Um em cada dois entrevistados vê o governo e a mídia como forças divisivas. Seja percepção ou realidade, esse descrédito conclama todos a um amplo e profundo exame de consciência.
Em um mundo de polarizações e redes sociais, uma nova geração de jornalistas vem questionando o ideal da objetividade em nome de uma certa “clareza moral”. “Os repórteres deveriam focar em ser justos e contar a verdade”, resumiu o articulista Wesley Lowery. A princípio, isso parece não tanto um abandono da objetividade, mas a sua apoteose. É fácil ver, porém, que, se essa “clareza moral” se degenera em moralismo e subjetivismo, antes de gerar empatia com o público e engajá-lo, acabará por aliená-lo ainda mais. Quando se demitiu do New York Times no ano passado, a editora Bari Weiss ecoou a descrença de muita gente na mídia ao criticar o que lhe parece o novo consenso no jornal: “Que a verdade não é um processo de descoberta coletiva, mas uma ortodoxia já conhecida por uns poucos iluminados cuja tarefa é comunicá-la a todo o resto”.
Algo análogo se passa na política. Para recobrar a credibilidade, os governos precisam entregar mais bem-estar social, crescimento inclusivo, liberdades pessoais, acesso à justiça e à paz. Mas tão importantes quanto esses resultados são seus processos. É crucial expandir mecanismos que removam barreiras à representação coletiva, deem mais voz aos cidadãos e tornem o Estado mais responsivo. Ademais, muitas pessoas percebem seus governos não só como distantes, mas corruptos e capturados por interesses privados. Por isso, eles precisam distribuir a elas mais instrumentos de responsabilização e transparência. Participação, transparência e confiança sempre se reforçam mutuamente.
Para os Três Poderes ou para o Quarto (a mídia) não se trata de reinventar a roda, mas de revigorar as fontes de toda credibilidade: competência e integridade. Os cidadãos confiam na imprensa quando sentem que ela está lhes contando a verdade, e confiam no Estado quando sentem que ele está lhes provendo a justiça. Mas verdade e justiça são realizações coletivas. Leitores e eleitores precisam se perceber e, sobretudo, ser partícipes nesses processos. Por isso, a pedra angular para jornalistas e estadistas reconstruírem sua credibilidade é a mesma e uma só: humildade.
A confiança é vital para o desenvolvimento da sociedade. A confiança entre os cidadãos permite que se compreendam e cooperem. A confiança permite que o poder público planeje políticas e entregue serviços. Num ecossistema confiável, investidores investem e consumidores consomem, gerando trabalho e prosperidade. Já a desconfiança leva à desintegração social, ao “cada um por si”: cada qual buscando a felicidade por si só para si só. Mas isso é ilusão. O inverso do “Um por todos, todos por um” é o reverso da fortuna.
“Há muitos membros, mas um só corpo. O olho não pode dizer à mão: ‘Não preciso de você’; nem a cabeça aos pés: ‘Não preciso de vocês’. Ao contrário, os membros que parecem mais baixos são indispensáveis”, advertia o apóstolo Paulo. “Deus dispôs o corpo dando mais dignidade aos membros que não a tinham, para que não haja dissensões no corpo e os membros tenham o mesmo cuidado uns pelos outros. Se um sofre, todos padecem com ele; e se um é revigorado, todos se regozijam com ele.” Assim é em uma sociedade sadia.