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Opinião|Combate à poluição plástica em São Paulo está nas mãos de Ricardo Nunes

Lentidão na regulamentação da Lei 17.261/2020 levanta dúvidas sobre o compromisso da administração municipal com a qualidade ambiental urbana

Por Ademilson Zamboni

A Lei Municipal 17.261, sancionada em 2020, foi criada para combater a poluição gerada por resíduos plásticos descartáveis na cidade de São Paulo (SP). Essa lei proíbe a distribuição de itens plásticos de uso único em hotéis, restaurantes, bares e eventos. No entanto, a falta de regulamentação específica, que inclui a definição clara de penalidades e mecanismos de fiscalização, impede a aplicação de sanções administrativas. Na prática, isso permite que estabelecimentos continuem a fornecer esses itens, comprometendo a eficácia da lei e deixando-a sem força de aplicação. Implementar e regulamentar plenamente essa lei poderia fazer de São Paulo um exemplo para outras cidades brasileiras e até mesmo para outros países no combate à poluição plástica.

Desde meados do século 20, o plástico inundou nosso cotidiano e nossas casas, prometendo praticidade e economia de tempo. Enquanto trouxe avanços em diversas áreas, sua produção descontrolada gerou uma das maiores crises ambientais da História. Mais de 10 bilhões de toneladas de plástico foram produzidas globalmente, das quais mais de 7 bilhões se transformaram em lixo. Anualmente, entre 8 e 12 milhões de toneladas de plásticos acabam nos ambientes costeiros e marinhos, e essa quantidade pode triplicar até 2050.

Os plásticos descartáveis, como copos, sacolas e canudos, estão no centro da crise de poluição oceânica, compondo a maior parte do lixo marinho. Limpezas de praia em todo o mundo revelam que esses itens são predominantes. A sociedade começa a perceber que não é razoável empregar um material cuja durabilidade ultrapassa séculos para produzir itens que viram lixo em poucos minutos. Em resposta, muitos governos têm aprovado leis para reduzir o uso de plásticos de uso único, estimulando a produção de materiais sustentáveis e mudanças nos padrões de consumo e no design de produtos e embalagens.

Desde 2019, São Paulo aderiu à Nova Economia Global do Plástico, comprometendo-se com a transição para uma economia circular. No entanto, transformar esse compromisso em ações concretas tem sido um desafio. A cidade, com seus mais de 11 milhões de habitantes, consome cerca de 7,2 bilhões de itens plásticos descartáveis por ano, itens esses que, comprovadamente, não são recicláveis – e sem valor para o mercado de reciclagem – e geram um acúmulo de resíduos sólidos que oneram os cofres públicos.

Em vez de adotar medidas que promovam a economia circular e a redução de resíduos, o prefeito Ricardo Nunes recentemente prorrogou os contratos de coleta de lixo por mais 20 anos, sem consulta pública e sem licitação, com um custo de cerca de R$ 80 bilhões. Reduzir a geração de resíduos poderia aliviar o orçamento público, permitindo mais investimentos em saúde, educação e segurança.

A lentidão na regulamentação da Lei 17.261/2020 levanta sérias dúvidas sobre o compromisso da administração municipal com a qualidade ambiental urbana. Desde a sanção da lei, há quatro anos, São Paulo já gerou cerca de 28,6 bilhões de itens plásticos descartáveis. A regulamentação não só reduziria os resíduos e custos associados, mas também diminuiria a geração de microplásticos, que já contaminam nossa água, alimentos e diversos órgãos do corpo humano, com consequências de saúde ainda em estudo.

Para São Paulo, fazer a lei funcionar de fato é uma grande oportunidade de reafirmar sua vocação cosmopolita e de liderança regional e nacional, alinhando-se a uma discussão global inevitável sobre o uso de plásticos descartáveis. O prefeito Ricardo Nunes tem em suas mãos a chance de demonstrar um verdadeiro compromisso com a sustentabilidade, colocando São Paulo na vanguarda das cidades que combatem a poluição plástica. A regulamentação da Lei 17.261/2020 é, portanto, passo essencial para garantir um futuro mais sustentável e saudável para todos os paulistanos, e pode servir como modelo para o Brasil e para o mundo.

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OCEANÓLOGO, É DIRETOR-GERAL DA OCEANA

Opinião por Ademilson Zamboni

Oceanólogo, é diretor-geral da Oceana