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Deslealdade

Deputada condenada pelo STF, fidelíssima bolsonarista, foi abandonada por Bolsonaro

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Por Notas & Informações
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Os sinos não vão dobrar pela sra. Carla Zambelli, deputada que o Supremo Tribunal Federal (STF) deve condenar à prisão pelos crimes de porte ilegal de arma de fogo e constrangimento ilegal com emprego de arma de fogo. A referida parlamentar não tem a menor importância para o País, a não ser como exemplo da forma francamente desleal como o ex-presidente Jair Bolsonaro trata aqueles que, como a sra. Zambelli, lhe devotam cega fidelidade.

Que a sra. Zambelli é desqualificada para o exercício da representação parlamentar já é do conhecimento de todos há muito tempo. A indigitada é o tipo ideal do bolsonarismo: mitômana, inventou ter sido curada de covid-19 apenas com o uso de cloroquina, inventou que o governo cearense enterrou caixões vazios para aumentar as estatísticas de mortos na pandemia e inventou que foi agredida pelo infeliz que ela temerariamente perseguiu, arma em punho, pelas ruas de São Paulo – crime pelo qual ela agora pagará. Ou seja, ela se notabilizou apenas pelo destrambelhamento e pela incapacidade de dizer a verdade, e não por projetos de lei do interesse de seus representados, razão pela qual ninguém deve chorar pela provável cassação de seu mandato.

Em defesa da sra. Zambelli, contudo, deve-se enfatizar que tudo o que de infame ela fez, cada mentira que contou, estava perfeitamente consoante com o espírito do bolsonarismo. Ou seja, a deputada condenada existe e respira apenas como sintoma dessa doença infantil do reacionarismo.

E essa doença infantil é intrinsecamente pusilânime. O ex-presidente, há alguns dias, culpou a ainda deputada por ter perdido a eleição de 2022. “Carla Zambelli tirou o mandato da gente”, disse Bolsonaro ao podcast Inteligência Ltda., em referência justamente ao caso em que a sra. Zambelli, de arma na mão, saiu a perseguir um desafeto. Para Bolsonaro, essa imagem arruinou suas chances de vitória em São Paulo e, consequentemente, no Brasil.

Eis aí Jair Bolsonaro em sua melhor forma: para não reconhecer que perdeu a eleição de 2022 porque desrespeitou a dor dos brasileiros que tiveram familiares e amigos mortos durante a pandemia de covid-19 e porque atentou dia e noite contra o espírito da democracia brasileira, Bolsonaro joga a culpa por sua derrota em cima de uma obscura deputada – que, reitere-se, agiu apenas como boa bolsonarista. O nome disso, claro, é covardia.

Em resposta, a sra. Zambelli até murmurou um protesto: “Enfrentar o julgamento dos inimigos é até suportável. Difícil é aguentar o julgamento das pessoas que sempre defendi e continuarei defendendo”, escreveu ela nas redes sociais. Debalde: como sabem os muitos sabujos de Bolsonaro que acabaram descartados por ele quando deixaram de ter alguma utilidade a seus projetos pessoais, o ex-presidente exige lealdade absoluta de todos os que querem dele se aproximar, mas não garante reciprocidade.

Portanto, o caso da sra. Zambelli só tem uma utilidade: mostrar àqueles que juram lealdade a Bolsonaro neste momento – achando que com isso terão a simpatia e o apoio eleitoral do ex-presidente – que correm sério risco de ter o mesmo destino da parlamentar: o descarte.