Opinião | Medo de adversidades climáticas tem de ser ressignificado em tempos de ecoansiedade

Com o apoio adequado, crianças e adolescentes podem aprender a transformar o medo em motivação, participando ativamente de soluções

Por Rachel Guanabara

A ecoansiedade é o medo persistente de um colapso ambiental. Isso tem se tornado uma preocupação crescente, principalmente entre crianças e adolescentes. Mudanças climáticas, poluição e perda de biodiversidade estão mais evidentes. A atual juventude tem mais consciência quanto às questões ambientais que assolam o planeta. Entretanto, sentimentos de ansiedade, tristeza e impotência têm acompanhado tal percepção. Nesse cenário, familiares e educadores desempenham um papel fundamental para ajudar crianças e jovens a lidar com esses sentimentos, transformando o medo em ação e esperança.

Diferentemente de outros transtornos psiquiátricos, a ecoansiedade ainda não recebeu um diagnóstico clínico oficial. Contudo, seus efeitos são reais e significativos. Um estudo global publicado na revista The Lancet, em 2021, revelou que 59% dos jovens entre 16 e 25 anos estão preocupados com as mudanças climáticas. Muitos ainda relataram dificuldades ao imaginar um futuro cuja perspectiva fosse positiva. Tais sintomas são comumente identificados em países vulneráveis aos impactos ambientais. O Brasil é um dos lugares mais afetados por cataclismos ambientais, devido à ocorrência de enchentes, de queimadas e de secas.

Essa alteração no padrão de comportamento de jovens em todo o mundo exige uma abordagem sensível e prática de familiares e educadores. É um compromisso social validar tais problematizações. Muitas vezes, as queixas dessa população são minimizadas com expressões como “não se preocupe” ou “você é muito jovem para pensar nisso”. Tal reação gera frustração, isolando-os ainda mais. A empatia reforça a audiência desses indivíduos e lhes dá uma resposta que reconhece a seriedade das suas sensações. Frases como “entendo o que você está sentindo” ou “vamos pensar juntos em como podemos contribuir para a construção de um mundo melhor” ajudam a construir diálogos e criar vínculos emocionais mais consistentes.

A educação para o desenvolvimento sustentável pode desempenhar um papel transformador. Mas a maneira como ela é abordada, muitas vezes em escolas e em casa, precisa mudar. A educação deve levar a um pensamento crítico transformador, e não ao sentimento de culpa paralisante. Há um grande risco em abordar temas tão complexos de maneira muito simplificada. Frases como “faça a sua parte” ou “feche a torneira para não acabar com a água do planeta” pode criar na criança um sentimento de culpa, que leva a uma ação “vazia” e sem muita reflexão, que, por muitas vezes não traz um resultado transformador. Ou seja, a criança faz a parte dela e fecha a torneira, no entanto, continua testemunhando e muitas vezes até mesmo sofrendo com calamidades ambientais. Isso gera um sentimento de impotência, frustração e medo.

Outro aspecto capital é incentivar a chamada “esperança ativa”. Essa ideia baseia-se em mostrar histórias de sucesso e avanços ambientais em diferentes partes do mundo. Um exemplo inspirador é o caso da Costa Rica, que se destacou internacionalmente ao recuperar grande parte de suas florestas por meio de políticas públicas consistentes. Outro exemplo é a Noruega, que lidera o uso de energia limpa e possui metas ambiciosas para zerar suas emissões de carbono. Apresentar cenários alternativos mostra que mudanças positivas são possíveis e que, embora os desafios sejam enormes, há exemplos concretos de progresso.

No Brasil, também existem ações significativas que podem servir como fonte de inspiração. O Projeto Tamar, por exemplo, é amplamente reconhecido por seu trabalho na preservação das tartarugas marinhas e envolve jovens e trabalhadores locais na preservação, apresentando aos pescadores, por exemplo, uma outra alternativa para o sustento que não a caça da tartaruga. Outra iniciativa relevante é o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, que promove o reflorestamento em larga escala e engaja comunidades em ações de conservação.

Nas escolas pelo Brasil vemos muitos projetos interessantes, mas outros que, por vezes, podem acabar virando simples competições, como, por exemplo, coleta de tampinhas de garrafa. Há um aspecto muito positivo em separar essas tampinhas para reciclagem, mas há que se tomar cuidado para que isso não gere ainda mais consumo e lixo. Por vezes as crianças podem chegar em casa pedindo aos familiares que comprem mais refrigerantes e sucos industrializados para que possam levar as tampinhas para a escola, pois querem vencer a competição. Por isso é tão importante o aspecto crítico quando se pensa em projetos formais de educação para o desenvolvimento sustentável. Na Finlândia, por exemplo, os alunos são incentivados a pensar criticamente sobre as ações humanas que impactam o planeta. Organizações como a Earth Guardians reúnem jovens ativistas de diversas partes do mundo para desenvolver soluções locais para problemas ambientais globais.

Essa jornada começa com o reconhecimento de que a ansiedade não é um sinal de fraqueza, mas um reflexo de sua sensibilidade e empatia com o planeta. Com o apoio adequado, as crianças e adolescentes podem aprender a transformar o medo em motivação, participando ativamente de soluções; tornando-se agentes de mudança reais e transformadoras em suas comunidades. O diálogo, o exemplo e a educação prática são ferramentas fundamentais para esse processo. Assim, é possível construir um futuro mais sustentável para todos. Afinal, atentemo-nos ao que diz o professor Mauro Guimarães quando fala sobre um movimento coletivo conjunto, que pode parecer redundante, mas é proposital. O objetivo é mostrar que nem sempre a soma das partes faz um todo. Ou seja, não adianta cada um continuar fazendo a sua parte, fechado em pequenos “silos” de ações sustentáveis, é necessário engajar toda a sociedade nesse movimento, todos agindo juntos com o mesmo objetivo, porque só assim teremos ações realmente transformadoras, capazes de melhorar o mundo e trazer um pouco de paz para as mentes ansiosas.

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DIRETORA DA SIS – RIO DE JANEIRO

Opinião por Rachel Guanabara

Diretora da SIS – Rio de Janeiro