Opinião | A chave para inovação e desenvolvimento sustentável

A política industrial moderna deve saber diferenciar subsídios estratégicos daqueles concedidos sem critério

Por Paulo Gala

Os incentivos fiscais, conhecidos no Brasil como gastos tributários, são ferramentas poderosas de política econômica, capazes de impulsionar o desenvolvimento tecnológico, a inovação e a sustentabilidade. No entanto, nem todas as renúncias geram benefícios para a sociedade. A diferença essencial está na existência ou não de contrapartidas. Subsídios bem estruturados exigem investimentos em inovação, transição tecnológica e práticas sustentáveis, enquanto aqueles concedidos sem contrapartida podem se tornar apenas privilégios setoriais, beneficiando grupos específicos sem gerar avanços econômicos ou sociais.

Um dos melhores exemplos de incentivos com contrapartida no Brasil é o programa Mover, que estimula a indústria automotiva a desenvolver veículos mais limpos e eficientes. O modelo adotado exige das montadoras investimentos em tecnologias de descarbonização, promovendo a competitividade da indústria brasileira no cenário global. Também há em vigor o Regime Especial da Indústria Química, destinado a fomentar a ampliação da capacidade produtiva e a instalação de novas plantas industriais no setor. Em janeiro, empresas do segmento anunciaram investimentos no valor de R$ 759,3 milhões. Outros projetos estão em análise e devem aportar mais R$ 260 milhões ao setor ainda neste semestre, ultrapassando a casa de R$ 1 bilhão.

Ou seja, nesses casos, o governo acertadamente tem mostrado que os incentivos podem ser ferramentas eficazes para estimular setores estratégicos, desde que vinculados a metas de inovação, desenvolvimento industrial e sustentabilidade. Esses investimentos ajudam a consolidar uma base industrial sofisticada e alinhada à tendência global de produção limpa.

No cenário internacional, os Estados Unidos também adotaram fomentos estratégicos para impulsionar a transição energética. Empresas como a Tesla cresceram com apoio de incentivos fiscais que exigiam contrapartidas em inovação e produção de veículos elétricos. Além disso, consumidores recebem benefícios diretos na compra de carros desse tipo, acelerando a eletrificação da frota nacional. Esse modelo de incentivo demonstra como políticas públicas bem planejadas são favoráveis para criar mercados dinâmicos e atrair investimentos para soluções sustentáveis.

A China é outro exemplo de sucesso nessa estratégia. O governo ofereceu massivos subsídios para a BYD e outras fabricantes de veículos elétricos, fomentando o desenvolvimento de baterias de alto desempenho e motores elétricos. Como resultado, tornou-se líder mundial na produção e exportação de veículos desse tipo, consolidando sua vantagem competitiva e reduzindo sua dependência de combustíveis fósseis.

Por outro lado, há incentivos que são apenas renúncia fiscal sem qualquer retorno para a sociedade. Isso é problemático porque representa um gasto público sem mecanismos que assegurem que as empresas beneficiadas realmente contribuam para o desenvolvimento econômico de longo prazo. Diferente das estratégicas, como as voltadas para inovação e sustentabilidade, há despesas sem planejamento de saída, beneficiando setores específicos sem exigir melhorias estruturais ou aumento de produtividade.

O mesmo ocorre com isenções tributárias sem metas claras de desenvolvimento, concedidas a setores específicos sem exigência de modernização, pesquisa ou ganhos de eficiência. Essas renúncias geram um custo fiscal elevado, sem necessariamente estimular crescimento econômico sustentável ou ganho de competitividade.

Separando o joio do trigo. A política industrial moderna deve saber diferenciar subsídios estratégicos daqueles concedidos sem critério. O Brasil, com suas missões da Nova Indústria, já adota esse princípio. Mais um bom exemplo acaba de ser protocolado como projeto de lei na Câmara dos Deputados. Trata-se do Programa Especial de Sustentabilidade da Indústria Química (Presiq), que pretende alavancar o segmento por meio de incentivos fiscais, a partir da adoção de processos de baixo carbono no ecossistema produtivo. Essa pauta surge no ano em que o Brasil sedia a 30.ª Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-30).

Os envolvidos no programa defendem que as duas agendas estão substancialmente interligadas, ao incentivar a descarbonização do setor industrial, a adoção de tecnologias sustentáveis e a economia de baixo carbono, além de fazer com que a indústria volte a operar em plena carga, ocupando 95% da capacidade produtiva atual.

Por fim, é preciso mudar a narrativa de que os subsídios devem ser encarados como algo negativo por princípio. É evidente que precisamos revisar os gastos tributários, mas não na direção de sua extinção, e sim buscar eliminar aqueles que não oferecem claras contrapartidas. É preciso fortalecer os que têm trazido resultados palpáveis e criar outros que atraiam investimento, inovação e aumento da complexidade do tecido produtivo industrial brasileiro.

Sem essa visão estratégica, não alcançaremos avanços reais, enquanto outras nações utilizam seus incentivos para liderar a nova economia global.

Opinião por Paulo Gala

Mestre e doutor em Economia da Fundação Getúlio Vargas