O veto do aumento dos gabaritos nos miolos de bairro garantirá uma melhor qualidade de vida em São Paulo? Se utilizarmos como parâmetros o nível de dinamismo urbano e a integridade dos espaços públicos, a resposta muito provavelmente é não.
A característica do zoneamento atual é estimular o maior desenvolvimento imobiliário seguindo o transporte de massa, porém não toca no problema crucial de aproximar moradia e emprego. O caminho para isso seria exatamente o adensamento com estímulo de uso misto nos miolos e centros de bairro, em especial naqueles localizados no centro expandido, áreas que concentram a maioria absoluta dos empregos na capital. O trecho da lei que vincula um aumento de gabarito, mas condicionado obrigatoriamente à construção de habitação de interesse social, certamente contribuiria para esse maior adensamento qualitativo.
No sentido oposto, as áreas já populosas e fora do centro expandido necessitam urgentemente de infraestrutura urbana e promoção de empregos. Sem esse raciocínio, a lógica dos deslocamentos pendulares e a superlotação do transporte público permanecerão como a realidade da maior parte da população. O raciocínio de encarar a cidade de São Paulo como múltiplas centralidades desenvolvidas vai inclusive no caminho das teorias mais recentes do urbanismo, como a cidade de 15 minutos, elaborada pelo urbanista e professor da Sorbonne Carlos Moreno.
Nos últimos dez anos, temos assistido a uma intensa transformação da cidade na região dos eixos, área que cobre um porcentual diminuto da cidade. São áreas que ganharam calçadas largas, bem construídas, com renovada arborização, paraciclos e presença humana estimulada pela exigência de fachadas ativas, bem na direção de uma cidade mais saudável, nos termos aqui colocados. Essas áreas somente se transformaram pela ação dos empreendedores, estimulados pelo poder público. Não mereceriam os miolos de bairro semelhante transformação?
Uma ação fundamental e que poderia ser promovida pelo poder público seria elaborar um plano de calçadas e espaços públicos, específicos para cada bairro, prevendo não só um padrão de pavimento, mas também estratégias de redução de velocidade, alargamentos em pontos estratégicos, ciclofaixas, pequenos parques, medidas as quais, somadas às fruições e praças urbanas já incentivadas no Plano Diretor, poderiam enriquecer o rol de contrapartidas para a cidade. Com certeza nos próximos dez anos veríamos uma grande transformação dos bairros no sentido de ganho de qualidade de vida.
Poder andar pela cidade com segurança em relação aos carros, ter a possibilidade de ir a pé à padaria em trajeto seguro, poder passear despreocupado com um carrinho de bebê, são direitos de todos nós. O estímulo a uma maior densidade e diversidade de usos certamente contribuirá para uma cidade mais justa e com maior qualidade de vida.
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PRESIDENTE DA ASBEA-SP, É FUNDADOR DO ARCHSCAPE