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Opinião | O TCU e a autonomia das agências reguladoras

Decisão que manteve interpretação sobre a duração dos mandatos de diretores das agências reforça a importância de preservar a autonomia delas, blindando-as de interferências políticas

Por Guilherme Stumpf

O Tribunal de Contas da União (TCU) manteve a interpretação sobre a duração dos mandatos de diretores de agências reguladoras. O caso concreto versava sobre a nomeação de Carlos Baigorri, atual presidente do Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Em 2022, o tribunal havia referendado uma medida cautelar concedida pelo ministro Walton Alencar no sentido de autorizar o ato de indicação para presidente da Anatel, desde que no prazo de cinco anos de duração do mandato fosse computado também o período em que o indicado havia atuado como conselheiro da referida agência.

No entanto, durante o julgamento definitivo da matéria, houve uma alteração de rumos. A partir da divergência aberta pelo ministro Jorge Oliveira, os ministros entenderam que o tribunal era incompetente para revisar atos de natureza política do presidente da República.

De fato, embora o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha consolidado entendimento no sentido de que o Tribunal de Contas é competente para avaliar atos administrativos de nomeação em cargos de comissão que eventualmente contrariem a legalidade e a moralidade administrativas, com base no artigo 71, III da Constituição, no caso em concreto não se estava diante de uma mera nomeação de ocupante de cargo em comissão.

Isso porque a indicação para os cargos das agências reguladoras é ato político complexo. Após a indicação do presidente da República, o indicado passa por uma sabatina do Senado, responsável por aprová-lo ou rejeitá-lo, só para que então se possa proceder com a nomeação. Nomeado, não pode ser exonerado pelo presidente da República, gozando de estabilidade, característica que garante a autonomia da agência.

É importante destacar que o rito procedimental para a escolha dos dirigentes das agências reguladoras inclui etapas reservadas também para a escolha de funções públicas como ministro do Supremo Tribunal Federal, procurador-geral da República, presidente e diretores do Banco Central, entre outras. Trata-se, portanto, de ato complexo, de natureza política, inserido nas competências do presidente da República e do Senado Federal, não podendo o Tribunal de Contas se imiscuir no mérito do ato administrativo.

Em suma, na prática, a decisão do TCU reforça a importância de preservar a autonomia das agências reguladoras, blindando-as de interferências políticas que possam comprometer sua missão de regular e fiscalizar setores essenciais para o País. A administração pública não deve ser refém de ciclos eleitorais e interesses políticos de curto prazo, mas sim pautada pela competência técnica e pelo respeito às normas que garantem sua funcionalidade e sua independência.

A decisão do TCU é correta não apenas do ponto de vista jurídico, mas revela uma autocontenção das competências do tribunal. É preciso lembrar que a corte de contas é fundamental para o controle da legalidade da administração pública, especialmente no que se relaciona às finanças públicas, e não se deve transformar no guardião geral da legalidade e da ordem jurídica geral, sob pena de afronta à competência constitucional dos demais Poderes.

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É ADVOGADO ESPECIALISTA EM DIREITO ADMINISTRATIVO

Opinião por Guilherme Stumpf

Advogado especialista em Direito Administrativo