Foto do(a) page

Conheça o Espaço Aberto na editoria de Opinião do Estadão. Veja análises e artigos de opinião em colunas escritas por convidados e publicadas pelo Estadão.

Opinião|A década da virada

A Mata Atlântica pode ser um exemplo de sucesso de restauração em grande escala para o Brasil e para o mundo

Por Luís Fernando Guedes Pinto e Matheus Couto

A Organização das Nações Unidas (ONU) declarou o período de 2021 a 2030 como a Década da Restauração de Ecossistemas no mundo. Isso significa que uma das prioridades neste período será prevenir, interromper e reverter a degradação de ecossistemas nos continentes e oceanos de todo o globo. O objetivo é contribuir para solucionar os grandes desafios que a humanidade tem pela frente – como a redução da pobreza, o combate às mudanças climáticas e a prevenção da extinção em massa de espécies.

Tal urgência foi declarada em função do alto nível de degradação dos ecossistemas que sustentam a vida, a economia e a prosperidade do planeta. Alguns já foram severamente destruídos, enquanto muitos outros estão próximos do colapso, comprometendo a disponibilidade de água, a permanência de espécies animais e vegetais, a produção de alimentos e a mitigação e adaptação para as mudanças climáticas.

A década da restauração pretende ser um esforço coletivo, liderado por duas agências da ONU: o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Frente aos enormes obstáculos no caminho de seus objetivos e a necessidade de combinar o pensar global com o agir local, a década convida governos, empresas, ONGs e entidades de pesquisa a contribuir para essa agenda e a assumir responsabilidades para alcançarmos as ambiciosas e necessárias transformações.

A Fundação SOS Mata Atlântica tem a honra e o compromisso de contribuir para a Década da Restauração de Ecossistemas no Brasil, com foco particular no bioma Mata Atlântica e seus tão diversos e ricos quanto ameaçados ecossistemas – florestas, restingas, mangues, savanas, dunas e campos. A história do bioma e a do País se confundem. Foi uma árvore das suas matas – o pau-brasil – que nos batizou, assim como os diversos ciclos econômicos predatórios, que quase a eliminaram, foram responsáveis por sustentar o crescimento nacional durante séculos.

No bioma da Mata Atlântica hoje moram mais de 70% dos brasileiros e brasileiras, que dependem dos seus serviços ecossistêmicos para a oferta de água, energia elétrica e alimentos. Nele também está parte importante das espécies de animais e plantas ameaçadas de extinção no Brasil, além de uma agricultura que alimentou a população brasileira e gerou excedentes para exportação por mais de 500 anos. Em 2017, foi responsável por mais de 50% da produção de alimentos e uma grande parcela das commodities agrícolas exportadas. É o bioma das cidades, da comida e da biodiversidade.

Embora tenhamos uma pujante regeneração da Mata Atlântica, seguimos desmatando nossas florestas mais preservadas – onde está o maior estoque de carbono e vive a maioria das espécies ameaçadas – e derrubando um terço das matas jovens em regeneração. Em resumo, o bioma segue na UTI e o seu futuro está comprometido.

Diversas pesquisas apontam a Mata Atlântica como uma das áreas prioritárias para a restauração no planeta, considerando seu potencial para o combate às mudanças climáticas e a conservação da biodiversidade e da água. Apesar de estarmos passando por tempos sombrios em nosso país, temos a convicção de que a Mata Atlântica pode ser um exemplo de sucesso de restauração em grande escala para o Brasil e para o mundo.

Isso porque ela é urgente e necessária para o bem-estar da maior parte da nossa população e a garantia da nossa economia. Além disso, temos domínio da ciência das tecnologias de restauração, com grandes avanços nos últimos anos. E, em terceiro lugar, já temos um conjunto de políticas públicas robustas para conduzir a restauração e acabar com o desmatamento – com destaque para a Lei da Mata Atlântica e o Código Florestal, que precisam ser definitivamente implementados.

Finalmente, temos enormes oportunidades com o mercado de carbono e os novos negócios florestais, fazendo do Brasil um país central nas soluções baseadas na natureza para combater as mudanças climáticas e atrair grande capital até 2030, período que coincide com o fim da década da restauração.

No dia 13 de dezembro, a Mata Atlântica foi anunciada na Conferência de Biodiversidade da ONU, a COP-15, em Montreal, no Canadá, como um dos dez ecossistemas-bandeira da década da restauração. A indicação foi feita pelo Pacto pela Restauração da Mata Atlântica e a Rede Trinacional para a Restauração da Mata Atlântica (Brasil, Argentina e Paraguai). É mais um reconhecimento e uma oportunidade para alavancarmos recursos para a sua proteção e recuperação. Somam-se a isso os sinais do novo governo federal – de compromisso com o fim do desmatamento de todos os biomas do Brasil e de dar centralidade política e estratégica à agenda ambiental tendo em vista o desenvolvimento do País.

Unida à Década da Restauração de Ecossistemas, a SOS Mata Atlântica seguirá realizando o monitoramento do bioma, plantando florestas, monitorando rios, apoiando a criação e o fortalecimento de unidades de conservação, incidindo sobre políticas públicas e engajando a sociedade para inspirá-la a conservar e a restaurar a Mata Atlântica.

AOrganização das Nações Unidas (ONU) declarou o período de 2021 a 2030 como a Década da Restauração de Ecossistemas no mundo. Isso significa que uma das prioridades neste período será prevenir, interromper e reverter a degradação de ecossistemas nos continentes e oceanos de todo o globo. O objetivo é contribuir para solucionar os grandes desafios que a humanidade tem pela frente – como a redução da pobreza, o combate às mudanças climáticas e a prevenção da extinção em massa de espécies.

*

SÃO, RESPECTIVAMENTE, ENGENHEIRO AGRÔNOMO, DOUTOR EM FITOTECNIA, DIRETOR-EXECUTIVO DA FUNDAÇÃO SOS MATA ATLÂNTICA; E ENGENHEIRO FLORESTAL, MESTRE EM CIÊNCIA FLORESTAL PELA UNIVERSIDADE YALE, OFICIAL DE PROGRAMA DO CENTRO DE MONITORAMENTO DA CONSERVAÇÃO MUNDIAL DO PNUMA

Opinião por Luís Fernando Guedes Pinto e Matheus Couto