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Opinião|Em 2024 o destino da humanidade será traçado

Os seres humanos enfrentam seu maior desafio justamente no momento em que a união de compatriotas parece estar em risco

Por Fersen Lambranho

A Terra tem por volta de 5 bilhões de anos, e seu funcionamento vem sendo desvendado por pesquisas científicas. A fina camada de atmosfera, que permite a vida, nem sempre esteve aqui, e não há nenhuma evidência de que exista em outro planeta. De tempos em tempos, meteoros caem na Terra, provocando erupções vulcânicas que, ao liberarem gases, acarretam mudanças climáticas extremas, com consequências nefastas para sua superfície, seus mares, e as mais diversas formas de vida.

Por cinco vezes ocorreu a extinção massiva de vida. A Terra se recupera, mesmo que para isso sejam necessários centenas de milhões de anos. Um restinho de vida animal ou vegetal é sempre preservado, o que permite o recomeço. Estima-se que hoje existam, na Terra, apenas 10% das espécies que já habitaram o planeta. Inclusive, só para ficar claro, a presença humana na Terra é irrelevante, por ser recente e insignificante: o Homo sapiens surgiu há apenas 200 mil anos atrás. Para fins de comparação, os dinossauros dominaram a Terra por 160 milhões de anos. Se o tempo da Terra fosse medido em 24 horas, o ser humano existiria por muito menos de um segundo.

A humanidade, nos últimos 200 anos, criou uma forma de vida baseada em uso do petróleo, criação de rebanhos bovinos e desmatamento. Acrescente-se a isso a urbanização, e o que resulta é uma perversa liberação de gases, tal e qual o efeito da queda de um meteoro. Não precisamos de um grande esforço de predição para sabermos o que acontecerá – basta estudarmos a história de 5 bilhões de anos. Em resumo: a vida humana, como 90% das espécies que já existiram, também um dia desapareceria da Terra, no momento em que esta fosse atingida por um meteoro.

O ser humano, porém, conseguiu antecipar o risco de sua própria destruição, simplesmente porque acelerou, como nunca antes registrado, o processo de liberação de gases que aquecem o planeta. A humanidade, assim como a biodiversidade que existe hoje, é fruto da última era glacial, que terminou há uns 16 mil anos. Vivemos, portanto, numa fase de aquecimento gradativo da Terra. No entanto, a velocidade desse aquecimento, que seria da ordem de bilhão de anos, foi brutalmente acelerada por nós. É evidente que existe uma “solução” para parar esse processo. Porém, para ser posta em prática, precisa de muita vontade política e sacrifícios, além de uma coordenação global entre governos e cientistas.

Essa coordenação já aconteceu, quando o mundo se uniu para reverter o buraco na camada de ozônio. Um estudo feito pelo Edelman Trust Barometer mostrou que o grau de polarização nas sociedades está aumentando de forma global. O resultado aponta países como EUA, Suécia, Espanha e Argentina severamente polarizados; Reino Unido, França, Brasil, Coreia do Sul, Japão, dentre outros, em processo acelerado de polarização. Ou seja, os seres humanos enfrentam seu maior desafio justamente no momento em que a união de compatriotas parece estar em risco.

Em 2024, pela primeira vez na História, a maior parcela da humanidade vai eleger novos governantes, num mesmo espaço de tempo. Na eleição mais “importante”, que escolherá o presidente dos EUA, as pesquisas apontam o favoritismo de um candidato radical de direita. Observa-se tal polarização em outros países, de modo que a probabilidade de começarmos 2025 com mais governos populistas, de esquerda ou de direita, e negacionistas da questão ambiental, é imensa. Nesse cenário, fica cada vez mais provável que a humanidade venha a “encurtar” seu período como espécie hegemônica, apesar de ter sido a única espécie capaz de não apenas compreender os fenômenos naturais, como de ter a capacidade de corrigir, de certa forma, os rumos do planeta.

Todas as espécies dominantes anteriores, nos últimos cinco cataclismos de extinção em massa, reinaram por mais de milhões de anos. Mesmo o Brasil, um país ensolarado, que tem a maior biodiversidade do planeta, uma matriz de energia limpa e abundância de água, experimentou em 2023 diversos problemas climáticos jamais observados em sua história. Pode demorar centenas de milhões de anos, mas a Terra sempre se recupera. No entanto, precisamos salvar a humanidade, que caminha a passos largos para sua autoextinção antecipada.

Os 5 bilhões de anos da Terra estão registrados de forma decifrável pela ciência, e nos mostram claramente o que é necessário para cumprirmos a tarefa de nos salvarmos. À humanidade cabe se unir em prol da vida na Terra. Não “compro” a solução de que vamos mudar de planeta, porque esse conceito parte do pressuposto de que somos mais do que uma simples forma de vida. Dentro de nossas imensas limitações como espécie, nosso sucesso deriva – em grande parte – da nossa capacidade de organização em família/tribo, que é ameaçada com a polarização, falta de diálogo e negacionismo. Em 2024, mais de 2 bilhões de pessoas depositarão, nas urnas, nosso destino como espécie hegemônica na Terra. A marcha da insensatez segue e não prioriza o tema ambiental.

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CHAIRMAN DA GP INVESTMENTS E G2D INVESTMENTS

Opinião por Fersen Lambranho