O segundo e último dia de prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2024, realizado no domingo, confirmou a tendência de maior presença dos alunos em todo o Brasil. Entre os mais de 4,3 milhões de estudantes que se inscreveram no Enem deste ano, a taxa de abstenção ficou em 26,6% no primeiro dia e em 30,6% no segundo – patamar menor quando comparado aos dos últimos dois anos, quando, na média, os índices dos dois dias de prova ficaram em torno de 28% e 32%, respectivamente.
Felizmente as provas também ocorreram em todo o País sem incidentes graves. Dois feitos importantes, sobretudo por se tratar de um terreno habitualmente fértil em más notícias – entre as quais, além da abstenção, incluíam-se, até aqui, indicadores ruins, desorganização, polêmicas ideológicas na prova e até, como se viu no trevoso governo de Jair Bolsonaro, tentativa de intervenção na realização do exame, cobrando-lhe alinhamento a dogmas bolsonaristas.
Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pela realização das provas, não apenas foi possível estancar o histórico de queda no número de inscritos, como houve um aumento nas inscrições, da ordem de 27% em relação ao ano de 2022 e de 10% ante 2023.
O patamar de adesão às inscrições entre os alunos de escolas públicas chegou a ser de 100% em 14 Estados brasileiros, especialmente do Norte e do Nordeste, e passou dos 80% no Rio Grande do Sul, onde os estudantes tiveram isenção de taxas por causa das enchentes do primeiro semestre deste ano. Proporcionalmente, Santa Catarina e São Paulo tiveram o menor número de inscritos, com 73,48% e 79,87%, respectivamente.
Não sem razão, o ministro da Educação, Camilo Santana, comemorou os números, atribuindo-os em boa medida ao Pé-de-Meia, programa que oferece dinheiro para os participantes de baixa renda. Para incentivar alunos mais pobres e de escolas públicas, o governo pagará R$ 200 àqueles que participarem dos dois dias de exame.
Há uma semana, o presidente Lula da Silva, como de praxe, excedeu-se no discurso repleto de superlativos. “Significa que estamos no caminho certo e que vamos fazer esse país dar certo”, gabou-se, em visita ao Inep. Nem tanto ao céu, como sugere o demiurgo que acredita ter poderes divinos. Mas, ainda que com a cautela devida, não deixa de ser um resultado a ser comemorado.
O maior comparecimento mostrou, por exemplo, que ideias simples têm eficácia imediata. Foi o caso do recurso de geolocalização, que permitiu ao inscrito fazer a prova em local mais próximo de sua casa. Livrar o Enem de ocorrências graves também é um mérito do Inep, autarquia vinculada ao MEC formada por servidores que, nos últimos anos, resistiram a pressões de todo o tipo, inclusive investidas cujo propósito era interferir indevidamente no conteúdo das questões.
A eficiência logística e a segurança são armas poderosas para garantir a normalidade do Enem. Em 2009, durante o segundo mandato de Lula da Silva, o exame precisou ser refeito em razão do vazamento da prova, e isso se tornou um fantasma frequente para organizadores e estudantes.
Após as provas, o ministro Camilo Santana informou que o governo planeja usar o Enem como substituto da prova do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), que avalia o desempenho dos alunos do terceiro e último ano do ensino médio. É uma iniciativa bem-vinda, uma vez que alunos do terceiro ano costumam dar prioridade ao Enem, prejudicando a precisão e a eficácia dos resultados aferidos pelo Saeb.
O feito de 2024 está longe de ser suficiente para resolver os muitos dilemas que afligem estudantes e o ensino médio em geral – nas escolas públicas, a alta evasão e o baixo desempenho estão entre os principais problemas dessa etapa. Apesar de nascer sob a inspiração de acabar com os processos seletivos tradicionais, o Enem repete há anos o mesmo modelo, e o ensino médio ainda patina na implementação de sua nova concepção, recentemente aprovada no Congresso. Mas, diante dos muitos desafios, superar alguns dos problemas das provas já é alguma coisa.