A regulamentação da atividade de Relações Institucionais e Governamentais (RIG), popularmente conhecida como lobby, no Brasil, por meio do Projeto de Lei (PL) 2.914/2022, substitutivo do PL 1.202/2007, tem despertado discussões acaloradas e uma série de informações distorcidas. É importante desmistificar esses equívocos e compreender a verdade por trás dessa proposta, que visa a promover uma representação de interesses mais transparente e ética.
Durante mais de três décadas a regulamentação da atividade de RIG tem sido objeto de discussões no País. O PL 1.202/2007 e outros projetos correlatos tramitaram por longos 15 anos, passando por inúmeras audiências públicas, requerimentos de urgência e sessões de discussão. Portanto, a aprovação do projeto não ocorreu de forma precipitada, mas sim após um período extenso de debates e análises, garantindo tempo hábil para a discussão adequada.
Uma das principais alegações infundadas é a de que o projeto favorece a corrupção por meio de presentes caros e hospitalidades luxuosas. No entanto, o relatório da Câmara dos Deputados foi baseado em normas já existentes, como o Código de Conduta da Alta Administração. O texto estabelece critérios claros para a legitimidade das hospitalidades, exigindo que estejam diretamente relacionadas aos propósitos do órgão público e sejam pagas diretamente pelo fornecedor. Essas medidas visam a evitar abusos e garantir que as interações entre os setores público e privado sejam éticas e transparentes.
Outro mito difundido é o de que a sociedade civil foi ignorada durante a elaboração do projeto. No entanto, os relatores do PL na Comissão de Trabalho, deputado Augusto Coutinho, e no plenário, deputado Lafayette de Andrada, reuniram-se com diversas entidades interessadas na regulamentação. Além disso, foram realizadas audiências públicas e coletivas de imprensa, ampliando a oportunidade de participação de diferentes atores e garantindo a representação da sociedade civil.
Um dos objetivos fundamentais do projeto é fortalecer a transparência, a ética, a legalidade, a integridade e a liberdade de manifestação nas relações entre o setor público e os representantes de interesse. O texto incorpora inovações de outras normas já existentes, como a Lei Anticorrupção e a Lei de Acesso à Informação, visando a prevenir e combater a corrupção.
Há também a alegação falsa de que o projeto não traz transparência aos documentos trocados em reuniões entre agentes públicos e agentes de RIG. No entanto, o PL estabelece a transparência ativa, incluindo agentes públicos dos Três Poderes em relação às interações de representação de interesses. Embora respeite o sigilo legal ou empresarial, os documentos podem ser publicizados se a entidade conceder permissão à autoridade pública.
Outro ponto equivocado é o argumento de que a transparência ativa deve se estender aos agentes de RIG, não apenas aos agentes públicos. No entanto, o modelo adotado pelo projeto atribui ao agente público a responsabilidade de coletar, publicizar e atualizar as informações sobre as interações, enquanto o representante de interesse deve enviar as informações de forma fidedigna. Essa abordagem busca evitar práticas de shadow lobbying e concentra as informações nas autoridades competentes para melhor fiscalização.
Quanto à alegação de que o projeto inviabiliza relações pessoais, é importante ressaltar que o texto permite interações informais, desde que não ocorram no exercício de defesa de interesse. Além disso, possibilita a retificação das informações sobre a audiência dentro de prazos estabelecidos, tanto pelo representante de interesse quanto pelos agentes públicos.
Outro equívoco é afirmar que o projeto é excessivamente punitivista, com infrações altamente subjetivas. Na realidade, o texto estabelece penalidades proporcionais, incluindo advertência, multa e suspensão, levando em consideração a diferenciação entre pessoas físicas e jurídicas. O objetivo é garantir a devida dosimetria e evitar que uma única pessoa ou incidente prejudique todo o setor de RIG.
O trabalho de esclarecimento é contínuo e grande parte dele tem sido feita com sucesso pela Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), que produziu um material rico para rebater as inverdades que rondam o projeto. Uma delas é sobre a participação social: ao contrário do que difundem erroneamente, o texto aprovado na Câmara dos Deputados incentiva a representação legítima de interesses, garantindo os meios para exercer o direito de participação e denunciar casos de cerceamento. Além disso, diferencia a representação profissional do acompanhamento das atividades governamentais pelo cidadão, assegurando o credenciamento aos representantes que o solicitarem para acesso às instalações dos Três Poderes. Isso é participação social que funciona e separa a fiscalização pelo cidadão do trabalho transparente de defesa de interesses.
Além da Abrig, outras entidades que participaram das audiências e discussões deste projeto de lei foram a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a Confederação Nacional do Transporte (CNT) e o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), entre outras entidades e representantes da sociedade civil. No Senado, novas audiências públicas devem ser agendadas neste mês de agosto.
Em suma, a regulamentação das Relações Institucionais e Governamentais no Brasil, por meio do PL 2.914/2022, busca trazer transparência e ética às relações entre o setor público e os representantes de interesse. Ao desmistificar as informações distorcidas que circulam sobre o projeto, é possível compreender sua importância para fortalecer a democracia e promover uma atuação mais transparente e responsável dos diversos setores da sociedade.
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É PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INSTITUCIONAIS E GOVERNAMENTAIS (ABRIG)