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Opinião | As lições de Davos para o Brasil

Agentes financeiros já incluem risco climático e políticas verdes nas decisões de investir

Por Gabriel Kohlmann

O encontro anual do Fórum Econômico Mundial, realizado na cidade suíça de Davos, é, em geral, uma vitrine para governantes e empresários mostrarem ao mundo seus melhores produtos: oportunidades de investimentos, robustez de economias, crescimento de mercados consumidores e políticas públicas “pró-business”, além de apresentar tendências de negócios e empresariais.

Esse roteiro foi protagonizado por alguns dos representantes brasileiros no evento – tanto agentes políticos (entre eles o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o governador de São Paulo, João Dória) quanto financeiros (o CEO do Itaú Unibanco, Cândido Bracher, e o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco). No entanto, fica a questão: o que esses mesmos representantes trouxeram de Davos?

Houve um componente especial na edição de 2020. Pela primeira vez em 50 anos, a bandeira central da conferência foi a questão ambiental, tratada como crise climática. O Fórum evidenciou que o meio ambiente já altera dinâmicas econômicas, de mercados e sociais, representando, assim, riscos para os negócios.

O Relatório Global de Riscos 2020, apresentado em Davos, alocou como riscos de maior probabilidade e maior impacto os seguintes elementos: eventos climáticos extremos, fracasso das medidas climáticas, desastres naturais e perda da biodiversidade.

Há muito é evidente que o mundo vem sofrendo com esses problemas. No Brasil, em específico, períodos de estiagens prolongadas e mais severas, queimadas e desmatamento na Amazônia, chuvas em excesso em ambientes urbanos, entre outros, são acontecimentos recorrentes. Alguns desses eventos impactam, por exemplo, o setor de energia elétrica (disponibilidade de água para geração hídrica e térmica) e o agronegócio – carro-chefe da economia brasileira –, afetado diretamente pela escassez de recursos hídricos, pela ocupação do solo e pelas demais condições de clima no dia a dia da produção.

O estudo Setor Elétrico: como precificar a água em um cenário de escassez, lançado recentemente pelo Instituto Escolhas, precificou a escassez de água em algumas importantes bacias hidrográficas do País. Na bacia do Rio Xingu é estimado prejuízo de R$ 2 bilhões por ano na perda de energia firme da usina hidrelétrica de Belo Monte, motivado por conflito pela água, enquanto na bacia do Rio São Francisco o custo da escassez pode atingir R$ 2,5 bilhões, entre energia e agricultura, com impactos no processo de privatização da Eletrobrás.

Há a percepção de que esses custos e riscos não estão adequadamente precificados por financiadores, empreendedores, produtores e governantes no planejamento e aprovação de negócios, regulações, investimentos e políticas públicas.

Os líderes financeiros do Brasil que foram a Davos poderiam ter retornado imbuídos da determinação de fazer suas instituições formularem novas metodologias de custos e riscos ambientais para empreendimentos que serão afetados pelas mudanças climáticas, tais como energia, agricultura, mineração e infraestrutura em geral, entre outros. Poderiam também adotar novas políticas de gestão de carteiras e créditos, condicionando os investimentos das instituições a compromissos ambientais preestabelecidos, conforme amplo debate sobre financiamento verde realizado em Davos.

Exemplos apresentados no Fórum não faltam. Agentes financeiros internacionais já utilizam cálculos de risco climático e políticas verdes de gerenciamento de carteiras de investimento. O banco francês BNP Paribas, por exemplo, gera uma “métrica de temperatura” em suas operações e pode decidir pela recusa do investimento caso o empreendimento não contribua para ações de mitigação das mudanças do clima. Metodologias semelhantes são aplicadas pelas seguradoras francesas AXA e Scor.

Neste novo contexto, o anúncio mais impactante do setor financeiro veio da gestora de ativos BlackRock, uma das maiores do mundo, ao informar que limitará investimentos em empreendimentos não aderentes às políticas climáticas e somente alocará recursos em negócios verdes. Larry Fink, CEO da instituição, comentou que está na fronteira de mudanças fundamentais e estruturais nas finanças globais.

Pelo lado governamental, o ministro Paulo Guedes, da Economia, poderia ouvir mais. Os custos e riscos climáticos tendem a ser assumidos pelo Tesouro Nacional ou pela sociedade, via custo Brasil – é o caso dos custos do setor de energia, que são pagos pelos consumidores. Reguladores britânicos e franceses, além do Banco da Inglaterra, já estudam regras específicas de precificação desses elementos nas suas políticas públicas e normas para investimentos.

Assimilar e implementar localmente essas discussões, os exemplos, os negócios e as políticas mais avançadas para lidar com o principal fator de risco, a mudança climática, deveriam ser o compromisso central de quem foi passar aqueles dias na neve suíça. O dever de casa está dado!

FORMADO EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS, MESTRE EM ECONOMIA INTERNACIONAL E DESENVOLVIMENTO PELA UNIVERSITY OF APPLIED SCIENCES BERLIN, É GERENTE DE PROJETOS E PRODUTOS DO INSTITUTO ESCOLHAS

Opinião por Gabriel Kohlmann