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Opinião | De Dubai e Baku para Belém

Metrópole situada na floresta apresenta um cenário completamente diferente das cidades que sediaram as duas COPs anteriores

Por Clovis Luciano Teixeira

As duas últimas Conferências das Partes (COPs) desapontaram a maioria dos participantes diante de resultados aquéns das expectativas, com acordos vagos e pouco avanço em ações concretas para reduzir o consumo de combustíveis fósseis e mitigar os efeitos das mudanças climáticas. Elas foram realizadas nas cidades de Dubai e Baku, que retratam a história e a pujança da riqueza oriunda da exploração de hidrocarbonetos. São capitais de Estados-membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) ou da Opep+, “afogados” em petróleo e historicamente dirigidos por regimes autoritários.

Em mais um sinal de engajamento com o petróleo, a COP de Dubai foi presidida pelo sultão Al-Jaber, CEO da petrolífera estatal ADNOC, e a COP de Baku foi presidida por Mukhtar Babayev, que foi por duas décadas executivo da Socar, estatal petrolífera azerbaijana. Ou seja: além de realizadas em capitais de petroestados, elas foram presididas por pessoas historicamente envolvidas com hidrocarbonetos.

Dubai, símbolo da modernidade e do luxo sustentados pelo petróleo, está situada na extremidade sul do Golfo Pérsico e era um dos sete emirados dos antigos Estados da Trégua (Trucial States). Depois de muitos anos sob protetorado britânico, esses sete emirados – Dubai, Abu Dhabi, Xarja, Ajmã, Umm al-Quwain, Ras al-Khaimah e Fujeira – foram emancipados em 1971 como Emirados Árabes Unidos (EAU). Com a descoberta de petróleo e gás a partir dos anos 60 do século passado, os EAU passaram por radicais transformações até se tornarem o oitavo maior produtor mundial de petróleo. Os EAU têm população igual à do Ceará, 80% dos quais compostos por imigrantes vindos da Índia, Paquistão, Bangladesh e de outros países asiáticos e africanos, majoritariamente.

Baku, cidade caucasiana capital dos azeris, está situada na margem ocidental do Mar Cáspio – o maior lago do nosso planeta – e tem uma longa história associada aos hidrocarbonetos. Lá já se comercializava petróleo no início do século 19, antes mesmo de Edwin Drake perfurar, em 1859, seu primeiro poço em Oil Creek, no oeste da Pensilvânia. Os russos ocuparam o Cáucaso em 1723 e construíram próxima a Baku a primeira refinaria comercial de petróleo do mundo, em 1837. Nesse tempo o petróleo era extraído de poços rasos e destilado para produzir querosene de iluminação, que era exportado no lombo de camelos, em barricas de madeira. Em 1875 chegaram os suecos Ludwig e Robert Nobel – irmãos do inventor da dinamite Alfred Nobel – e, logo depois, em 1883, chegaram os franceses irmãos Rothschild. Eles fundaram suas companhias e desde então o Azerbaijão vive da riqueza proporcionada pela exploração de petróleo e gás, que juntos respondem por 90% das exportações do país.

Agora, na expectativa da realização da COP-30, todas as atenções se voltam para Belém, que com sua singularidade cultural, histórica e geográfica, além de sua capacidade de superar desafios, vai tornar a Amazônia protagonista de debates sobre a própria Amazônia.

Metrópole situada na floresta, Belém apresenta um cenário completamente diferente das cidades que sediaram as duas COPs anteriores. Enquanto Dubai e Baku simbolizam os desafios de superar a dependência do petróleo, Belém emerge como um ícone da biodiversidade e da luta pela preservação ambiental com inclusão social. Além de abrigar a maior diversidade biológica do planeta, a Floresta Amazônica desempenha um papel importante na regulação do ciclo hídrico e na captura de carbono.

Ao realizar uma COP em plena Amazônia, o Brasil envia uma mensagem poderosa, no sentido de que não dá para discutir mudanças climáticas sem levar em conta a proteção das florestas tropicais e o papel dos que habitam essas florestas e labutam por elas.

Trazer o debate sobre o clima para Belém possibilitará que as representações de mais de 180 países tenham uma experiência imersiva na Amazônia e, sensibilizadas, possam trabalhar em favor de construir acordos que resultem na preservação desse bioma e no desenvolvimento de sua gente.

A realização da COP-30 em Belém deve ser encarada como compromisso de todos os brasileiros com uma agenda de sustentabilidade ambiental que também cuide das pessoas. Que também cuide de quem cuida da floresta, com o Brasil liderando pelo exemplo, ao adotar políticas avançadas de descarbonização, combate ao desmatamento e financiamento da recomposição das partes devastadas das suas florestas.

A COP-30 deve ser encarada não como um evento de luxo, mas como o desafio de retomar a essência das COPs, fazendo pela primeira vez uma COP na Floresta Amazônica, depois de duas COPs seguidas em cidades “afogadas” em petróleo, capitais de países petrodependentes. Diferentemente de Dubai e Baku, Belém tem o potencial de marcar a história com uma COP no coração da floresta, catalisando compromissos concretos que virão a inspirar mudanças de paradigmas: 1) promovendo a adoção do chamado phaseout (abandono gradual) da energia fóssil – phaseout do petróleo, que vem tendo demanda crescente, com projeção de 103 milhões de barris por dia em 2025, segundo a International Energy Agency (IEA), e que movimentou cerca US$ 3 trilhões em 2023, o equivalente a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) global –; e 2) onde o futuro sustentável prevaleça sobre os poderosos interesses da indústria mundial dos combustíveis fósseis e seus financiadores, acionistas, lobistas et caterva.

Belém não será apenas o palco da COP-30. Será também o símbolo do que está em jogo na luta pelo desenvolvimento sustentável e inclusivo, para todos os habitantes da Amazônia, do Brasil e do planeta Terra.

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ENGENHEIRO, É CONSULTOR EM PROJETOS DE INFRAESTRUTURA

Opinião por Clovis Luciano Teixeira

Engenheiro, é consultor em projetos de infraestrutura