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Opinião | A advocacia vai às urnas novamente

A grandeza da advocacia não permite que a nossa entidade seja considerada um clube recreativo, uma ação entre amigos ou um espaço para realizações pessoais

Por Antônio Cláudio Mariz de Oliveira

A advocacia paulista vai às urnas novamente. Exercício democrático que se repete desde o nascimento da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional São Paulo (OAB-SP), em 1932. A mesma prática fora iniciada pela entidade mãe da OAB, o Instituo dos Advogados Brasileiros, em 1843, quando de sua fundação. Assim, a entidade representativa dos advogados brasileiros sempre praticou a democracia por meio do voto, uma das suas mais expressivas manifestações.

Não se pense, no entanto, que a representação da classe é retratada de forma fiel e autêntica. Não, não conseguimos, ainda, implantar as eleições diretas para que prevaleça o querer da maioria dos advogados quanto a quem deverá falar em seu nome como presidente da nossa entidade: a Ordem dos Advogados do Brasil. Esse, até hoje, é eleito por escrutínio indireto, regido por um sistema eleitoral hermético, pouco viável para que um grupo oposicionista possa obter êxito eleitoral. Portanto, um sistema que reflete uma democracia mitigada, capenga.

O afastamento da classe na eleição presidencial da ordem representa uma incongruência de difícil ou inexistente explicação: os advogados foram os vanguardeiros da luta pela implantação do pleito direto para a escolha do presidente da República na década de 1980. No entanto, jamais elegeram o seu presidente de forma direta.

Conseguiram, graças a um extraordinário empenho, junto com outras instituições, que o povo elegesse o seu mandatário. No entanto, na sua instituição, a participação para a escolha do dirigente máximo é limitada. Hoje há uma forte tendência na advocacia para a adoção das eleições diretas. É possível que em breve sejamos os responsáveis pela escolha de quem quisermos que nos dirija. No entanto, hoje a forma de eleição macula e compromete a legitimidade do próprio mandato presidencial.

Essa pequena digressão-desabafo não me retira o entusiasmo por mais uma eleição na ordem, seccional de São Paulo. Eu confesso com certo orgulho que as acompanho desde 1974, portanto, há 50 anos. E mais, a partir daquelas ocorridas em 1978, eu participei engajado em quase todas as candidaturas das eleições até os nossos dias. Fui eleito para presidir a seccional por dois biênios, de 1987 até 1990.

Deve ser esclarecido que nas eleições para os Conselhos Seccionais as chapas destacam quem será o presidente caso ela seja eleita. Assim, ao votar no grupo, vota-se no futuro presidente. É uma forma de eleição direta.

Essa minha trajetória parece autorizar-me a fazer um alerta, ao lado do já exposto inconformismo com as eleições indiretas.

Preocupa-me as motivações que levam advogados, de uns anos a esta data, a desejarem ocupar cargos na OAB, inscrevendo-se para compor o conselho. Sempre se teve presente que tais postulações possuíam justificativas dentro dos limites traçados pela vontade de servir a categoria e a própria sociedade. Havia engajamento em um rol de ideias e de ideais, que constituíam um ideário a ser seguido. As variações determinavam as opções por esse ou aquele grupo.

Na realidade, a política de classe sempre foi pautada pela crença da advocacia como um meio de aperfeiçoamento do Poder Judiciário, como agente transformador da sociedade e como instrumento eficaz para a construção de um País melhor.

O candidato à ordem se apresentava imbuído da missão de se tornar um porta-voz das aspirações de uma sociedade carente de alterações substanciais em suas estruturas, bem como dos anseios de uma advocacia em crise necessitada de valorização e de respeito por parte do corpo social, da imprensa e do próprio Poder Judiciário.

Deve-se anotar que os advogados, historicamente, sempre adotaram posturas impelidos pelo inconformismo e pelo ardente anseio de aprimoramento, fato que nos colocou no centro da dinâmica das mudanças institucionais e sociais.

Percebe-se que na atualidade há um indisfarçável desejo de protagonismo pessoal, de prestígio e de aplausos. São os interesses individuais substituindo os de natureza coletiva. Estes, como se viu, serviram de permanente motivação para os dirigentes da advocacia, o que me parece não mais ocorrer, pelo menos com parte dos que se habilitam a dirigir a OAB.

A opção por esse ou aquele grupo parece se dar basicamente em função do cargo ou da posição oferecidos na gestão. Pouco importa o programa a ser executado; deixa-se de lado a fidelidade aos grupos a que se pertenceu e pouco importam também aspectos de conotação ideológica. Também se leva em conta para a escolha da chapa aquela que se apresenta com maior viabilidade eleitoral.

Uma observação: há inúmeros advogados que poderiam dar valiosa contribuição à classe e à sociedade. No entanto, se omitem exatamente porque não compartilham dos objetivos exclusivamente pessoais, desviantes da missão que deveriam cumprir em prol do aprimoramento da advocacia.

Eu termino este escrito salientando que a grandeza da advocacia não permite que a nossa entidade seja considerada um clube recreativo, uma ação entre amigos ou um espaço para realizações pessoais. Ela deve ser tratada como um templo dedicado ao culto da liberdade e do humanismo.

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