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Opinião|Finanças e bioeconomia: a hora da ação no G-20

Apenas a implementação dos princípios de alto nível poderá viabilizar uma bioeconomia positiva para o clima, a natureza e as pessoas

Por Luana Maia, Paulo Guerra, Juliana Simões e Thais Ferraz

Na presidência do G-20, o Brasil elencou a bioeconomia entre as prioridades e criou a Iniciativa de Bioeconomia estruturada em três eixos – ciência, tecnologia e inovação; uso sustentável da biodiversidade; e o papel da bioeconomia na promoção do desenvolvimento sustentável. Ao longo deste ano, discussões e negociações vêm sendo feitas e entre os resultados esperados está a elaboração dos princípios sobre bioeconomia, que visa a alinhar como os países-membros podem orientar suas economias para promover equidade e sustentabilidade.

O documento Princípios de Alto Nível, que está em negociação, é uma oportunidade de buscar convergências entre os países mais ricos do mundo para pôr em prática uma economia com impacto positivo para o clima, a natureza e as pessoas. Espera-se que esses princípios estejam na Declaração do Rio, a ser assinada por todos os integrantes do G-20 em novembro. Também será uma forma de promover o tema na pauta internacional em 2025, quando a liderança rotativa do bloco passa para a África do Sul, e o Brasil será sede da primeira Conferência do Clima da ONU (COP) na Amazônia. No caso brasileiro, poderá contribuir com a Estratégia Nacional de Bioeconomia, que pretende ter seu Plano Nacional a partir de agosto.

Sabe-se até agora que os princípios propostos estão alinhados a temas presentes em acordos internacionais negociados entre os representantes do grupo, na Convenção sobre Diversidade Biológica (sobre proteção e uso da biodiversidade) e na Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima – ambas, aliás, nasceram no Brasil na Rio-92. Os princípios devem abordar equidade, biodiversidade e comércio internacional, entre outros temas. O alinhamento das economias do G-20 é importante, mas o impacto desejado pelo uso desses princípios é justamente a possibilidade de operacionalizar ou promover ações concretas na economia real. Assim, adicionalmente aos princípios, o grupo poderia sugerir um plano de implementação a ser desenvolvido na presidência da África do Sul no próximo ano.

Um fator determinante é o financiamento. Estima-se que sejam necessários US$ 8,1 trilhões anuais a partir de 2030 para financiamento climático, segundo o Climate Policy Initiative. Porém, o valor médio anual atingiu US$ 1,3 trilhão entre 2021 e 2022, apenas 1% do PIB global. Por isso, uma das preocupações da ONU no Relatório sobre a Lacuna de Emissões é a necessidade de ampliar “significativamente” os investimentos climáticos públicos e privados, com mecanismos de financiamento que reduzam custos.

Atualmente, a economia depende da natureza e usa seus recursos como se fossem ilimitados, subvalorizando-os e agravando desigualdades. A emergência climática está mudando o cotidiano dos países – como a devastação provocada pelas enchentes no Rio Grande do Sul, os estragos de tempestades na Suíça e na Itália, as ondas de calor extremo na Índia, com mortes e riscos à saúde –, exigindo mais investimentos e reformulação de infraestruturas.

O G-20 – que também reúne os maiores emissores de gases-estufa no mundo – tem a chance de liderar essa transformação. Não por acaso, a Iniciativa de Bioeconomia elencou o financiamento como um dos grandes eixos.

A iniciativa tem sido acompanhada por 21 organizações do setor privado, academia e ONGs (cinco delas signatárias deste texto), que vêm contribuindo com a diversidade de visões e com estudos. Em maio, o grupo divulgou o relatório A Bioeconomia Global – Levantamento Preliminar das Estratégias e Práticas do G-20, reunindo experiências dos países-membros sobre as distintas visões da bioeconomia e como promovê-la em diferentes cenários.

Em setembro, quando ocorrerá a última reunião da iniciativa, esperamos que os princípios de alto nível possam contribuir para moldar uma nova economia positiva para o clima, a natureza e as pessoas, especialmente para comunidades indígenas e povos das florestas, assegurando acesso e repartição de benefícios.

No mesmo mês, o grupo das 21 organizações lança um estudo com foco no financiamento, analisando desafios e soluções para dar escala à bioeconomia. A publicação vai contribuir com debates da Conferência da Biodiversidade e da COP-30, que ocorrem, respectivamente, na Colômbia e em Belém. Na COP-30, o Acordo de Paris completa uma década. O objetivo é que o tema da biodiversidade tenha desenvolvido maturidade suficiente para influenciar o processo de revisão do acordo.

O avanço no financiamento e na convergência de princípios que resultem em ações práticas requer que os países enxerguem a bioeconomia como um impulsionador de modelos de desenvolvimento em que a criação de valor passa pela biodiversidade. É uma chance para que os países ricos em natureza, especialmente do Sul Global, sejam geradores de riqueza, reduzindo desigualdades.

A inclusão dos princípios de alto nível na Declaração do Rio do G-20 é um sinal importante para mobilizar as maiores economias do mundo, mas apenas a sua implementação na economia real poderá viabilizar uma bioeconomia positiva para o clima, a natureza e as pessoas.

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SÃO, RESPECTIVAMENTE, GERENTE SÊNIOR NA NATUREFINANCE; DIRETOR DE PROGRAMAS PARA GESTÃO PÚBLICA DA FUNDAÇÃO DOM CABRAL (FDC); GERENTE-ADJUNTA DE POVOS INDÍGENAS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DA THE NATURE CONSERVANCY (TNC) BRASIL E LÍDER DA FORÇA-TAREFA DE BIOECONOMIA DA COALIZÃO BRASIL CLIMA, FLORESTAS E AGRICULTURA; E DIRETORA DE PROGRAMAS NO INSTITUTO CLIMA E SOCIEDADE (iCS)

Opinião por Luana Maia

Gerente sênior na NatureFinance

Paulo Guerra

Diretor de Programas para Gestão Pública da Fundação Dom Cabral (FDC)

Juliana Simões

Gerente-adjunta de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais da The Nature Conservancy (TNC) Brasil, é líder da Força-Tarefa de Bioeconomia da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura

Thais Ferraz

Diretora de Programas no Instituto Clima e Sociedade (iCS)