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Opinião | Brasil e as parcerias sociais

Empresas e ONGs são boas formuladoras de programas inovadores, mas o poder público é o ente capaz de conferir escala a esses programas

Por Ruy Altenfelder e Cláudia Buzzette Calais

Parcerias podem mudar um país. A iniciativa privada conhece bem as vantagens de somar forças com empresas e instituições parceiras, mas, quando tratamos da área social, o Brasil ainda explora pouco o potencial de projetos que envolvam Estado, empresas e terceiro setor, especialmente nos campos da educação e da capacitação profissional.

Como mudar esse quadro? Em primeiro lugar, é necessário estreitar o diálogo entre cada um desses atores. Afinal, boas parcerias requerem objetivos em comum, confiança mútua e valores compartilhados, ingredientes sem os quais não há ganho de eficiência, tampouco coesão nas ações executadas.

Esses são, por assim dizer, elementos internos de uma parceria. Mas seu sucesso ou fracasso depende também de fatores externos, isto é, de um olhar atento ao contexto político e econômico e às principais demandas da sociedade.

Esse olhar revela, por exemplo, que mais de 30% dos jovens brasileiros de 18 a 24 anos estão desocupados, segundo o IBGE. Na faixa etária seguinte, de 25 a 30 anos, o índice beira os 35%. Há certo consenso de que o desemprego jovem se tornou um problema social crônico no Brasil, além de representar um enorme desafio para o nosso desenvolvimento.

São números que indicam uma necessidade quase óbvia: o País precisa de parcerias entre governo, iniciativa privada e terceiro setor para enfrentar o desemprego jovem – parcerias centradas em objetivos estratégicos, que ataquem o problema de maneira inteligente. Mas como?

Vejamos um caso concreto. São Paulo tem hoje uma grande demanda por profissionais nas áreas de panificação e confeitaria. De acordo com o sindicato do setor, há cerca de 10 mil vagas em aberto só na capital e região metropolitana. A razão para isso é a falta de mão de obra qualificada, com experiência e treinamento para operar os equipamentos de uma panificadora moderna.

Com base nessa constatação, a Fundação Bunge montou o projeto De Grão em Pão, em parceria com a Rede Cidadã, a Harald Chocolates, o Instituto Gastronômico das Américas (IGA) e o Sindicato e Associação da Indústria de Panificação e Confeitaria de São Paulo (Sampapão).

A ação foi voltada para jovens de baixa renda de 18 a 29 anos que desejam trabalhar como padeiros e confeiteiros. Graças às parcerias com as empresas, esses jovens foram treinados por profissionais do ramo e aprenderam a operar o maquinário mais atualizado. Eles puderam experimentar, assim, a rotina de uma panificadora real de médio ou grande portes. Como resultado, todos os alunos da primeira turma, que se formou em fevereiro, saíram do projeto empregados.

Que lições podemos tirar dessa experiência?

Em primeiro lugar, parcerias precisam atender a demandas reais da sociedade, especialmente quando tratamos de educação e empregabilidade jovem. Projetos desse tipo só são bem-sucedidos quando partem de um diagnóstico correto de quais são os gaps do mercado.

Não se trata, portanto, de seguir modismos ou de atender às preferências deste ou daquele diretor de projeto, mas de utilizar a expertise de uma instituição para fazer esta ponte entre oferta e demanda – no caso, entre jovens em busca de uma oportunidade no mercado e empregadores que necessitam de profissionais com qualificações específicas.

Programas como o De Grão em Pão assinalam, também, a importância de envolver a iniciativa privada nas políticas de educação, especialmente quando falamos de ensino profissionalizante.

Mesmo que o Brasil investisse mais e melhor em educação, uma escola técnica jamais terá a infraestrutura de uma indústria de verdade. Logo, é preciso enxergar o potencial pedagógico dos espaços laborais, envolvendo as empresas em projetos educacionais de larga escala.

Ganha a sociedade, que terá acesso a uma formação mais qualificada, e ganham as próprias empresas, que estarão investindo na formação de sua futura mão de obra.

Embora tratemos até aqui do papel das empresas, é fundamental ressaltar também a importância do Estado como protagonista de políticas sociais. Ainda que agindo em parceria com a iniciativa privada ou com o terceiro setor, só o Estado tem capilaridade suficiente para criar ações em âmbito nacional. Empresas e ONGs são boas formuladoras de programas inovadores, mas o poder público é o ente capaz de conferir escala a esses programas.

O Estado também direciona as políticas sociais, ao fomentar determinados setores da economia, ao abrir discussões sobre temas polêmicos ou pouco conhecidos, ao estimular investimentos. Em suma, ele pauta o debate na área social, e essa é mais uma razão para convencer nossas lideranças públicas do potencial transformador das parcerias.

O País precisa de gestores que saibam reconhecer objetivos comuns entre os setores público e privado, organizando projetos que catalisem o melhor que cada um tem a oferecer. Valorizar as parcerias significa apostar em soluções mais inteligentes e mais eficientes para os grandes problemas sociais brasileiros.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, ADVOGADO, PRESIDENTE DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS JURÍDICAS; E DIRETORA-EXECUTIVA DA FUNDAÇÃO BUNGE

Opinião por Ruy Altenfelder e Cláudia Buzzette Calais